Interacionismo (Dualismo)


O corpo existe. Não é uma ilusão. Participa da matéria, que é uma substância real. A mente também existe. Não é um mero epifenômeno das atividades cerebrais. A mente é real, posto que de um tipo diferente de substância, pois é imaterial. A pessoa humana é inerentemente dualista. A mente atua sobre o corpo, e o corpo atua sobre a mente, apesar das dificuldades que levantamos sobre como e onde essa interação ocorre. A mente usa o cérebro como um instrumento, mas não devemos identificá-la com o cérebro. O corpo físico limita a mente, enquanto a mente e o corpo existem formando uma pessoa. Isso pode ser ilustrado por um equipamento elétrico. Os geradores de uma grande hidrelétrica podem produzir uma prodigiosa quantidade de energia elétrica; mas, se eu disponho apenas de uma lâmpada de 40 watts, essa lâmpada sô dará luz correspondente a essa energia, a despeito do potendal quase ilimitado por detrás dela. A mente humana, mediada por meio do corpo físico, é reduzida a um mero fragmento de seu potencial. Um cérebro melhor permitirá que a mente funcione muito melhor. Defeitos no cérebro farão a mente entrar em curto-circuito. Assim também o órgão de algum tabernáculo mórmon é um instru­mento ponderável, mas a sua grandiosidade só se evidencia quando um instrumentista habilitado toca o mesmo. Por semelhante modo, a mente é um poder capaz de coisas admiráveis; mas se o instrumentista (o cérebro) é inferior, a mente não conseguirá manifestar grande coisa de si mesma.
A mente manifesta-se por meio de experiências místicas quando os homens transcendem a si mesmos mediante poderes que eles não entendem muito bem. A mente humana tem afinidade com a Mente divina; e bastaria essa afinidade para torná-la grande. Jung pensava que a mente humana é um depósito da his­tória inteira da humanidade, podendo sondar esse imenso depósito mediante a intuição e as experiências místicas. Eis por que, segundo alguns pesquisadores, alguns sonhos assemelham-se a sintonizar acidental­mente um aparelho de rádio a uma estação de rádio estrangeira. Tudo faz parte do inconsciente coletivo. Sócrates acreditava na Mente Universal, e pensava que através do raciocínio (como nos diálogos) e através da intuição e das experiências místicas, a mente humana pode sondar a Mente Universal. Platão fazia da mente humana uma instância da Mente Divina, uma espécie de transmissor limitado da mesma. Ele também cria que o corpo, com as percepções dos crassos sentidos, serve de obstáculo ao conhecimento, longe de ser a sede desse conhecimen­to.
Dualismo Naturalista. Alguns estudiosos crêem que a mente (a alma, a parte imaterial do homem) é produto da evolução, como sua mais significativa realização, até este ponto no tempo. Assim, é até mesmo possível crer na existência da alma, sem crer na existência de Deus. De fato, há ateus que são dualistas. Nesse caso, a alma, apesar de real, e apesar de ser perfeitamente capaz de sobreviver à morte do corpo físico, também é natural. Assim, a alma seria imanente, e não transcendente. Mas, se falarmos no destino da alma, à parte de alguma provisão celeste (comum à maioria das religiões), então, teremos entrado em uma esfera desconhecida, a menos, naturalmente, que postulemos a reencarnação, que, como é óbvio, perpetraria a existência natural e o meio ambiente da alma.
Dualismo Sobrenaturalista. A alma existe por haver sido criada por Deus (ou mediante emanação ou fulguração), e a sua associação ao corpo físico envolve propósitos educacionais. Ou, então, conforme Platão ensinava, o corpo é a prisão ou sepulcro da alma. A alma resolveu experimentar a materialidade, e acabou presa à mesma, e agora procura desvencilhar-se da matéria por meio da ascensão moral e espiritual. No conceito cristão, a alma participou da queda no pecado, ou antes (se a alma é preexistente), ou depois de sua associação ao corpo físico. Seja como for, a união com o corpo físico não é o estado ideal, e nem se espera que seja o estado final. Escreveu Paulo, em Filipenses 1:23: “…tendo o desejo de partir (morrer) e estar com Cristo, o que é incomparavelmente melhor”.
O Local da Interação. Esse é um dos mais complicados problemas do dualismo. Descartes pensava que o ponto de interação é a glândula pineal, localizada profundamente entre os dois hemisférios do cérebro. Outros postulam uma interação na localização de todas as células, ou onde se encontra o sistema glandular como um todo. O psicólogo Benjamim B. Wolman explorou o problema corpo- mente em sua obra Contemporary Theories and Systems of Psychology (1960), onde concluiu que apesar de haver uma constante interação corpo- mente, que é um fato observável, por enquanto ninguém sabe como e onde essa interação ocorre.
