livro de Eclesiastes


I.    Caracterização Geral
Esse livro representa um tipo pessimista de literatura de sabedoria oriental, que mistura declara­ções otimistas que sugerem que um segundo autor pode ter estado envolvido, ou que um compilador posterior misturou os sentimentos expressos por dois autores diferentes. O título, no hebraico, Qoheleth, que significa Pregador ou Orador da Assembleia, foi traduzido por ecclesiastes, no grego (Septuaginta) de onde também se deriva o título em português. Ã base do vocábulo hebraico temos o substantivo kahal, «assembleia». Presumivelmente, foi o próprio Salo­mão quem convocou a assembleia para entregar seus discursos de grande sabedoria. Esse livro contémuma coleção um tanto frouxa de material, sendo difícil, estabelecer um estrito esboço do seu conteúdo. O trecho de Ecl. 9:17—10:20′poderia ser incluído no livro de Provérbios. Algumas porções apresentam o autor refletindo as suas próprias experiências ou admoestando outras pessoas, em vez de dirigir um discurso formal a qualquer tipo de assembleia. A integridade do livro e difícil de ser defendida. Quanto a peças literárias, esse vocábulo aponta para o conceito de que o livro foi produzido essencialmente por um único autor, e que existe até hoje conforme foi originalmente escrito.
II. Autor
Precisamos lembrar que, nos tempos antigos, atribuir um livro a algum autor famoso era considerado uma honra prestada a esse autor, especialmente se algumas de suas ideias estivessem sendo perpetuadas. Porém, muitas obras antigas eram atribuídas a pessoas bem conhecidas, com o propósito próprio de promover certas ideias ou filosofias, e com a esperança de que o nome vinculado ao livro ajudasse em sua distribuição. Os antigos simplesmente não pensavam como nós, no que concerne a essas práticas. Portanto, a afirmação de que certa pessoa é declarada autora de um antigo livro não garante que assim, realmente, sucedeu. Um exemplo notório dessa atividade aparece nos livros chamados pseudepigrafos (que vide), uma coleção que tem vários nomes de profetas do Antigo Testamento ou lideres espirituais, como se eles fossem seus autores, embora a realidade tivesse sido outra. Ê significativo que os Manuscritos do Mar Morto incluíam partes de vários desses livros, mostrando que as pessoas, bem ao lado da entrada de Jerusalém, consideravam-nos escritos sagrados. Não nos deveria surpreender, portanto, que alguns poucos dos livros canônicos da Bíblia, no Antigo e no Novo Testamen­tos, tenham nomes famosos vinculados a eles como autores, embora a realidade fosse outra.
O trecho de Eclesiastes 1:1 atribui o livro a Salomão. Mas Lutero negava a veracidade dessa afirmativa. Os eruditos liberais de modo geral concordam com a avaliação de Lutero, e é seguro dizer que muitos intérpretes conservadores tam­bém concordam com essa negação. Unger afirma que poucos estudiosos conservadores de nossos dias continuam defendendo essa tese de que Salomão foi o autor desse livro.
Em favor de Salomão como autor do livro, temos a considerar os pontos seguintes:
1.    Eclesiastes 1:1 atribui o livro a Salomão; e 1:12,13 quase certamente também o faz.
2.    A sabedoria da Salomão é refletida em vários textos, com declarações que mostram Salomão a falar. Ver Ecl. 1:16; 2:3-6 e 2:7,8.
3.    O trecho de Ecl. 9:17—10:20 contém muitos provérbios, o que sugere que o autor do livro de Provérbios (Salomão) também foi o autor de Eclesiastes.
