O Vexatório Problema de Autoria das Epístolas Patorais


Intensa controvérsia se tem centralizado em torno desse problema, com imenso dispêndio de energia e muito material escrito, defendendo ou rejeitando a autoria paulina da primeira e segunda epístolas a Timóteo e da epístola a Tito. Na realidade, porém, esse problema se reveste de muito menor importância do que se pensaria, ao examinar esse vasto acervo de estudos, posto que essas epístolas, desde os tempos mais remotos, têm sido aceitas como «canônicas», tendo sido acolhidas pela igreja como tais, possuindo assim autoridade na formação da fé cristã, sem importar se Paulo foi o autor das mesmas ou não. Sendo essa a verdade da questão, o que realmente importa, nesses três livros, é o que os mesmos procuram ensinar-nos, quão bem temos aplicado esses ensinamentos à vida eclesiástica e particular, e não tanto quem teria sido o autor dos mesmos. No entanto, estaria fora de ordem não abordar um problema assim, em um artigo desta natureza. Por isso mesmo, as posições favoráveis e contrárias à autoria paulina são expostas da maneira mais abreviada possível, a fim de que a questão não tenha sua importância ampliada além do que convém.
Os argumentos contrários à autoria paulina das «epístolas pastorais».
Todos eruditos concordam ao menos acerca do ponto que essas três epístolas formam um grupo distintivo, visto terem o mesmo estilo, o mesmo vocabulário geral, os mesmos temas e os mesmos propósitos—procederam da mesma pena, portanto. Assim sendo, o problema da «autoria» se aplica a todas essas três epístolas ao mesmo tempo, sendo a questão assim examinada nas notas expositivas abaixo.
1.   Não era incomum, nos tempos antigos, um autor escrever no nome de alguma pessoa famosa, normalmente para aumentar a autoridade da obra e para garantir-lhe uma maior circulação. Era tão comum essa prática, naqueles tempos, que se sabe de pelo menos cem dessas obras, produzidas em nome de famosos elementos cristãos.
No tocante às «epístolas pastorais», as razões pelas quais isso poderia ter sido feito (segundo alguns eruditos) poderiam incluir as seguintes:
a. Uma pessoa, que considerava Paulo como seu grande herói, em humildade, ao escrever, não daria o seu próprio nome como autor, mas apresentaria o nome de seu herói, pensando assim ajudar a sua causa. Nesse caso, estaria escrevendo esquecendo-se de si mesmo; e na moralidade antiga nada havia que condenasse essa forma de ação.
b. Havia uma heresia ou heresias a combater, na igreja cristã primitiva, após o período apostólico, e as «epístolas pastorais» tinham exata­mente o propósito de fazer oposição às mesmas. O apóstolo Paulo mesmo se opusera à intromissão de heresias na igreja, conforme nos mostra a epistola aos Colossenses, e o autor das epístolas pastorais reforça mais ainda essa oposição à heresia mediante o uso do nome de Paulo, muito mais do que poderia fazer se tivesse usado o seu próprio nome. Bastaria isso para justificar o uso do nome do apóstolo dos gentios, e a mentalidade antiga não condenava essa atitude. O autor sagrado se opunha aos hereges, à ilusão satânica, no intuito de proteger a igreja, de convocar os homens de volta à fé apropriada em Cristo. O uso do nome de Paulo o fortalecia em sua causa, que era digna e recomendável,
c. Ao fazer «Paulo» tomar-se o campeão do ponto de vista «universal» sobre a igreja daquele tempo, no que respeita a questões doutriná­rias, o autor sagrado esperava livrar Paulo da pecha de suposto representante de posições heréticas (pois os hereges tinham a Paulo como um de seus campeões; e um dos exemplos notáveis disso foi Márcion, o gnóstico). Portanto, o autor sagrado deve ter pensado em prestar um notável serviço a Paulo e à igreja cristã, longe de imaginar que sua ação era condenável, digna de censuras.
2.  Além da «possibilidade histórica» que alguns dos livros do N.T. tenham sido composições pseudôni­mas, essencialmente quatro outras questões têm sido levantadas, nas quais a autoria paulina das «epístolas pastorais» é posta em dúvida. Essas questões são o «problema histórico», o «problema doutrinário», «o problema linguístico», e o «problema comparativo».
