Paralelismo (Harmonia Preestabelecida)


Acabamos de examinar uma forma de paralelismo na teoria panteista do duplo aspecto, de Spinoza. Leibnitz, em sua doutrina da mônada, ofereceu ao mundo filosófico uma outra forma dessa teoria.
A Mônada. Essa palavra vem do vocábulo grego monas, «unidade». Pitágoras usou o termo para indicar o primeiro número de uma série, ou seja, o número do qual toda a série se deriva. Giordano Bruno empregou o termo como nome da unidade ontológica irredutível da qual tudo o mais derivar-se- ia. Isso posto, essa palavra pode referir-se a Deus, em um sentido panteísta. De acordo com Leibnitz, a força é a essência básica de todas as coisas. Força seria um princípio metafísico. Leibnitz chamava esse princípio de mônada. Ela não teria extensão, seria indivisível, simples, fundamental, eterna, auto-exis- tente, auto-sustentadora, imutável, indestrutível. Poderíamos falar em mônadas como átomos; mas Leibnitz não emprestava aos átomos as mesmas propriedades que os cientistas lhes dão, como constitutivos de toda matéria. A grande Mônada, a Força (o Deus de sua teoria), teria criado outras mônadas, não mediante uma criação ex-nihilo, e nem por emanação, mas por fulguração. Isso significa que de seu Ser fulguraram ou lampejaram todas as outras mônadas. As mônadas secundárias, pois, são fulguradas ou relampejadas, dividindo-se da Mônada divina. A fulguração, como um conceito, parece pairar em algum ponto entre a criação por fiat (do nada, mediante a Palavra de Deus) e a criação por emanação(15). O que se torna evidente é que todas as mônadas são divinamente derivadas, mas não foram criadas.
As mônadas existem em número incalculável. Todas elas têm as mesmas características, conforme foi alistado acima; mas diferem em suas auto-apre- sentações. Elas têm tanto extensão quanto pensamen­to, mas em graus variegados.
O Homem e as Mônadas. Um homem seria composto de uma combinação de mônadas. Ele teria mônadas intelectuais que se apresentam como mente ou pensamentos. Ele teria mônadas materiais que se apresentam como extensão. Essas últimas mônadas seriam sonolentas, ao passo que as mônadas intelectuais resplandeceriam de vigor. Outros animais teriam uma combinação inferior de mônadas, algumas ainda mais sonolentas que aquelas do homem, o que explicaria por que motivo o homem é superior a todo o reino animal. A matéria bruta é essencialmente constituída por mônadas que repre­sentam extensão. Têm qualidades mentais (pampsi- quismo), mas em graus muito baixos, pelo que a matéria mantém-se dormente.
As Mônadas não têm Janelas. Não haveria qualquer interação entre as mônadas. Elas são universos contidos em si mesmos. Não têm janelas e nem portas. Contudo, parecem interagir, mas isso já faz parte do trabalho de Deus, a grande Mônada.
Uma Harmonia Preestabelecida. Deus programou todas as mônadas, de tal modo que tudo quanto sucede vem do íntimo, e não da interação externa entre as mônadas. Assim, neste momento, posso pensar que estou olhando para você, e você pode pensar que está olhando para mim. Estamos em um diálogo, e parecemos estar interagindo. Mas isso é apenas uma ilusão. O que realmente está sucedendo é que a minha programação interior é paralela e harmônica à sua programação. Meu mundo interior corresponde ao mundo interior do leitor, mas não há qualquer interação. Outro tanto sucede no caso das supostas interações entre o meu corpo e a minha alma. Tanto o corpo quanto a alma são compostos de mônadas programadas para parecerem que interagem. Mas a verdade é que a programação deles é harmônica, existindo como paralelos, mas não como estados de interação. Pensemos no som gravado em uma fita de cinema. Essa gravação é feita para acompanhar paralelamente as cenas do filme. Ou imaginemos o caso de dois relógios que estejam marcando exatamente o mesmo horário. Não colaboram um com ou outro. Mas funcionam paralelamente, sempre em perfeita harmonia um coir o outro. Tiquetaqueiam juntos, dão as horas no mesmo momento, e estão sempre marcando os mesmos segundos, minutos e horas. No entanto, a harmonia que há entre esses dois relógios vem do interior de cada um deles, e não em face de alguma interação.
Avaliação e Críticas:
1.    Leibnitz criou uma teoria que tem atraído muita gente, embora pareça ser mais o produto de uma imaginação fértil do que uma verdadeira exposição da realidade. Seja como for, a teoria está fora dos nossos meios de investigação.
2.   Essa teoria faz de Deus a única causa. Se Deus é a única causa, então, ele é a causa do mal, o que parece fazer a teoria de Leibnitz inaceitável, sobre bases morais. Deus, porventura, programou as mônadas em seu agrupamento comunal para pratica­rem o mal?
3.    Essa teoria reflete um determinismo extremado. A nossa experiência parece ensinar-nos que somos capazes, pelo menos em algumas ocasiões, de fazer escolhas genuínas.
4.   Visto que Deus fez aquela programação, então o mundo é «o melhor de todos os mundos possíveis». Mas, considerando todo o caos, a maldade e o sofrimento que aqui aparecem perguntamos por que motivo Deus não fez um mundo melhor. Meu rosto não está sorrindo.

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