Motivo e Propósitos do Livro de Apocalipse


Motivo.Deve ser óbvio, por aquilo que foi dito nas seções I e V, que o «motivo» que provocou a escrita deste livro foi uma grande perseguição tão severa que os cristãos primitivos só poderiam pensar que viviam nos dias imediatamente anteriores à «parousia» ou segundo advento de Cristo. A maioria dos estudiosos crê que essa foi a perseguição movida por Domiciano, o «segundo Nero», que houve pouco antes do fim do primeiro século de nossa era. A literatura apocalíptica tem a característica de tentar «saltar por cima» das crises presentes a fim de dirigir a mente dos fiéis para um futuro triunfo sobre os inimigos, com o estabelecimento da retidão. A última declaração do Apocalipse promete o retorno de Cristo para «breve». Em meio à morte e à destruição, os discípulos de Cristo esperavam o breve cumprimento das promessas referentes à «parousia». Dentre o reinado de Domiciano esperavam o aparecimento do anticristo para breve. O anticristo será a concretização do mal absoluto, pois ele será o servo perfeito de Satanás (ver o décimo terceiro capitulo do Apocalipse). E os cristãos primitivos criam que uma vez que se estabelecesse seu império mundial, logo Cristo voltaria, a fim de destruir o seu ímpio império. Este livro, portanto, foi escrito a fim de encorajar aos cristãos, pois o fim parecia bem próximo, ou seja, o «começo» do fim, o que eles podiam observar pessoalmente com facilidade. Este livro, pois, infunde «esperança» aos crentes que sofriam, relembrando-os sobre o «mundo eterno» que eventualmente seria estabelecido, ao passo que os reinos humanos, caracterizados pela cobiça e pelo poder, seriam reduzidos a nada.
Domiciano decretou o «culto ao imperador» de um modo que seus predecessores nunca tinham feito. Ele fez disso uma prova de lealdade ao império. Os cristãos, naturalmente, se recusavam a adorar ao imperador como se fosse um «deus», e as consequências disso foram desastrosas para os crentes. Desenvolveu-se até mesmo o culto à família dos Flávios, na qual se encarnaria a natureza divina da família de Domiciano. Mediante sua suposta divinda­de, além de sua «ascendência divina», procurou estabelecer um governo absoluto sobre os corpos e as almas dos homens. Promoveu ele a sua «divindade» através de holocaustos públicos. Os espectadores que vaiassem seus gladiadores eram executados, sob a alegação de que tinham mostrado falta de respeito, para com sua natureza divina. Os próprios cortesãos de Domiciano tinham de chamá-lo «Senhor e Deus». Ao seu próprio leito ele’, ridiculamente, chainava de «leito de um deus»; as festividades por ele instituídas eram denominadas «banquetes sagrados», e até o peixe servido nesses banquetes era considerado «sagrado». (Ver o artigo de Donald MacFayden, «The Occasion of the Domitianic Persecution», American Journal of Theology, xxiv, 1920, pp. 46-66, quanto a detalhes a esse respeito).
A história confirma a violência de Domiciano ao pôr em vigor todos os aspectos do «culto ao imperador». Não somente perseguiu aos cristãos, mas também mandou matar e banir a políticos, filósofos e até mesmo membros de sua família que parecessem oferecer-lhe resistência. Mandou executar seu primo, o cônsul Clemente, porque este parecia haver adotado o modo de vida judaico, o que, segundo pensava Domiciano, fizera dele um «ateu». Os livros de I Clemente, escritos de Roma, e Hebreus, escrito a cristãos romanos, evidenciam claramente as tremen­das perseguições dessa época da história.
