Integridade e Confirmação Histórica das Epístolas Pastorais


Integridade. Se estas «epistolas pastorais» são genuinamente paulinas, então há pouca razão para supormos que não teriam sido preservadas até nós praticamente como foram escritas. Somente quando imaginamos que Paulo não as escreveu é que calmos em dificuldades acerca de sua forma original. Mas a maioria dos eruditos modernos rejeita a autoria paulina, supondo que o verdadeiro autor, tendo escrito após o martírio de Paulo, entrara em contacto com certos escritos autênticos de Paulo, incorporan- do-os em sua composição, sendo talvez ajudado nessa empresa pelas tradições orais existentes acerca da vida do apóstolo dos gentios. Isso explicaria as várias «porções pessoais». Essas porções são passagens como I Tim. 1:3,20; II Tim. 1:5,15-17 e 4:9-21.
Vários outros estudiosos consideram-nas autênticas quanto às informações que nos prestam, ilustrando uma quarta viagem missionária, após o primeiro período de encarceramento do apóstolo, em Roma, um período da vida de Paulo completamente fora da narrativa do livro de Atos. Esses informes particula­res, entretanto, mostram-nos que Paulo ainda estava bem distante de Roma quando escreveu, pois talvez tenham sido escritas pouco depois de sua soltura, tal­vez em Filipos (I Tim. 1:3). Outros textos, como I Tim. 1:12 e ss, e 5:9-16, facilmente poderiam ter-se alicerçado sobre material escrito por Paulo.
Na primeira epístola a Timóteo, as passagens abaixo citadas têm sido recebidas (por alguns eruditos) como genuinamente paulinas, incorporadas pelo autor em sua epístola: I Tim. 1:1-10,18-20; 4:1-16; 6:3-16,20 e ss. Outros eruditos dividem em duas seções ou localizações de onde teriam vindo materiais paulinos incorporados nestas «epístolas pastorais», cada seção composta em um local diverso: De Corinto (I Tim. 1:3 e ss; 1:18-20; 2:1-10; 4:12 5:1-3,4-6,11-13,19-23,24 e ss). De Cesaréia (I Tim 1:12-17; 3:14-16; 4:1-11; 5:7 e ss; 6:17-19; 1:5-11 6:2,20,21). Naturalmente, esses «refinamentos» se baseiam em puras conjecturas, sendo mencionados apenas para mostrar que tipo de atividade os eruditos levam a efeito, quando abordam o problema da integridade.
Na segunda epístola a Timóteo, dois pensamentos diversos são entrelaçados. O primeiro diz: «Vem e reúne-te a mim em Roma». O segundo diz: «Paz teu trabalho como evangelista, em Efeso». E essas duas declarações se neutralizam, exceto se a vinda a Roma foi proposta apenas como uma visita. Por outro lado, essas questões pessoais podem ter sido incorporadas na composição de um autor posterior, de modo um tanto desajeitado. Por isso é que alguns estudiosos têm proposto a vinculação de duas epistolas, uma particular (ver II Tim. 4:9-21), à qual pertenceriam saudações pessoais (ver II Tim. 4:22 ss), e a outra uma epistola geral e pastoral (ver II Tim. 1:14-18). Lock (Internacional Criticai Commentary), na intro­dução às «Epistolas Pastorais» (xxxiii), acredita que porções de duas epístolas paulinas genuínas foram incorporadas em uma única composição, por parte de um autor posterior, a saber: II Tim. 1:1—4:8, escrita de Roma—e II Tim. 4:9-22, escrita algum tempo antes daquela. Cria aquele autor que a segunda epístola a Timóteo é essencialmente paulina, mas que a primeira epístola a Timóteo e a epístola a Tito seriam essencialmente não-paulinas, com algumas inserções de material paulino genuíno.
Os fragmentos genuínos de material paulino, (segundo alguns estudiosos), na epistola a Tito, podem ser os trechos de Tito 1:1-4 e 3:12,13 (segundo Von Soden); ou Tito 1:1-6 e 3:1,7,12,13 (segundo McGiffert); ou mesmo Tito 3:12-15 (segundo Harri- son). Muito mais poderia ser dito acerca da integridade das «epistolas pastorais», mas assim fazendo entraríamos em grande número de especula­ções essencialmente infrutíferas, praticamente desti­tuídas de importância. O leitor curioso poderia consultar a introdução às Epistolas Pastorais por Walter Lock, no International Criticai Commentary, xxxi-xxxv. Em tempos mais recentes, a tendência tem sido negar que qualquer material genuinamente paulino tenha sido incorporado nessas epístolas, mas que todos os informes pessoais e as localidades mencionadas, que parecem ter tido ligação com a pessoa de Paulo, foram criações do autor dessas epístolas. Se essa opinião está com a verdade, isso significaria que não há qualquer problema de «integridade», mas tão-somente de «autoria».
Podemos confiar muito pouco nas muitas especula­ções sobre os problemas de integridade, e temos mencionado estas coisas somente para satisfazer a curiosidade do leitor.
Confirmação Histórica. A confirmação histórica, em favor da autoria paulina e da canonicidade das «epistolas pastorais» se assemelha muitíssimo com o caso das demais epístolas existentes de Paulo. Todas elas foram citadas como livros de autoria de Paulo por Irineu(180D.C.), em seu Cont. Haer. Praef. ii.14.7 e iv. 16:3(1 Timóteo); iii.2,3 e iii.l4:l (II Timóteo); e i.16.3 (Tito). Essas epístolas foram incorporadas nas traduções latina e siriaca, pelos meados do segundo século de nossa era. Há várias coincidências de linguagem que podem indicar que elas já eram conhecidas por Clemente de Alexandria e por Inácio. Não há que duvidar que Policarpo também as conhecia, em cerca de 135 D.C. (Ver evidências a esse respeito, sob a discussão acerca da «Data» das epístolas pastorais, na seção III deste artigo).
Após o segundo século da era cristã, a confirmação se toma normal nos escritos de quase todos os pais da igreja. Clemente de Alexandria (em Alex. Strom. lib. 2) Tertuliano (em De praescript. hearet., cap. 25); Teófilo (em Ad Auto., cap. 3 acerca da primeira epístola a Timóteo). Os mesmos autores citam também as duas outras «epistolas pastorais». Eusébio (em H.E. 11.22) cita a segunda epistola a Timóteo; e em sua obra, Homologoumena, alista todas as três epístolas como documentos aprovados do «cânon» do N.T.
Também há evidências negativas acerca da autoria paulina das «epistolas pastorais», conforme se vê nos escritos de Basílides (130 D.C.) e de Márcion (150 D.C.), conforme se sabe através dos escritos de Tertuliano (Adv. Marc. v.21) e de Taciano (150 DC.), que aceitavam a epístola a Tito mas rejeitavam as outras duas (Jerônimo, Prol. ad Titum). Clemente de Alexandria (Strom. ii.ll) diz-nos que havia outros «hereges» que se sentiam igualmente repelidos pelas « epístolas pastorais». Isso poderia ser devido ao tom antignóstico e/ou antiascético dessas epístolas.

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