O Problema Histórico
a. As heresias. Alguns estudiosos pensam que as heresias atacadas nos livros que ora consideramos, refletem um período posterior ao da era apostólica. Sob o ponto V deste artigo, intitulado «Motivos e Propósitos», são discutidos os «tipos» de heresia que se refletem nas epístolas pastorais. Essa questão é nublada por grande número dos mais variados argu­mentos. Porém, um quadro claro emerge: estamos considerando ali um período — pós-apostólico —. Nas próprias epístolas pastorais, em contraste com a epístola aos Colossenses, por exemplo, principalmen­te os aspectos «morais» das heresias são estudados, e não os aspectos doutrinários. Os hereges aparecem como homens ímpios, impostores, que enganam e são enganados, corruptos em seus princípios morais, carregados de pecados, conduzidos por diversas concupiscências, gananciosos de lucro. A raiz de tudo isso foi certa forma de gnosticismo judaizante. Apesar de que, em Colossenses, em termos bem gerais, se faz oposição ao mesmo tipo de heresia, o ponto destacado pelos que se opõem à autoria paulina das « epístolas pastorais» é que as descrições são bastante diferentes, apesar de que devem estar descrevendo uma espécie de gnosticismo encontrado nas áreas de Éfeso e Colossos, posto que aquela região geral era onde Timóteo, supostamente, trabalhava. Já o gnosticismo do território em foco, nos tempos de Paulo, era essencialmente ascético (ver Col. 2:20 e ss), ao passo que aquele tipo atacado nas epístolas pastorais é definidamente «libertino». Sabemos que ambas as formas existiam, entretanto, sendo extremamente difícil apresentar um bom argumento nesse caso, pois simplesmente não sabemos o bastante acerca do gnosticismo, no tocante às suas manifestações em cada período e localidade, para poder argumentar muito sobre a matéria, para um lado ou para outro. (Ver o artigo acerca do Gnosticismo).
Em todos os seus pontos essenciais, o gnosticismo teve origem anterior â do surgimento do cristianismo, e todas as suas tendências e ideias já se achavam presentes nos dias de Paulo, incluindo sua tentativa de fazer do cristianismo uma mera teosofia, reconciliando-o com ideias filosóficas mais antigas e com religiões místicas orientais. Os estudiosos ainda estabelecem mais um ponto, sobre essa questão, dizendo que as «formas de tratamento» são diferentes, no tocante às heresias, entre aqueles escritos reconhecidamente paulinos e as «epístolas pastorais». Na epístola aos Colossenses, por exemplo, Paulo ataca, exata e incisivamente, pontos específicos do sistema por ele combatido, contrastando tal sistema com a verdade cristã definida. No entanto, nas epístolas pastorais, as acusações são gerais e graves e falsos mestres de muitas espécies são indiscriminada­mente denunciados. Isso se aceita como uma abordagem «não paulina», contrária ao gênio dos escritos legitimamente paulinos. Este segundo ponto é mais forte que a simples assertiva que «diferentes tipos» de heresia estão sob ataque, mas não é muito convincente.
b.  A norma eclesiástica. Um dos mais comuns argumentos contra a autoria paulina das epístolas pastorais diz que elas refletem um período histórico posterior, pois os tipos de governo eclesiástico são diferentes daqueles que poderíamos deduzir como características dos tempos anteriores. Nas primeiras epístolas de Paulo, universalmente aceitas como tais, parece haver pouco ou nenhum traço de ofícios eclesiásticos formalmente constituídos. Nas primeiras de suas epístolas, os termos «bispos e diáconos» falam sobre funções na igreja, mas não sobre ofícios formais, ao passo que nas epístolas pastorais essas funções passaram para a categoria de ofícios formais. Notemos que na lista formal de funções da igreja, conforme se vê em Efé. 4:11, os termos «bispos e diáconos» nem ao menos são mencionados. Antes das .epístolas pastorais, os líderes da igreja seriam «indivíduos espiritualmente dotados», levantados pelo Espirito Santo, dentre a comunidade geral, de maneira informal, ao passo que nas epístolas pastorais existem ofícios formais, para os quais seus ocupantes eram «nomeados» por pessoas ainda máis poderosas. As epistolas pastorais reconheceriam os bispos, os diáconos e os presbíteros, as mesmas três ordens distintivas que aparecem nas epistolas de Inácio, as quais datam de 100—118 D.C. Apesar de que tais distinções são ainda mais evidentes naquelas epístolas, as epistolas pastorais estariam a meio caminho de estabelecer tais distinções, já que se afastam da atitude espiritualmente informal acerca dos líderes da igreja, conforme o reflexo que vemos nas primeiras epístolas de Paulo.
B.H. Streeter observa sobre este ponto: «O autor das epístolas pastorais, segundo podemos inferir, aceita o episcopado monárquico como questão pacífica. Para ele, as figuras de Timóteo e Tito são importantes, não tanto como personagens históricas, mas como quem nos fornece tipos de bispo ideal. Timóteo é o bispo ideal em suas relações para com a sua própria igreja, em uma província como Êfeso, onde já havia igrejas locais organizadas em todas as cidades provinciais. Tito, por outro lado, seria o bispo missionário ideal, o bispo de alguma província longínqua, onde as igrejas, fora da própria igreja-sede do bispo, se encontram fracas e desencorajadas». (The Primitive Church, Nova Iorque, Macmillan Col, 1929, págs. 118-119).
Cumpre-nos observar que Timóteo e Tito são mais do que simples «anciãos», no sentido paulino anterior. Eles é que «nomeavam» outros anciãos, conforme o estilo de tempos posteriores, como se fosse uma espécie de primeiro passo na direção de uma verdadeira hierarquia eclesiástica (ver o terceiro capitulo da primeira epístola a Timóteo e o trecho de Tito 1:5 e ss).