4.    O caráter impar da linguagem e do estilo do livro parecem separá-lo das obras do período pós-exilico, conforme alguns têm pensado ser sua data. Isso poderia ser explicado como o desenvolvimento, por parte de Salomão, de uma espécie de gênero de linguagem e expressão literária. Há alguma similarida­de com os escritos cananeus e fenícios antigos, o que sugere que Salomão poderia ter tirado proveito dessa literatura, com adaptações próprias. MJ. Dahood, em seu artigo «Influência Cananeu Fenícia no Qoheleth», Bíblica, 33, 1952, defende essa compara­ção. Ele examinou inscrições e escritos que datam do século XIV A.C., os tabletes de Ugarite, o Corpus Insiptionum Semiticarum e inscrições fenícias e púnicas. Ele tentou defender sua teoria com base em fatores como a ortografia fenícia, a inflexão dos nomes e das partículas, a sintaxe e empréstimos léxicos, termos especiais referentes a itens comerciais e um vocabulário comercial. Os trechos de I Reis 9:26-28 e 10:28,29 mostram que Salomão pode ter tido contato com a língua fenícia, tendo usado termos e expressões comerciais e estilos literários usados pelos fenícios.
Contra Salomão como autor do livro, têm sido sugeridos os seguintes argumentos:
1.    Coisa alguma é mais clara, nos documentos antigos, do que o fato de que as declarações que afirmam autoria com frequência são espúrias.
2.    O autor sagrado pode ter sido um admirador de Salomão, em face de sua sabedoria, pelo que incluiu referências pessoais a ele, bem como a circunstância de sua vida, embora esse autor não tivesse sido o próprio Salomão. O que nos admira é que não existam ainda mais livros atribuídos a Salomão. O livro apócrifo, Sabedoria de Salomão, é um outro exemplo do nome desse monarca judeu ser usado para dar prestígio a um livro.
3.    Um autor posterior poderia ter imitado os Prov. de Salomão, tendo incluído no livro (Ecl. 9:17; 10:20) uma breve compilação, tendo chegado a tomar por empréstimo certos pensamentos, sem que ele mesmo fosse Salomão.
4.    Os argumentos de natureza linguística poderiam provar uma data antiga para o livro de “Eclesiastes, mas também poderiam demonstrar que o autor dificilmente poderia ter sido o mesmo autor do livro deProvérbios. — Ademais, um autor antigo, que tivesse escrito em um estilo bastante distinto, poderia ter tomado por empréstimo alguns elementos fenícios, sem que tivesse qualquer conexão pessoal com Salomão. De fato, a verdadeira natureza distintiva desse livro parece militar mais contra Salomão, como seu autor, do que em favor dele, a menos que suponhamos que ele conseguia escrever de duas maneiras inteiramente diferentes, quando passava de um livro para outro, algo que sabemos ser contrário àquilo que conhecemos a respeito dos autores e seus livros. A linguagem e o estilo literário são as impressões digitais dos autores, o que não se modifica facilmente de um livro para outro, senão à custa dos mais ingentes esforços. Exemplos históricos disso são dificílimos de achar.
5.    Certas ideias são contrárias à afirmação de que Salomão escreveu o livro de Eclesiastes. Alguns eruditos simplesmente não podem ver como um homem com a sabedoria de Salomão, com uma postura judaica ortodoxa, poderia ter escrito um livro tão pessimista quanto esse. Paralelos egípcios e babilônios demonstram que tal livro poderia ter sido escrito na época de Salomão; mas é inteiramente possível que aquilo que achamos nesse livro sejam invasões do pensamento helenista cético.
De fato, o propósito central do livro de Eclesiastes foi o de demonstrar que TUDO Ê VAIDADE ou inutilidade; que não existem valores permanentes, e que um jovem deveria cuidar para desfrutar o máximo de sua vida (hedonismo!). (Ver Ecl. 1:2; 3:13 ss; 11:9—12:8). Outrossim, o jovem que fizer isso terá pairando sobre a sua cabeça o juízo divino, um outro elemento da tese de que tudo é vaidade. «Faze o que bem entenderes;mas sabe que terás de pagar por isso!» Esse é um conselho muito difícil de seguir. Ê possível que Salomão, no declínio e apostasia que caracterizaram sua idade avançada, na verdade, tenha caído nesse tipo de armadilha; e, nesse caso, isso poderia refletir a autoria de Salomão.
6.    Alguns linguistas detectam no livro de Eclesias­tes um hebraico posterior, bastante diferente do hebraico da época de Salomão e mais próprio dos tempos helenistas.