Dualismo Hindu. Essa fé religiosa tem produzido complexas ideias sobre a interação da mente e do corpo. Uma das versões do locus dessa interação é aquela que diz que ela tem lugar em sete centros de energia, chamados chakras( 18) — («rodas», no sânscrito). Esses centros de energia seriam vórtices de força. As energias espirituais manifestar-se-iam nesses locais, manipulando as energias do corpo físico. Esses sete centros dc energia encontram-se: na raiz (base da espinha dorsal); no sacrum (as áreas das forças vitais do homem); no plexo solar (no externo e adjacências); no coração; na garganta; na testa e no alto da cabeça. Esse último centro é o mais elevado, e ali é que se daria a consciência da presença de Deus, através da meditação e das experiências místicas. Esses sete vórtices de energia seriam como a escala musical de sete notas. As notas inferiores estão associadas ao corpo e suas necessidades; as notas superiores estão ligadas à intelectualidade e espiritua­lidade humanas. Uma versão mais simples dessa ideia é que as chakras ou vórtices de energia estão localizadas na posição das glândulas, controlando o corpo mediante o sistema glandular como um todo. As energias envolvidas seriam vibrantes e móveis, e a meditação poderia provocar a concentração de energias nas áreas intelectuais e espirituais mais elevadas, assim provendo iluminação ao indivíduo. Mas, quando essas energias concentram-se em tomo de suas gônadas (ainda segundo essa ideia), então, o indivíduo permanecerá essencialmente semelhante a um membro qualquer do reino animal. A meditação seria o meio de elevar para níveis mais altos essa concentração de energias.
Em favor desse elaborado sistema, os homens «santos» do Oriente apontam para as experiências místicas que ilustram as suas crenças, e não para evidências científicas, as quais, por enquanto, não existem. Outros salientam a acupuntura como prova, visto que se uma agulha é posta em um lugar, exerce efeito em outro lugar. Isso dever-se-ia, alegadamente, ao fato de que o homem é controlado pelos vórtices de energia, de tal modo que um toque em um ponto pode exercer efeito em outro.
Campos de Vida. O Dr. Harold Saxton Burr, professor de medicina da Universidade de Yale, detectou campos de vida em redor do corpo humano, tendo apresentado boas evidências de que as energias vitais do ser humano não terminam em sua pele. Ele usou voltímetros muito sensíveis, e descobriu que esse campo de energias pode ampliar-se até três metros fora do corpo. As radiações são maiores na cabeça, no peito e nas mãos, variando de pessoa para pessoa, aparentemente em harmonia com seus poderes mentais e suas energias vitais. Esse campo eletrodi- nâmico, de acordo com ele, é um tipo de molde de energia que organiza a matéria e lhe empresta a forma que ela assume. Ele pensava que esse campo é primário, obrigando a matéria a assumir as formas que ela assume, e não que, de alguma maneira, esse campo seja irradiado pela própria matéria. Burr ensinou naquela universidade por quarenta e três anos, e suas pesquisas quanto aos campos de vida foram um aspecto importante de seus interesses, durante aquele tempo. Publicou o livro Blueprint for Immortality, the Electrical Pattems of Life, em 1972, além de haver publicado, no espaço de muitos anos, noventa e três artigos sobre os campos de vida, em publicações eruditas(19). Sua teoria central foi apresentada como segue:
«O padrão ou organização de qualquer sistema biológico é estabelecido mediante um complexo campo eletrodinâmico, determinado em parte por seus componentes atômicos fisico-químicos, o que, por sua vez, determina parcialmente o comportamen­to e a orientação daqueles componentes. Es campo é elétrico, no sentido físico, e, mediante su s proprie­dades, relaciona-se a entidades do sistema biológico em um padrão característico. Em parte, esse padrão resulta da existência daquelas entidades. Esse padrão determina e é determinado por aqueles componentes. Além disso, precisa manter o seu padrão em meio ao fluxo fisico-químico. Portanto, precisa regular e controlar as coisas vivas. Precisa ser o mecanismo, a organização e a continuidade, de onde resultam a totalidade do sistema biológico» (20).
Edward Russell asseverou que algumas das descobertas deT3urr acerca das extensões do campo de vida merecem a sugestão de que os seres humanos possuem um campo controlador adicional, que pode ser a alma, o tema central de seu livro intitulado Design for Destiny, publicado em 1971. Pessoalmen­te, não vejo aí a alma do homem; mas parece que o campo de vida é um mecanismo controlado pelo intelecto (alma), e através do qual se relaciona ao corpo físico. O feto humano tem o seu próprio campo de vida, sendo possível que esse mecanismo esteja por detrás do controle do código genético, que produz o corpo da criança, segundo passos apropriados, para que tome a forma devida.
A Filosofia do Campo de Vida. Platão falava sobre as formas ou idéias que moldam o nosso mundo, de tal forma que os objetos físicos são imitações das formas. Burr referia-se aos campos de vida como compostos por energias sutis, similares à eletricidade, embora, em essência, não sejam elétricas. Ele acreditava que esses campos são responsáveis pela formação das células, pelo crescimento, pelo reparo dos tecidos e pela continuidade da vida biológica. Se Platão tivesse tido conhecimento disso, provavelmente teria suposto que as formas operam por meio desse tipo de mecanismo.