Contra tala ideias normalmente se salienta que o avanço do governo eclesiástico, na direção de formas eclesiásticas posteriores, não é tão grande como aquele avanço refletido nas epístolas de Inácio, e de que temos pouco conhecimento acerca de quão rapidamente tais formas governamentais realmente se desenvolveram, e, por conseguinte, o que se acha refletido nas epistolas pastorais que poderia coincidir com os últimos anos do ministério de Paulo e com um desenvolvimento natural, que teria partido do tipo informal de governo que caracterizava a igreja cristã primitiva, conforme transparece nas primeiras episto­las daquele apóstolo. Pelo menos é certo que as epístolas pastorais são um tanto vagas sobre questões de ofícios eclesiásticos e sobre a expressão governamental daquele tempo, pelo que também nenhum argumento sólido pode ser erigido sobre o reflexo de um «periodo posterior». Se o autor sagrado estivesse interessado em informar-nos acerca dessa questão, facilmente poderia tê-lo feito, e é lamentável que em vista das epístolas pastorais serem os únicos livros do N.T. devotados à pessoa e ao trabalho dos pastores, que informações mais claras não nos tenham sido conferidas sobre a estrutura real do governo eclesiástico, o que se revestiria de grande interesse histórico.
O Problema Doutrinário:
Alguns estudiosos objetam à ideia de que as «epistolas pastorais» sejam genuinamente paulinas, com base no argumento de que doutrinas diferentes se refletem netas, algumas vezes similares às de Paulo, mas outras vezes bem diferentes do que ele dizia e até mesmo contraditórias a seus escritos. Por exemplo, as quest&es como a morte e a ressurreição de Cristo não aparecem mais como temas centrais, mas são reduzidas a meras alusões. O conceito da justificação e da nossa transformação segundo a imagem de Cristo, como alvo mesmo da vida cristã, não aparece aqui. — Os ensinamentos das epistolas pastorais são primariamente éticos, muito semelhan­tes ao estilo dos ensinamentos ministrados nas sinagogas judaicas. A «eusebia» (piedade) toma o lugar que a «pistis» (fé) ocupa nas epistolas paulinas, o    que, uma vez mais caracteriza uma fé mais judaizante. Essa palavra « Eusébia» é usada por doze vezes nas epistolas pastorais, e nunca nas demais epístolas paulinas. Somente nos trechos de I Tim. 1:16 e II Tim. 3:15 é que a fé surge claramente com o seu antigo sentido de meio para a apropriação da salvação. Nas demais menções, a fé perde sua função distintivamente salvadora, sendo reduzida a uma das «virtudes cardeais». Conforme comenta C.H. Dodd, The Johannine Epistles (pág. 30): «Pará os hebreus… conhecer a Deus não era primariamente um exercício intelectual e nem uma inefável experiência mística; antes, consistia em reconhecer a Deus nos seus caminhos com o homem reconhecendo suas reivindi­cações sobre o homem, compreendendo suas leis com a intenção de obedecê-las».
Alguns intérpretes asseguram que esse é o ponto de vista essencial das «epístolas pastorais», que abando­na o misticismo tipicamente paulino. (Ver I Cor. 1:4 acerca desse elemento nos escritos de Paulo). Alguns intérpretes, entretanto, vão longe demais a esse respeito, insistindo que a «salvação pelas obras» é destacada nas epistolas pastorais, o que é distintiva­ mente contrário à clara declaração de Tito 3:5. Contudo, o trecho de I Tim. 1:7 e ss põe certa ênfase sobre a lei, dando-lhe uma importância que dificilmente pode ser reconciliada com o que se lê nas epístolas aos Romanos e aos Gálatas, ainda que o nono versículo daquela passagem também tome duvidosa tal ideia. No entanto, a ideia de «salvação pelas obras» pode ser vista implícita em I Tim. 6:12, que diz, «Combate o bom combate da fé. Toma posse da vida eterna, para a qual também foste chamado, e de que fizeste a boa confissão, perante muitas testemunhas». (Ver igualmente I Tim. 5:8)- Entretan­to, isso não diz coisa alguma mais do que aquilo que se encontra em Fil. 2:12: «Assim, pois, amados meus, como sempre obedecestes, não só na minha presença, porém muito mais agora na minha ausência, desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor».
Outrossim, esses indícios podem ser exagerados ou mesmo distorcidos, por estudiosos ansiosos por apresentar argumentos favoráveis ou contrários à autoria paulina. Por exemplo, é salientado por alguns eruditos que o tema muito enfatizado por Paulo, o da «união vital» com Cristo, não se pode encontrar nas epístolas pastorais. Porém, a consulta a uma boa concordância bíblica mostra-nos que as expressões «em Cristo» ou «nele», denotando exatamente essa união (e que figura por cento e sessenta e quatro vezes em suas epístolas, ver as notas expositivas a respeito, em I Cor. 1:4 no NTI) também se acham com freqQência nas epístolas pastorais, isto é, nada menos do que nove vezes, de uma maneira ou de outra. (Ver I  Tim. 1:15; 2:7; 3:13; II Tim. 1:1,9; 2:10 e 3:12,15).