7.    O pregador mostrou ser muito mais um filósofo e as suas atitudes foram bastante similares às atitudes dos filósofos epicureus gregos, depois do período da guerra do Peloponeso (404 A.C.). A atitude negativa dos gregos contra a religião judaica reflete-se em livros como I Macabeus e o Livro da Sabedoria, e o autor do livro de Eclesiastes parece ser um reflexo similar. O autor sagrado teria chegado ao mesmo tipo de conclusões a que chegaram seus vizinhos pagãos. O livro, pois, representa uma espécie de meio caminho na direção do paganismo, embora com o desejo de manter a posição da antiga fé. Por esse motivo, a lei continua sendo um elemento importante, e até mesmo o dever do homem (Ecl. 12:13), mas a lei não conseguiu impedir que o autor sagrado chegasse a conclusões tão pessimistas.
8.    Finalmente, há a questão da canonicidade. Ver abaixo, sobre o Cânon. Os próprios judeus não sabiam ao certo o que fazer com o livro de Eclesiastes. Se eles tinham certeza de que Salomão foi o autor do mesmo, não é provável que tivessem precisado de tanto tempo para incluí-lo no cânon do Antigo Testamento. A canonicidade do livro é algo que continuava sendo disputado nas escolas judaicas dos dias de Jesus Cristo.
Após o exame das evidências disponíveis, parece que a autoria salomônica repousa mais sobre o desejo de conservar a tradição do que a consideração dos fatos envolvidos. As evidências inclinam-se em favor de uma produção helenista, e não de uma produção que antecede a quase 1000 A. C.
III.  Integridade
Alguns eruditos argumentam em favor de dois autores distintos qué teriam estado envolvidos na escrita do livro de Eclesiastes, em vista de contradições que penetraram no mesmo. Outros estudiosos, porém, supõem que isso pode ser explicado pela atividade de algum editor. Tem havido tentativas para atribuir ao Koheleth dois, três ou mais autores; mas as evidências em favor dessa forma de atividade estão longe de ser convincentes. Por outra parte, é patente que algum editor procurou corrigir a incredulidade expressa pelo autor. Esse autor tem sido chamado de «o maior herege da antiga literatura dos hebreus», e algumas de suas declarações têm deixado consternados os eruditos da Bíblia, desde que o livro de Eclesiastes foi escrito. Para começar, sua filosofia básica de que tudo é vaidade,(Ecl. 1:2) é uma atitude pessimista que não concorda com o pensamento comum dos hebreus. O seu hedonismo (Ecl. 2:24 ss; 11:9—12:8) dificilmente concorda com a ética dos hebreus. Uma mesma sorte atinge o sábio e o insensato (Ecl. 2:12-17), de acordo com ele, o que é contrário à essência da teologia hebréia. Ele chega mesmo ao extremo de dizer: «Pelo que aborreci a vida… sim, tudo é vaidade e correr atrás do vento» (Ecl. 2:17). Ele nega qualquer vantagem à sabedoria e ao conhecimento, pois essas coisas também produzem no homem o desespero (Ecl. 1:17,18). O sábio morre como o insensato, e ambos acabam no olvido (Ecl. 2:16,17). Ele também nega a imortalidade da alma, pois o destino do homem seria o mesmo que o destino de um animal irracional (Ecl. 3:18-20). O versículo que se segue especula que pode haver certa, diferença entre um homem e um animal irracional—o espirito do primeiro subiria (para alguma outra forma de vida), ao passo que o espírito do segundo desceria, presumivelmente para ser esquecido—aparece sob a forma de uma indagação. O autor demonstra esperança, mas não exibe muita fé. Contudo, o trecho de Ecl. 12:7 afirma categoricamente que «o espírito volta a Deus». A maioria dos eruditos pensa que em tudo isso há a obra de um editor, ou de um segundo autor, que procurou suavizar o ceticismo do autor original do livro. Ou o autor original, ao chegar ao final de seu livro, apesar do seu desespero, resolveu deixar a sua sorte nas mãos de Deus e manifestou-se em favor da imortalidade como um meio de reverter o dilema humano?