Avaliação e Critica:

1.  Alguns estudiosos criticam a idéia da interação com base no fato “é que ela favorece as noções religiosas, e que, talvez, resultem dos desejos religiosos. Michael Sabom, contrariamente a. isso, com base em seus estudos sobre as experiências perto da morte, ficou convencido de que esse é um ponto crupial. De acordo com seu parecer, a questão final,
levantada por casos de experiências perto da morte, por ele estudados em sua prática médica, é a evidente validade da doutrina religiosa da alma e sua sobrevivência ante a morte biológica. Ele acredita que essas experiências estejam formando uma ponte que, algum dia, fará ligar entre si a ciência e a fé religiosa(2Í).
2.   Cari Jung, através de seus estudos pela vida inteira acerca dos processos psicológicos humanos, também ficou convencido de que temos caido em muitos erros em nossas avaliações. «Temos tido de aprender, através de um sem-número de erros, que a medicina orgânica mostra-se totalmente impotente no tratamento das neuroses, e que os métodos psíquicos podem curá-las… Foi ao reconhecer esses fatos que a ciência descobriu a psiaue. e temos a obrigação de admitir a sua realidade» (22). — A medicina priro—omitira parece favorecer a ideia do intera- cionismo.
3.    Sigmund Freud apresentou muitas evidências corroboradoras que mostram que a psique pode afetar seriamente o corpo, conforme se vê nos casos de neurose, hipnose e as descobertas psiconalíticas em geral (23). — E chegou a crer na realidade dos fenômenos psíquicos por causa de seus estudos nesse campo e no campo dos sonhos(24).
4.    Estudos Neurológicos. Já pude ilustrar como os estudos sobre a neurologia têm convencido a alguns cientistas sobre a realidade da mente como uma entidade separada do cérebro. Minha citação de Wilder Penfield (seção I, ponto 5) ilustra isso. Sir John Eccles, prêmio Nobel de 1963, reconhecido por seus estudos acerca de como os nervos usam transmissores químicos para enviar mensagens ao cérebro, afirmou sem rebuços que a mente transcende ao cérebro, e afirmou ter descoberto o local exato, na área motora suplementar do cérebro, onde a mente interage com o cérebro. Segundo sua opinião, o comportamento não consiste em alguma descarga ad hoc e ao acaso de células cerebrais, e, sim, depende de alguma intenção não-material da mente, que age sobre as células físicas do cérebro, levando-as a disparar. Nisso, ele também via uma confirmação científica do livre-arbítrio, indicando que os homens são responsáveis pelo que fazem. A mente é a construtora(2S). A publicação Science Digest, de julho de 1982, no artigo intitulado «Scientists in the Search of the Soul», alista os seguintes cientistas como aqueles que estão desco­brindo indicações sobre a existência da alma, em suas pesquisas: Sir John Eccles; Sir Karl Popper; Eugene Wigner; Briam Josephson; David Bohm.
N.B. — O propósito dessas afirmações não é provar, em qualquer sentido, que o interacionismo é a verdadeira visão sobre o problema corpo-mente, mas apenas mostrar que existem cientistas respeitáveis que assim pensam. Logo, não podemos eliminar leviana­mente essa ideia. Meus próprios estudos sobre as experiências perto da morte lançam alguma luz sobre a questão, favorável à ideia do interacionismo.
5.    As crenças religiosas e as experiências místicas compõem uma parte importante das experiências humanas. Elas favorecem o dualismo corpo-mente, e as evidências fornecidas por elas devem ser levadas em consideração.
6.    As qualidades psicológicas como a vontade, as ideias morais, os conceitos de desígnio, finalidade e propósito parecem transcender ao que poderíamos esperar das funções das células cerebrais.
7.   Os estudos no terreno da parapsicologia, em seus aspectos da telepatia, da clarividência, das curas psíquicas, do retroconhecimento, do pré-conhecimento e da psicocinese, parecem favorecer o dualismo.
8.    As experiências perto da morte parecem favorecer o interacionismo.
9.   As afirmações em contrário incluem aquelas que salientam que se não podemos falar com muita inteligência sobre a matéria, muito menos ainda podemos fazê-lo acerca da ménte ou ideia. O que fazemos é simplesmente transferir os nossos problemas para um passo atrás, encontrando na mente o iniciador misterioso da cadeia de eventos que resulta em algum fenômeno físico. Não obstante, não sabemos como definir a mente. Antes de mais nada, precisamos confessar que nisso tudo há uma profunda verdade. Todavia, dispomos de algumas descrições de como a mente funciona, mesmo que não tenhamos qualquer definição sobre o que é imaterial. Há evidências em prol da existência independente da mente, a despeito do fato de que não há qualquer descrição metafísica do que seja sua substância ou essência.
10.   O Local da Interação. Têm sido feitas algumas sugestões a respeito, e talvez haja alguma verdade nessas sugestões. Entretanto, ainda continuamos esperando por uma boa explicação sobre o assunto. Essa dificuldade, contudo, não anula aquilo que já sabemos.

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