Diferenças quanto às expressões doutrinárias podem ser explicadas com base nas diferenças de propósito e de intuito do apóstolo. As grandes doutrinas que foram expressas naquelas epistolas, onde alguma atividade polêmica era exercida, visavam atender especificamente a situações locais. Nenhuma das epístolas de Paulo (com a exceção única, talvez, da epístola aos Efésios) foi escrita apenas para expor doutrinas, inteiramente à parte das necessidades especiais das igrejas locais para as quais ele escreveu; e normalmente foram pronunciadas em oposição a ideias falsas, correntes na igreja particular para a qual ele escrevia. As expressões doutrinárias, por conseguinte, dependiam das circunstâncias locais. Visto que essas circunstâncias diferiam, havia doutrinas centrais, consideradas nitidamente pauli­nas, que apareciam ou não nas diferentes epistolas que ele escreveu. Assim, ao passo que alguns, como McGiffert (History of Chrístianity in the Apostolic Age, pág. 402), têm asseverado que as diferenças doutrinárias são o argumento mais «decisivo» contra a autoria paulina das «epístolas pastorais», parece antes que essas diferenças podem ser adequadamente explanadas, embora não tão conclusivamente para eliminar todo o problema.
O  Problema da Escassez de Material
Alguns intérpretes têm caido no erro de «ver demais», em certas porções minúsculas de material escrito. As supostas diferenças de conceitos doutriná­rios entre epistolas de pequenas dimensões, que foram escritas para atender a situações meramente locais, dificilmente podem ser premidas para resol­verem problemas de autoria, por exemplo. Essas epístolas não foram escritas como teologias sistemá­ticas; e declarações isoladas, aqui e acolá, uma vez extraídas de seus respectivos contextos, facilmente podem ser interpretadas como se fossem contraditó­rias.
As epistolas de Paulo não foram escritas como manuais destinados a estudos doutrinários. Supomos mesmo que a maioria delas foi escrita com bastante espontaneidade. Paulo, sem dúvida, acreditava em grande número de coisas sobre as quais jamais escreveu nas epístolas que possuímos. Outrossim, também, deve ter tido muitos pontos de vista sobre coisas que costumava afirmar, mas sobre as quais nunca escreveu, nas epístolas que chegaram até nós. Por conseguinte, é muito precário edificar teorias de autoria por causa de aparentes discrepâncias doutrinárias, a menos, naturalmente, que essas diferenças sejam realmente evidentes.
O Problema Linguístico
Na realidade, é neste ponto que se tem registrado mais objeção à autoria paulina das «epistolas pastorais». É fato bem conhecido, por aqueles que leem muito vários autores, que cada um deles tem seu próprio estilo de expressão, o qual pode ser breve, profuso, complicado, simples, confuso, claro, eloquente, pedante, sem falarmos no uso de termos e expressões idiomáticas favoritos. Geralmente é fácil ate mesmo perceber quando um autor começa a «tomar por empréstimo», embora não se identifique diretamente, ou quando começa a «citar», sem importar se ele identifica ou não a sua fonte informativa. Outrossim, é extremamente difícil alguém imitar o estilo alheio, exceto mediante citações diretas; antes, assim que um escritor começa a falar por si mesmo, deixa transparecer a sua mentalidade e estilo. Poderíamos mesmo dizer que o estilo de um autor, sua escolha de palavras e suas expressões em geral são tão peculiares a ele como suas impressões digitais. E essas questões transparecem até mesmo através da «tradução» de um idioma para outro. Em outras palavras, o estilo de um autor se deixa ver até mesmo quando sua obra é bem traduzida para outra língua. O estilo de um autor é como que as impressões digitais de sua mente. Ora, é justamente aqui que muitos intérpretes veem uma «impressão digital» diferente do que aquela que aparece nos comuns e «primeiros» escritos paulinos.
O    vocabulário das epistolas pastorais. Existem novecentas e duas palavras que formam a base das «epístolas pastorais». O estudo mais completo a respeito foi feito por P.N. Harrison, em seu livro Problem of the Pastoral Epistles (Londres, Oxford University Press, 1921). Cinquenta e quatro dessas palavras são nomes próprios, pelo que ficam fora da discussão. Trezentas e seis dessas palavras, o que representa mais de um terço do total, não se encontram nas demais dez epístolas atribuídas a Paulo. Dessas, cento e setenta e cinco nem ao menos ocorrem em qualquer outra porção do N.T. Cento e trinta e uma ocorrem em outras porções do N.T. (em conjunção com as «epístolas pastorais»), mas não em qualquer das comumente aceitas epístolas paulinas. Existem quinhentas e quarenta e duas palavras, nas epístolas que ora comentamos, compartilhadas com outros escritos paulinos. Cinquenta desses termos podem ser reputados exclusivamente paulinos, no sentido de que não figuram em qualquer outro lugar do N.T. Muitos desses vocábulos, contudo, são emprés­timos evidentes, extraídos de outros escritos paulinos, sobretudo da epístola aos Romanos. Dessa porção do vocabulário, que não concorda com outras epístolas de Paulo, duzentas e onze palavras têm sido aceitas atualmente como parte do vocabulário dos escritores cristãos do período de 95—170 D.C. Dentre as seiscentas e trinta e quatro palavras que Paulo usou, e que parece terem desaparecido do vocabulário do século II D.C., no grego representado pelos escritos dos pais apostólicos, quinhentas e noventa e cinco não são usadas nas «epístolas pastorais», o que, talvez, mostre que tais vocábulos tenham caldo em desuso, e que o vocabulário das três epístolas se aproxime mais do vocabulário dos pais da igreja do século II D.C. do que do grego de Paulo. Finalmente, aquelas palavras existentes nas epístolas pastorais, mas que não se acham em qualquer outra porção do N.T., e nem mesmo nos escritos dos pais apostólicos, e nem nos escritos dos primeiros apologistas cristãos, encontram companhia com os escritos não cristãos da primeira metade do século II D.C., como Epicteto (60—120 D.C.), Diom Crisóstomo (40—115 D.C.), Dioscordes (100 D.C.), Plutarco (120 D.C.), Ariano (100-170 D.C.), Marco Aurélio (121-180 D.C.), além de outros autores que viveram na mesma época, o que, uma vez mais, indica um vocabulário grego «posterior».