Quase todos os estudiosos acreditam que o trecho de Ecl. 12:9-14 consiste em adições editoriais. De fato, o nono versículo foi escrito na terceira pessoa do singular. Ele fala sobre o pregador como uma pessoa diferente dele mesmo. Outras provas de que houve um editor ou um segundo autor encontram-se em Ecl. 2:26, onde se faz uma clara distinção entre o sábio e o insensato. Ali lê-se que ao homem bom são conferidos sabedoria, conhecimento e alegria, ao passo que o ímpio é coberto de vexames. Isso suaviza um tanto a filosofia do livro: «Tudo é vaidade». O trecho de Ecl. 3:17 parece ser uma outra adição, visto que o autor apela para o julgamento divino como meio de estabelecer diferença entre o homem bom e o homem mau. O trecho de Ecl. 12:12 provavelmente constitui uma crítica ao autor original, por parte do editor, louvando as declarações do homem sábio, que aparece como um Pastor (vs. 11), e adverte contra ultrapassar daí, o que, como é evidente, ele pensava que o autor fizera, em seu pessimismo. No décimo quarto versículo, ele apela novamente para o juízo divino e indica que o mesmo é importante, apesar das declarações pessimistas do autor, pois seremos julgados de acordo com aquilo que tivermos praticado. De fato, a passagem de Ecl. 12:9-14 é uma espécie de adição onde são acrescidos valores e limitações ao livro, segundo o espírito de ortodoxia. Se algum editor esteve atarefado nisso, é provável que o tenha feito mediante declarações mais otimistas e ortodoxas.
Em favor da Integridade do livro, alguns estudiosos pensam que as declarações contraditórias podem ser explicadas mediante a suposição de que um único autor ficou divagando em seus pensamentos, defen­dendo ora uma posição ora outra, mostrando-se assim autocontraditório, e isso sem importar-se em procurar harmonizar suas ideias mais pessimistas com suas ideias mais otimistas. Além disso, muitos pensam ser estranho que um editor tentasse salvar uma obra herética, cuja publicação só serviria para prejudicar o judaísmo em sua corrente central. A primeira dessas sugestões é possível. Eu mesmo falo nesses termos, algumas vezes. A segunda dessas sugestões constitui uma boa resposta, até onde posso ver as coisas. Qualquer pessoa que raciocine sobre o livro, apesar de seu pessimismo, fica impressionada pelo fato de que o mesmo é uma excelente peça literária. Suas declarações são sucintas e precisas, curiosas, às vezes, dotadas de discernimento penetrante. Há muitas boas citações, que são freqüentemente ouvidas, extraídas desse livro. Um editor qualquer, fascinado pela beleza do livro, contentar-se-ia em procurar corrigir alguns pontos’ falhos, em vez de descartá-lo inteiramente. Sua excelência como peça literária é tão inequívoca que aqueles que finalmente fixaram o cânon hebreu (embora ortodoxo), não puderam deixar de inclui-lo. embora a questão há séculos viesse sendo debatida entre os judeus.
Minha conclusão a respeito é que temos apenas um autor principal do Eclesiastes, e que um editor posterior procurou tirar as arestas da obra original, e que o trecho de Ecl. 12:9-14 é sua nota de rodapé, como uma sua conclusão sobre a obra do autor. Mas, exatamente quanto material foi adicionado, é algo que terá de permanecer em dúvida.
