Esdras


I.    Pano de Fundo Histórico
O ataque dos exércitos assírios resultara na queda de Samaria, capital do reino do norte, em 722 A.C. Disso proveio o cativeiro assírio (que vede). A dominação assíria de Judá começou em 721 A.C., quando caiu o reino do norte; mas Judá nunca se tomou, realmente, uma província assíria. Todavia, Judá teve de pagar tributo aos monarcas assírios. Com o surgimento da Caldéia, sob Nabucodonosor (605-562 A.C.), a situação de Judá deteriorou-se rapidamente. Em 592 A.C., Nabucodonosor invadiu Judá e levou para o cativeiro o seu rei, Jeoaquim, e os líderes principais da nação. O trecho de II Reis 24:15 mostra-nos que Ezequiel encontrava-se entre os cativos. Presumivelmente, antes disso, uma deportação anterior já tivera lugar. Então veio a deportação na qual Ezequiel esteve envolvido. Na Babilônia, ele predisse a destruição de Jerusalém e de seu templo, o que seria seguido ainda por uma terceira deportação. Em 586 A.C., Nabucodonosor, segundo Ezequiel havia predito, deixou Judá em ruínas, abafando a revolta nacionalista que havia arrebentado ali. Isso completou a destruição de Judá e mais habitantes de Jerusalém foram levados para a Babilônia. Ver a narrativa completa no artigo sobre o Cativeiro Babilônico.
Após relatar a história da monarquia e do templo, até o exílio, o autor do livro de Esdras passa por cima do tempo em que o templo ficou arruinado, quando os principais homens de Judá encontravam-se na Babilônia, e registrou o retomo predito, o que, finalmente, levaria à reconstrução do templo, sob as ordens de Zorobabel (da linhagem de Davi) e de Josué (da linhagem de Aarão). Em seguida, o autor sagrado descreveu o estabelecimento da nova comunidade judaica, durante o período de 538-433 A.C.
A sorte mudou e os judeus, no cativeiro, caíram sob o domínio da Pérsia, quando Ciro conquistou a Babilônia, em 539 A.C. O livro de Esdras alista certo número de reis persas. Se considerarmos os livros de Esdras e Neemias como uma única unidade, então acharemos ali os nomes de Ciro (539-530 A.C.), que permitiu que alguns cativos judeus retomassem à Palestina; Cambises (530-522 A.C.); Gaumata (pseudo Esmerdis, 522 A.C), que foi um usurpador; Dario 1 (522-486 A.C.), referido nos capítulos quinto e sexto do livro de Esdras; Xerxes I (486-465 A.C.), referido em Esdras 4:6; Assuero, da rainha Ester; Dario e Xerxes invadiram a Grécia, mas sem obterem sucesso (a história narrada por Heródoto); Artaxerxes I (464-424 A.C.), aludido em Esd. 4:7-23 e 7:1 — 10:44. O ministério inteiro de Neemias cabe dentro desse último período. Mas, conforme já pudemos mencionar, alguns estudiosos situam Esdras dentro do tempo de Artaxerxes II, o que transferiria as suas atividades para cinquenta anos mais tarde.
II.    Esdras o Homem e a sua História
Esse ponto foi manuseado em um artigo separado.
Ver sobre Esdras (Pessoa), em seu terceiro ponto. Esse artigo, além de mostrar para o leitor o que se sabe acerca de Esdras, também presta informações sobre o passado histórico do livro, que suplementa a primeira seção do presente artigo.
III.    relação e características literárias
O livro de Esdras fazia parte original de uma obra literária mais extensa, que incluía os dois livros de Crônicas e o livro de Neemias. Por isso, os eruditos falam sobre o cronista como o autor ou compilador de todo esse material. — Seu relacionamento com Esdras tem sido causa de debates. Ver sobre Autoria. É evidente que a unidade Esdras-Neemias tem o intuito de dar prosseguimento à narrativa iniciada nos livros de Crônicas. Comparar os versículos finais de II Crônicas com os versículos iniciais do livro de Esdras. Esdras-Neemias foi preparado para suplementar os livros de Crônicas, com base em documentos aramaicos e hebraicos, então existentes. Esses documentos continham as memórias de Neemias e as memórias de Esdras. Os livros de Crônicas terminam com a destruição de Jerusalém e a consequente deportação dos judeus para a Babilônia. Esdras dá prosseguimento a esse propósito, narrando como um remanescente retornou, a fim de reestabelecer a nação judaica em torno de Jerusalém. O cronista, pois, via aqueles pioneiros como um remanescente piedoso, dotado de uma missão espiritual. E a história tem confirmado essa avaliação.