Alguns poucos dos termos especiais, usados nas «epístolas pastorais», o que forma um vocabulário teológico e eclesiástico, não usados em outros escritos paulinos, aparecem aqui para satisfazer a curiosidade dos leitores: «Didaskalia*, que significa «corpo de doutrinas» (encontra-se por quatro vezes na primeira epístola a Timóteo, por duas vezes na segunda epístola a Timóteo, e por três vezes na epístola a Tito, isto é, em I Tim. 1:10; 4:1,6,13,16; 5:17; 6:1,3; II Tim. 3:10,16, 4:3; Tito 1:9; 2:1,7,10); “pistis” que quer dizer «fé», em sentido «objetivo», a «fé ou credo cristão», rara no restante do N.T., embora essa palavra seja de ocorrência frequente com outro sentido (encontra-se na primeira epístola a Timóteo por oito vezes, aparecendo também ali o sentido «subjetivo», isto é, «a fé que alguém exerce»; ver os exemplos em I Tim. 1:2,19; 3:9,13; 4:1; 5:8; 6:10,21; na segunda epístola a Timóteo aparece por duas vezes, e em Tito por três vezes, isto é, em II Tim. 13:8; 4:7 e Tito 1:4,13 e 3:15). A palavra “eusebeia”, que significa «piedade», aparece por dez vezes, e duas vezes como advérbio, isto é, em I Tim. 2:2; 3:16; 4:7,8; 6:3,5,6,11; II Tim. 3:5; Tito 1:1; e adverbial­mente, em II Tim. 3:12 e Tito 2:12. Essa lista poderia ser ampliada até incluir trezentas e seis palavras. O Expositor’s Greek Testament, editado por W. Robertson, alista bem mais de cem dessas referências.
Além disso, faltam termos e expressões paulinas comuns, nas «epístolas pastorais», como o «Espírito Santo», que aparece por oitenta vezes em «outras» epístolas paulinas, mas apenas por três vezes nestas epístolas, o que certamente indica certa diferença de ênfase. O termo «justificar» figura apenas em Tito 3:7, ao passo que «justiça» ou «retidão» recebem uma qualidade ética, não figurando aqui como uma relação religiosa com Deus (ver I Tim. 6:11 e II Tim. 2:22). Em vez dos vocábulos paulinos «revelar» e «revelação», estas epístolas pastorais usam «apareci­mento» e «aparecer». Paulo usa «Senhor», em contraste com «escravo», ao passo que as epistolas pastorais usam o termo «despotes», que significa «mestre», «déspota». Observações similares podem ser feitas com relação aos termos «injusto», «imundo», «pacto», «andar» (metáfora sobre a conduta espiritual) e «corpo», com subentendidos éticos. Esta última palavra é usada por setenta e uma vezes nos quatro escritos clássicos paulinos, isto é, Romanos, Gálatas, I  e II Corintios.
Palavras que dão estilo. O termo grego gar, frequente nas «outras» epístolas paulinas, é mui raramente empregado nas «epístolas pastorais». «Ara» ou «ara oun» não aparecem nas epístolas pastorais, o que também se dá no caso de outras partículas de ligação, expressões e partículas adverbiais, como «anti», «achri», «dio», «dioti», «emprosthen», «ene- ken», «epeita», «eti», «ide», «idou», «mepos», «opos», «ouketi», «oute», «palin», «para» (com o acusativo), «em panfi», «pote», «pou», «sun», «osper». Não há nas epístolas pastorais qualquer traço do habito de Paulo aplicar diferentes preposições ao mesmo objeto em uma sentença, com o propósito de defini-lo mais acuradamente, conforme se vê em Gal. 1:1 e Rom. 1:17. O uso frequente do termo «tou», pelo apóstolo Paulo, antes de infinitivos, não figura aqui.