IV. A Inspiração Histórica da Obra
Se procurarmos entender o espirito desse livro, descobriremos que o autor era um filósofo que, embora judeu, fora influenciado pela pessimista filosofia dos gregos, especialmente da variedade epicureia. Os epicureus sentiam fortemente a inutilidade das coisas, objetando às ameaças de deuses imaginários, que receberiam homens que já teriam vivido de modo miserável, para fazê-los sentirem-se mais miseráveis ainda, com seus múltiplos e horrendos julgamentos. Eles prefeririam o olvido à imortalidade, como maneira de pôr fim a tanto sofrimento, e reduziam os poderes divinos a entidades deístas. Se eles realmente existem, então não teriam qualquer interesse nem pelo homem bom e nem pelo homem mau. Devemos lembrar que nem todos os judeus ofereciam resistência à helenização. Nem todos os judeus retiveram sua fé ortodoxa em face de inimigos que avançavam, destruindo e dispersando, e assim expunham filosofias que podem ter sido consideradas como uma avaliação mais justa da vida do que a avaliação apresentada pelo judaísmo, embora essas outras filosofias fossem mais pessimistas. Se o livro de Eclesiastes foi escrito em torno de 225 A.Ç., então o mesmo consiste em uma espécie de reafirmação daquilo que restou da fé judaica, visando algumas pessoas, fora da corrente principal do judaísmo, mas que continuavam sendo judias. Muitos judeus haviam começado a duvidar da doutrina dos galardões divinos em favor dos piedosos, e dos julgamentos divinos contra os iníquos. Eles chegavam a sentir que, afinal de contas, não há distinções fundamentais entre uns e outros. Nesta vida, a tragédia desaba sobre uns e sobre outros, igualmente; agora ambos vivem na inutilidade; e ambos entram no olvido, após a morte física. Não obstante, o autor sagrado exibe um saudável respeito pela lei de Deus. Ele não se bandeara inteiramente para o pensamento pagão. Ver o quinto capítulo do livro, do começo ao fim. Esse foi o elemento que o editor enfatizou, em sua conclusão (Ecl. 12:13,14).
V. Data
Se partirmos do pressuposto de que os argumentos em favor de Salomão como autor do livro de Eclesiastes são fortes, então teremos de pensar que a data de sua composição gira em torno da época de Salomão, cerca de 990 A.C. Impressiona-nos o caráter impar da linguagem usada, e suas afinidades com as expressões fenícias, mesmo que não aceitemos Salomão como o autor do livro. E poderíamos supor que esse livro é bastante antigo, se é que sofreu a influência fenícia.Mas, se ficarmos impressionados pela similaridade de idéias com certas idéias helenísticas, então talvez devamos pensar numa data de composição em tomo de 225 A.C. A maneira como os próprios judeus disputaram sobre o livro, tendo-o incluído no seu cânon sagrado somente após muita relutância, a despeito do mesmo reivindicar haver sido escrito por Salomão, pesa em favor da data posterior.
VI.  Canonicidade
Ver o artigo geral sobre o Cânon, do Antigo e do Novo Testamentos.
Quando foi definido o cânon da Bíblia hebraica, por ocasião do concílio de Jamnia, em cerca do ano 90 D.C., muitos judeus opuseram-se ao livro de Eclesiastes, alegando que o mesmo não era digno de receber posição entre os Escritos Sagrados. E mesmo mais tarde, quando o livro já estava fisicamente presente na coletânea sagrada, supostamente investi­do de autoridade, muitos rabinos continuaram opondo-se ao mesmo. Quando um judeu piedoso tomava nas mãos algum livro sagrado, lavava em seguida as suas mãos, em demonstração de respeito. Mas muitos deles, após terem manuseado o livro de . Eclesiastes, não pensavam que essa providência seria necessária, por não considerarem esse livro uma obra inspirada. Seria apenas uma habilidosa peça filosófi­ca, e não um dom do Espirito. Ver a Mishinah, Yadaim 3:5. Jeronimo, tão tarde quanto 389 D.C., conhecia judeus que se sentiam insatisfeitos com a inclusão do livro de Eclesiastes entre as Escrituras do Antigo Testamento. Não obstante, o livro tem encontrado um uso devido no seio do judaísmo. O livro de Eclesiastes é lido no terceiro dia dos Sukkoth (Tabernáculos), a tradicional festa da colheita entre os hebreus, com o propósito de lembrar os homens sobre a natureza transitória desta vida, e como uma advertência contra a cobiça pelas riquezas e vantagens materiais, além de servir para reiterar o importantis simo princípio da necessidade de obedecer à lei de Deus, como o maior e mais solene dos deveres humanos.