Os intérpretes veem algumas deslocações cronológicas na unidade Esdras-Neemias, pelo que a leitura continua desses dois livros não fornece a devida sequência dos acontecimentos. O livro apócrifo de I Esdras com frequência preserva melhor a ordem histórica dos acontecimentos. Se alguém ler as porções seguintes, na ordem aqui apresentada, obterá uma melhor sequência cronológica: Esd. 1:1 — 2:70; Nee. 7:7-73a; Esd. 3:1 — 4:6; 4:24 — 6:22; 4:7-23; Nee. 1:1 — 7:5; Nee. 11 — 13; 9:38 — 10:39; Esd. 7 — 10; Nee. 8:1 — 9:37. Um certo editor, ao tentar evitar essa confusão cronológica, procurou melhorar a situação mediante várias inserções, como aquela em que punha o nome de Neemias em Nee. 8:9, e o de Esdras em Nee. 12:26 e 36.
O livro de Esdras é complexo, consistindo em uma porção em aramaico (Esd. 4:7 — 6:18; 7:12-26) e de uma porção em hebraico (7:1-10; 7:27 — 10:44). Alguns eruditos supõem que as duas porções, antes, existiam separadas, mas que um editor qualquer as reuniu; ou então que a porção hebraica foi unida à porção aramaica, a fim de compor uma única narrativa. O decreto real (Esd. 7:12-26) provavelmente consistia em um documento separado, que foi juntado à história. A própria narrativa é complexa, porquanto uma parte da mesma consiste em autobiografia (Esd. 7:27 — 9:15), ao passo que a outra parte é biográfica (7:1-26; cap. 10). Além disso, parte do material pertencente a Esdras foi transplantado para o livro de Neemias, como porções do capitulo sétimo, até o nono capítulo.
Nos tempos antigos, vários livros circularam sob o nome de Esdras. Ver os artigos separados sobre I e II Esdras, que são livros apócrifos.
O livro canônico de Esdras faz parte da terceira divisão do cânon hebraico, chamada Escritos ou Hagiógrafos (que vede). No hebraico, aparecia originalmente combinado com Neemias, formando uma única unidade. A tradição judaica atribui o livro de Esdras a Esdras. Pelo menos, suas memórias estão incluídas no livro.
IV.    Autoria e Data
Questões como estilo, abordagem, propósito comum e repetição de usos verbais apontam para um compilador que trabalhou sobre os livros de Crônicas, Esdras e Neemias, como se formassem uma só unidade. Várias fontes informativas podem ser percebidas; pelo que, se Esdras foi o autor, então ele atuou quase sempre como mero compilador de materiais já existentes. Precisamos reunir em um único bloco os seguintes materiais;
1. As memórias de Esdras (Esd. 7:27 — 9:15). O emprego da primeira pessoa do singular, nessa seção não significa, necessariamente, que Esdras, e somente ele, tenha escrito a unidade inteira, conforme alguns pensadores têm dito. 2. Asmemórias de Neemias (Nee. 1:1 — 7:5; 11:27-43; 13:4-30). 3. Os documentos em aramaico (sendo essa linguagem diplomática da época; Esd. 4:8-24), que, evidentemente, pertencem, em ordem cronológica, um pouco antes do primeiro capitulo do livro de Neemias. Ver Esd. 4:21 em comparação com Nee. 1:3. No aramaico, temos a carta a Dario I e sua resposta (Esd. 5:1 — 6:18). Além disso, nesse idioma, temos a autorização de Artaxerxes, permitindo que os judeus retornassem do cativeiro à sua terra (Esd. 7:12-26). 4. Em seguida, há várias listas de nomes, que foram inseridas com certa variedade de propósitos: a. os exilados que retornaram (Esd. 2; comparar com Nee. 7); b. aqueles que se tinham casado com mulheres gentias, e tiveram de divorciar-se delas, quando da reforma religiosa de Esdras (Esd. 10:1843); c. os construtores das muralhas de Jerusalém e os trechos das mesmas em que trabalharam (Nee. 3); d. os líderes que apuseram seu selo ao pacto estabelecido, em tomo da restauração de Israel e seus novos começos (Nee. 10:1-27); e. a alocação do povo, em Jerusalém e nas circunvizinhanças (Nee. 11); f as listas de sacerdotes e levitas, até Juda (Nee. 12:1-26). Talvez esse tenha sido o Judeu que foi sumo sacerdote durante o reinado de Dario
II (338-331 A.C.). Supomos que listas como essas estavam guardadas nos arquivos do templo. Um autor qualquer dificilmente poderia tê-las arranjado sozinho. 5. Depois disso, temos a porção narrativa do próprio autor compilador, procurando reunir todo esse material, unificando as diversas inserções feitas. A tradição judaica piedosa atribui a obra inteira a Esdras; mas a maioria dos eruditos modernos pensa que algum compilador desconhecido mostrou-se ativo. O próprio livro é anônimo, pelo que não há como chegarmos a conclusões indubitáveis sobre a questão da autoria.