Seu uso frequente do artigo, antes de sentenças inteiras, advérbios, interjeições, numerais, e, espe­cialmente, antes de verbos no infinito, também não aparece aqui. Apesar de que alguma diferença no vocabulário naturalmente pode ser explicada com base na «diferença» de tema, é extremamente difícil explicar, para satisfação de todos, por que motivo as palavras de estilo, conforme aquelas que aparecem acima, não se fazem presentes, uma vez que são partículas que aparecem constantemente nos escritos de Paulo, sem importar qual o tema explorado. Situações similares exigem diferentes usos adverbiais nas «epistolas pastorais». Por exemplo, o familiar termo grego «oun» é substituído por «meta».
Notemos que se a saudação coerente de Paulo é «Graça a vós e paz», em todas as suas primeiras epistolas, estas três «epístolas pastorais» dizem «Graça, misericórdia e paz»; e apesar de que essa é uma questão diminuta, poderia facilmente indicar um autor que, apesar de tentar imitar o apóstolo dos gentios, ainda assim usava certas questões de estilo todo pessoal.
Estilo. Até mesmo aqueles que admitem a autoria paulina das «epístolas pastorais», confessam que as «primeiras» epístolas de Paulo têm um estilo mais vigoroso, mais explosivo, mas incisivo. Alguns estudiosos supõem que a «idade avançada» o tomou mais suave, ao passo que outros pensam em certa perda de «energia mental» devido à idade.
«Quem está perfeitamente familiarizado com o estilo e a dicção de Paulo, ao ler estas epístolas, de imediato fica impressionado com a diferença que há entre elas e as suas demais epistolas. Sente-se que ali há uma atmosfera retórica estranha. As sentenças não têm o seu impacto familiar. O pensamento não se movimenta com a pressa costumeira. A verve das epístolas aos Corintios e aos Gálatas, o vigor dialético da epistola aos Romanos, a majestade da epistola aos Efésios, não transparecem ali. A associação de ideias é frouxa, a construção não é compacta, a movimenta­ção é lenta e desajeitada. Faz falta ali a expressão profunda de Paulo. O pensamento é escasso, em proporção ao volume de palavras; conforme declara Holtzmann: ‘Sentimos falta daquelas frases carrega­das de sentido profundo’. Tambem se fazem ausentes os anacolutos comuns, os parênteses não fechados, as digressões repentinas, as obscuridades que se derivam do ímpeto do pensamento e dos sentimentos. A construção das sentenças é simples, os pensamentos são simples, expressos sem adornos, tudo de acordo com regras e com suavidade, mas sem impulso e sem cor.
«A sintaxe é mais inflexível e mais regular do que nas primeiras epístolas, mais compacta e menos fluente. As cláusulas são reunidas juntamente, e surge a tendência para o paralelismo». (Lightfoot, Biblical Essays, pág. 402). Exemplos desse tipo de fenômeno: I Tim. 1:9; 2:1,2; 3:16; 4:12,13,15; 5:10; 6:9,11-13, 15,18; II Tim. 2:11,12; 3:1-8; 3:10-13,16; 4:2,5,7; Tito 1:7-9; 2:7,12 e 3:1-3.
O  Problema Comparativo:
Interpretações mais antigas consideravam a impos- sibilidade de encaixar as epístolas pastorais dentro do arcabouço histórico do livro de Atos. Assim sendo, acusavam tais epístolas de serem cartas forjadas, sem bom fundamento nos fatos históricos. Muito tempo e energia têm sido gastos, em alguns comentários, na tentativa de fazê-las se encaixarem na narrativa do livro de Atos. Mas atualmente quase todos os estudiosos concordam que, se elas são genuínas, refletem um período histórico posterior ao do livro de Atos, talvez envolvendo uma viagem de Paulo ao Ocidente, até à Espanha, durante um intervalo entre seu primeiro o seu segundo períodos de encarcera­mento. Até mesmo aqueles eruditos que não acreditam que isso realmente sucedeu, ainda assim crêem que o autor sagrado, sem importar quem foi ele, tencionava que seus leitores entendessem ter havido um pano de fundo histórico. Há certas evidências acerca da «viagem ao Ocidente», de um aprisionamento final e, finalmente, do martírio. Por isso é que o fragmento muratoriano sobre o «cânon», descoberto na Biblioteca Ambrosiana, em Milão, na Itália, que supostamente não teria sido escrito após o ano de 170D.C., diz: «Nos Atos dos Apóstolos, Lucas relata a Teófilo acontecimentos dos quais ele fora testemunha ocular… mas omite a viagem de Paulo de Roma à Espanha… uma epistola a Tito, e duas a Timóteo, — que embora escritas somente por motivo de afeto pessoal, continuam sendo consagra­das no respeito da igreja universal, bem como no arranjo da disciplina eclesiástica».
Naturalmente, não se sabe quais as autoridades ou provas que serviram de base para essa declaração do fragmento muratoriano; e confirmações posteriores dessa tradição, nos escritos dos chamados pais da igreja, podem ter sido apenas a repetição de uma tradição fundamentada apenas no que se lê em Rom. 15:24, onde o apóstolo dos gentios expressou o desejo de fazer tal viagem, que foi interrompida pelo seu encarceramento, sem base em qualquer confirmação histórica. No trecho de Atos 28:31 no NTI, são apresentadas notas expositivas acerca do que se sabe sobre esta conjectura — atinente às atividades missionárias de Paulo após o período histórico que se reflete na narrativa do evangelho de Lucas. Seja como for, sem importar qual seja a verdade sobre a questão isso não importa em qualquer objeção à autoria paulina das epistolas pastorais, na suposição de que tal autoria seria uma contradição com a narrativa do livro de Atos, o que se toma perfeitamente evidente quando se faz a devida comparação.