Propósito.O propósito imediato da composição deste livro foi o de contrabalançar o temor e o desespero que, naturalmente, tomou conta da igreja cristã, o que talvez conduziu alguns à apostasia. Pois este livro mostra que o Senhor Jesus Cristo é o verdadeiro governante, o qual, finalmente, haverá de esmagar os poderes malignos, ao estabelecer o seu reino. Naquele tempo pensava-se que esse reino seria estabelecido dentro em breve (ver Apo. 22:20); assim sendo, havia boas razões para os crentes se encorajarem a sofrer pelo bem, como espírito triunfal até. O autor sagrado assegura a seus leitores que sem importar quão negra fosse a noite, o Dia estava próximo, o qual também os vingaria das perseguições que experimentavam, porquanto o «direito» seria universalmente estabelecido, ao qual pregavam e no qual criam.
Os demais propósitos deste livro, paralelos ao principal propósito, descrito no parágrafo acima, são os seguintes:
1.   Autoridade absoluta de Cristo, como o Alfa e o ômega de toda a existência humana (ver Apo. 1:8 e 22:13). Portanto, há somente um verdadeiro objeto de nossa adoração, que não é nenhum imperador romano.
2.   O autor sagrado tencionava ensinar muitas lições morais à igreja, corrigindo vários lapsos e erros, além de encorajar às igrejas da Ãsia Menor, e, através disso, a igreja cristã inteira (ver os capítulos dois e três de Apocalipse). Nem mesmo os tempos de crise e perseguição podem desviar nossos olhos da absoluta necessidade de um andar santo, da lealdade pessoal a Cristo, o qual é nosso Senhor.
3.   Tencionava ele, por semelhante modo, descrever os horrendos acontecimentos que terão lugar nesta terra que refletirão, especialmente, as condições dos «últimos dias», ainda que, sem dúvida alguma, isso tivesse alguma aplicação à igreja primitiva, bem como à igreja crista de todos os séculos. Não podemos deixar de sentir que as predições deste livro aludem, essencialmente, aos verdadeiros «últimos dias», isto é, ao tempo que precederá imediatamente à segunda vinda de Cristo, que falam sobre a «grande tribulação». Portanto, o Apocalipse é um paralelo claro do vigésimo quarto capítulo do evangelho de Mateus e do décimo terceiro capítulo do evangelho de Marcos. O autor sagrado cria que vivia «imediata­mente antes» do retomo de Cristo (ver Apo. 22:20), e sua mente foi focalizada sobre aqueles dias, a fim de que pudesse descrevê-los com exatidão. Mas ele cria que tudo sucederia durante seus dias ainda na carne. Nisso, porém, estava equivocado, embora isso em nada afete a validade de suas predições. Ele pensava que estava encorajando especificamente aos cristãos de seus dias; e isso certamente ele fez. No entanto, também encorajava àqueles que viverão nos verdadei­ros «últimos dias», prefigurados pelo reinado de Domiciano. Os capítulos sexto a décimo nono do Apocalipse nos fornecem as predições acerca do «tempo do fim».
4.   Ao expor a doutrina do segundo advento de Cristo (ver o décimo nono capítulo do Apocalipse), o autor sagrado mostrou, à vitória inteira, como é inevitável a vitória final de Deus e do seu Cristo. Pensava ele que veria pessoalmente a essa vitória, ainda em seu corpo mortal. Não sucedeu assim; mas isso não significa que sua doutrina não fosse veraz. Nós mesmos cremos, com base em predições contemporâneas, da parte dos místicos, que todos os eventos descritos no livro do Apocalipse ocorrerão até o ano de 2037, e que nossa época é, realmente, o «fim dos tempos». (Ver o artigo intitulado, Tradição Profética e a Nossa Época).
5.   O autor sagrado fornece-nos uma breve antevisão sobre o estado eterno (ver os capítulos vigésimo a vigésimo segundo do Apocalipse). Essa visão é breve, e certamente não é definitiva.
Possuímos informações surpreendentemente escassas sobre a «eternidade». Deus tem tempo suficiente para ensinar essas questões a seu povo. Aquilo que sabemos, entretanto, reveste-se de grande significa­ção. Deus e o bem, finalmente, triunfarão. O julgamento é real; a vida eterna é magnificente em suas bênçãos.

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