Data. As várias datas atribuídas ao livro dependem da identidade do rei Artaxerxes, referido no livro, isto é, se foi Artaxerxes I ou Artaxerxes II. Isso cria uma diferença de cinqüenta anos, de 458 A.C. para 397 A.C. Alguns estudiosos supõem que a escrita real pode ter tido lugar cem anos ou mais depois dos eventos descritos. Se o Judeu de Nee. 12:11,22 fosse identificado com o sumo sacerdote desse nome, do reinado de Dario III (338-331 A.C), então o livro de Esdras, em sua forma final, poderia datar dessa época. Uma cópia atualizada, entretanto, pode ter sido feito com base nessa adição e o restante pode ter sido preparado algum tempo antes.
V. Cânon
A canonicidade de Esdras-Neemias nunca foi posta seriamente em dúvida. Esdras, como uma espécie de segundo Moisés, foi o fundador da segunda república judaica, por assim dizer, pelo que também tinha um enorme prestígio dentro das tradições judaicas. Ver o artigo geral sobre o Cânon do Antigo Testamento. A unidade Esdras-Neemias aparece no terceiro grupo do cânon hebraico, intitulado Escritos ou Hagiógrafos (que vede). Ilogicamente, antecede os livros de Crônicas, naquela coletânea hebraica; mas, provavelmente, isso deve-se ao fato de que os livros de
Crônicas são paralelos aos livros históricos de Samuel e Reis, pelo que os livros de Crônicas poderiam ser lidos como um suplemento dos mesmos, e não como uma continuação histórica dos mesmos.
VI.    Alguns Problemas
Os informes históricos existentes no livro de Esdras nem sempre concordam com aquilo que se sabe, através da história secular. Além disso, alguns estudiosos vêem certas discrepâncias internas entre as várias fontes informativas incorporadas pelo livro. Consideremos os três pontos abaixo:
1.    Ciro, em Esd. 1, reconheceu o Deus dos judeus, Yahweh. Mas, um monarca pagão faria tal coisa? Qualquer político teria o cuidado de tratar respeitosamente as crenças religiosas de um povo. Os registros contemporâneos, que envolvem Ciro, ilustram precisamente isso, por parte dos decretos reais.
2.    Em Esdras 3:8 lemos que Zorobabel lançou os alicerces do templo de Jerusalém; mas, em Esdras 5:16, isso é atribuído a Sesbazar, que é referido ali como alguém que já havia falecido. Alguns estudiosos pensam que a construção se processou em dois estágios: um iniciado por Sesbazar e o outro iniciado por Zorobabel. Ou então Sesbazar foi o líder oficial, ao passo que Zorobabel foi um entusiasta ativo, tanto em 536 A.C., como posteriormente, em 520 A.C.
3.    Com base em Ageu 2:18, aprende-se que os alicerces do templo foram lançados em 520 A.C.; mas Esdras 3:10 parece indicar que isso aconteceu em 536 A.C. Alguns supõem que ambos os informes dizem a verdade, e que o intervalo de dezesseis anos, entre a primeira e a segunda arrancadas é considerado um começo. £ possível que isso tenha acontecido, e que mais de uma pedra oficial de fundação tenha sido lançada, cada qual assinalando um esforço específico de reconstrução.
Explicações como essas são apenas conjecturas, embora elas não sejam questões importantes para a fé, mesmo que sejam encontradas algumas discrepâncias. Os próprios livros sagrados não reivindicam perfeição. Essa é a reivindicação de teólogos, que injetam nas Escrituras ideias que elas mesmas não exprimem. Já vimos que a compilação da unidade Esdras-Neemias foi feita com algum defeito de arranjo cronológico. As deslocações cronológicas também formam um problema nos evangelhos; mas isso não envolve questões de fé, exceto para os harmonizadores que queiram obter perfeição a qualquer preço.
VII.    Esboço do Conteúdo
O livro de Esdras divide-se em duas partes principais, a saber:
I.    O Retorno dos Exilados sob Zorobabel (1:1 — 6:22)
1.    Retornam os primeiros cativos (1:1 — 2:70)
a.    Ciro favorece aos judeus com seu decreto (1:111)
b.    A lista dos exilados (2:1-7)
2.    A adoração judaica é restaurada (3:1 — 6:22) a. O templo é reconstruído (3:1 — 6:15)
b. A dedicação do templo (6:16-22)
II.    Reformas de Esdras — O Reinicio de Israel (7:1 — 10:44)
1. A segunda leva de exilados (7:1 — 8:36)
2. Divórcio forçado das esposas estrangeiras; a purificação (9:1 — 10:44).

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