VII. Uso e Atitudes Cristãs
Os eruditos liberais não podem perceber o motivo para tantos debates. O livro volta-se contra certas crenças ortodoxas. E daí? Há pontos bons no mesmo; o livro exibe bons discernimentos; confere-nos alguma melhor compreensão sobre certos desenvolvimentos do judaísmo. De que mais precisaríamos? E os conservadores, que precisam defender a ideia da inspiração a qualquer custo’, para todos os livros do cânon, têm sido forçados a acomodar-se ao livro, provendo razões pelas quais o Espirito Santo teria achado apropriado incluí-lo no cânon. As respostas, quanto a essas questões, são similares àquelas que acabo de frisar acerca do cânon. Diz algumas coisas boas sobre a natureza transitória da vida humana, sobre a vaidade das coisas e atividades terrenas, e contém alguns versículos que servem de excelentes citações. Mas, que dizer sobre a sua falta de ortodoxia? Até hoje lembro-me de uma noite quando eu estava no escritório do presidente de uma das escolas teológicas que frequentei, quando ele fora chamado ao telefone. Alguém lhe telefonara para fazer uma pergunta sobre o livro de Eclesiastes. Como é que declarações daquela ordem podem ter penetrado na Bíblia? E ele replicou dizendo que o Espírito deixou que esse livro fizesse parte da Bíblia a fim de mostrar-nos o que o homem natural pensa e como ele chega a conclusões negativas, enquanto não recebeu ainda a fé apropriada. Em outras palavras, o livro, em sua porção não-ortodoxa, serviria de uma espécie de exemplo ao contrário, mostrando-nos as coisas que devem ser evitadas, que precisam ser observadas, mas repelidas. Esse tipo de raciocínio parece atrativo para a mente ortodoxa. E não digo que é uma posição inútil, embora, de certa maneira, seja uma resposta superficial.
C.I. Scofield, em sua Bíblia anotada, diz in loc., afirmando a posição conservadora da melhor maneira possível: «Este é o livro do homem debaixo do sol, que raciocina sobre a vida; é o melhor que o homem pode fazer com o conhecimento de que existe um Deus santo, e que ele trará tudo a juízo. As expressões chaves são debaixo do sol, percebi e disse em meu coração. A inspiração mostrou acuradamente o que sucede, mas a conclusão e o raciocínio, afinal, ê do homem. Sua conclusão de que tudo é vaidade, em face do julgamento, pelo que o homem não deve consagrar a sua vida às coisas terrenas, certamente é verdadeira; mas aconclusão (12:13) é legal, o melhor a que o homem pode chegar, à parte da redenção, sem antecipar o evangelho».
Essa é uma boa declaração, mas mesmo assim continua sendo curioso que um livro herético encontrasse caminho até o cânon do Antigo Testamento, por causa de seu estranho encanto. Não há explicação que possa alterar a estranheza desse acontecimento, VIII. Conteúdo
A discussão acima nos provê a natureza essencial do conteúdo do livro de Eclesiastes. Abaixo damos um esboço acompanhando ideias bem gerais:
I.     A Vaidade de Todas as Coisas (1:1-3)
II.    Demonstração da Tese Básica da Vaidade (1:4—3:22)
1.    Todas as coisas na vida são transitórias (1:4-11)
2.    O mal é provado por seus resultados (1:12-18)
3.    Há inutilidade no lucro, no. trabalho e nos prazeres (2:1-26)
4.    A morte mostra que tudo é inútil (3:1-22)
III.   Um Desenvolvimento Mais Detalhado do Tema (4:1—12:8)
1.     As injustiças da vida mostram a inutilidade das coisas (4:1-16)
2.     As riquezas para nada servem (5:1-20)
3.     A brevidade e futilidade da vida do homem provam a inutilidade das coisas (6:1-12)
4.     A inescrutável providência divina prova a inutilidade das coisas (7:1—9:18)
5.     As desordens e frustrações da vida ilustram a vaidade (10:1-20)
6.     Jovens e idosos demonstram a inutilidade das coisas (11:1—12:8)
IV.    Conclusão (12:9-14)
O dever inteiro do homem: guardar a lei na esperança de receber um bom julgamento divino.

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