A Refutação
Uma típica refutação aos argumentos contrários à autoria paulina das epistolas pastorais: com base nas dificuldades, com a confirmação da autoria paulina. Trata-se do que disse A.T. Robertson, a fim de que o leitor possa ter exemplo dos tipos de argumentos que são expostos pelos intérpretes a fim de apoiar a autoria paulina tradicional dessas epístolas.
Diz, pois, A.T. Robertson: «É mister discutir questões introdutórias a respeito dessas três (epísto­las) porque elas são comuns a todas elas. Ê verdade que alguns eruditos modernos admitem como paulinas as passagens pessoais, em II Tim. 1:15-18 e 4:9-22, ao mesmo tempo que negam a genuinidade do resto. Mas essa crítica cai por seu próprio peso, porquanto precisamente as mesmas características de estilo aparecem tanto nessas passagens admitidas como no resto; e nenhuma razão terrena pode ser apresentada que explique por que Paulo teria escrito meros trechos esparsos, ou que explique a omissão de outras porções e a preservação dessas porções por um forjador do segundo século da era cristã.
As evidências externas em prol da autoria paulina são fortes e conclusivas (Clemente, Policarpo, Irineu, Tertuliano, Teófilo e o cânon muratoriano). «Traços de sua circulação na igreja, antes do tempo de Mârcion, são mais claros que aqueles referentes às epístolas aos Romanos e II Coríntios». (Zahn, Introduction to the N.T., II, pág. 85). Márcion e Taciano rejeitavam-nas porque nelas Paulo condena o ascetismo.
As objeções quanto a questões internas seguem as normas ditadas por Baur, seguidas por Renan. São principalmente quatro. A mais decisiva, conforme é argumentado por McGiffert (History of Christianity in the Apostolic Age, pág. 402), é a que diz que o cristianismo das epístolas pastorais não é o cristianis­mo de Paulo. Ele pensava em Paulo, conforme o conhecemos em outras epístolas. Mas essa acusação não é veraz. É verdade que Paulo alista ali a fé juntamente com outras virtudes, mas ele também faz isso em Gál. 5:22. Em nenhuma outra porção Paulo nos apresenta uma exposição mais exaltada sobre a fé do que em I Tim. 1:12-17. Uma outra objeção apresentada é que a organização eclesiástica, vista nas epistolas pastorais, pertence ao segundo século e não ao tempo da vida de Paulo. Além disso, contamos com a epístola de Inácio, da segunda metade do século II D.C., na qual a palavra ‘bispo’ é posta acima da palavra ‘anciãos’, acerca do que não há nenhum traço no Novo Testamento. (Lightfoot). Um foijador do século II D.C. certamente teria reproduzido a organização eclesiástica daquele século, em vez da do primeiro século, conforme encontramos nas epístolas pastorais. Nestas se vê apenas o desenvolvi­mento normal de bispo (= ancião) e de diácono. Uma terceira objeção se tem feito com base de que não haveria espaço, dentro da vida de Paulo, conforme a conhecemos pelo livro de Atos e de outras epistolas paulinas, para os acontecimentos aludidos nas epístolas pastorais; e também se tem argumentado, com base em testemunhos posteriores e não conclu­sivos que Paulo foi morto em 64 D.C., tendo sofrido apenas um período de aprisionamento em Roma. Se Paulo foi executado em 64 D.C., então esse argumento se reveste de vigor, embora Bartlet (The Apostolic Age) tenha tentado abrir espaço para elas no período coberto pelo livro de Atos. Duncan faz idêntica tentativa em favor dos trechos esparsos paulinos admitidos por ele como pertencentes ao hipotético período de aprisionamento em Êfeso. Porém, se admitirmos que Paulo foi libertado da primeira ocasião de encarceramento em Roma, então surge espaço suficiente, antes de sua execução, em 68 D. C., para os acontecimentos referidos nas epistolas pastorais, para que ele tenha escrito essas epistolas (sua ida para leste, para Êfeso, Macedônia, Creta, Trôade, Corinto, Mileto, Nicópolis e Roma), incluin­do a visita à Espanha, antes de sua ida a Creta, uma vez que a mesma fora planejada (ver Rom. 15:24,28), tendo sido mencionada por Clemente de Roma como um fato(«o limite do oeste»). A quarta objeção envolve a linguagem destas epistolas. Mui provavelmente, maior número de pessoas é influenciada por esse argumento do que por qualquer outro. A mais hábil exposição dessa dificuldade foi feita por P.N. Harrison, em The Problem of the Pastoral Epistles, (1921). Além dos argumentos, o dr. Harrison imprimiu o texto grego de modo a ajudar os olhos perceberem os fatos. Palavras que não aparecem em outras epístolas paulinas figuram em vermelho, frases paulinas (extraídas das outras dez epístolas) são sublinhadas, e hapax legomena são assinaladas por um asterisco. A primeira vista, pode-se ver que as palavras dessas três epístolas, que não se acham em outras epistolas paulinas, bem como frases paulinas comuns, são mais ou menos iguais. Os informes acerca de meras palavras, são mais ou menos como seguem, segundo disse Harrison: — palavras nas epistolas pastorais, que não figuram em qualquer outra parte do N.T. (nas epístolas pastorais são ‘hapax legomena’), 175 (167, conforme Rutherford); palavras nas outras dez epistolas paulinas que não se encontram em qualquer outra porção do N.T. 470 (627, conforme Rutherford). As variações nos manuscritos talvez expliquem algo da dificuldade de contagem. E claro que hâ uma maior proporção de novas palavras, nas epístolas pastorais (mais ou menos o dobro) do que em outras epístolas paulinas. No entanto, as tabelas de Harrison igualmente demonstram diferenças notáveis em outras epístolas. A média de tais palavras por página, na epístola aos Romanos, é de quatro, mas em II Coríntios é (te 5,6, em Filipenses é de 6,2, embora apenas de 5 em Filemom.
Parry (Comm., pág. CXVIII) observa que das oitocentas e quarenta e cinco palavras, existentes nas epístolas pastorais, em comparação umas com as outras, é que duzentas e setenta e oito ocorrem somente na primeira epistola a Timóteo, noventa e seis, apenas em Tito, e cento e oitenta e cinco apenas na segunda epístola a Timóteo. ‘Se considerarmos apenas o vocabulário, isso indicaria uma autoria separada para cada uma dessas epístolas’. No entanto, é evidente que o mesmo estilo aparece em todas essas três. Afinal de contas, o vocabulário não é um problema inteiramente pessoal. Varia segundo a idade, numa mesma pessoa, e também de conformi­dade com os temas abordados. Precisamente, tais diferenças existem nos escritos de Shakespeare e de Milton, conforme os críticos desde há muito têm observado. O único problema que resta é se essas diferenças são tão grandes, nas epistolas pastorais, a ponto de impedir a autoria paulina quando Paulo, o velho, escreveu sobre o problema da liderança pastoral a dois dos jovens ministros treinados por ele, que tinham de enfrentar a mesma heresia gnóstica incipiente, que o apóstolo já havia enfrentado em suàs epistolas aos Colossenses e aos Efésios. Meu parecer é que, levando-se em consideração todas as coisas, o conteúdo e o estilo das epistolas pastorais são genuinamente paulinos, suavizados pela idade e pela sabedoria, escritas talvez aquelas epistolas por sua própria mão, ou, pelo menos, pelo mesmo amanuen­se, em todas as três instâncias. Lock sugeriu que Lucas talvez tenha sido o amanuense de Paulo nas epistolas pastorais.
«A conclusão de Lock é de que ‘ou elas são (epistolas) genuínas ou são artificais’. (Int. Crit. Comm., pág. xxv). Se elas não são genuínas, então foram cartas forjadas no nome de Paulo (seriam pseudepígrafes). ‘O argumento com base no estilo favorece a autoria paulina; o argumento baseado no vocabulário é fortemente contrário a essa autoria, embora não de maneira conclusiva’. (Lock, op cit., pág. xxix).
Eu deveria ter afirmado ainda mais fortemente o caso em favor da autoria paulina do que fiz, e de agora por diante tratarei essas epístolas como produzidas por Paulo. Bem que Parry (Comm., pag. cxiii) diz: ‘Não é razoável esperar-se que uma carta particular, dirigida a um amigo pessoal, para sua própria instrução e consideração, exiba as mesmas características de uma epístola dirigida a uma comunidade para ser publicamente transmitida mediante leitura oral’». (A.T. Robertson, Introdução às Epistolas Pastorais).
Testemunho negativo antigo. Em contraste com a aceitação geral, desde os primeiros tempos do cristianismo, da autoria paulina das «epístolas pastorais», apareceram algumas dúvidas no começo do século II D.C. acerca dessa autoria. A autoria paulina foi negada tanto por Basílides como por Márcion (ver Tert. Adv. Marc. v.21). Taciano aceitava a epístola a Tito como paulina, mas negava como tais a primeira e a segunda epistolas a Timóteo (ver Jeronimo, Prol. at Titum); e havia outros, normal­mente considerados hereges, que concordavam com tais avaliações, conforme aprendemos nos escritos de Clemente (Alex. Strom. ii.ll) e de Tertuliano. Gemente e Jerônimo asseveravam que essas negativas foram motivadas pelo fato de que alguns não apreciavam seus ensinamentos anti ascéticos. Nos tempos modernos, alguns críticos têm aceito uma ou outra dessas três epistolas como paulinas, embora tenham negado a outras. O professor H.J. Rose (Journal of Theological Studies, outubro de 1923), com base no ritmo dos finais das sentenças, em toda a coletânea de escritos paulinos, concluiu que a segunda epístola a Timóteo é genuinamente de Paulo, mas rejeitou totalmente a primeira epistola a Timóteo, deixando a epístola a Tito em posição duvidosa.

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