Data e Proveniência


Se essas epístolas pastorais porventura não são genuinamente paulinas, então as questões de data e proveniência são artificiais, quando aplicadas à vida de Paulo. Com base em questões de vocabulário, julgaríamos que essas epistolas datam dos fins do século I D.C., ou do começo do século II D.C. Qualquer tempo após 64-68 (tempo em que Paulo foi martirizado) teria sido possível, até cerca de 115 D.C., mas, mais provavelmente ainda, entre 60 e 90 D.C. Márcion(100-150 D.C.) menciona e rejeita essas epistolas como paulinas, o que significa que já estavam em circulação pelo menos no começo do segundo século de nossa era. Alguns estudiosos vêem nas epístolas de Clemente (95 D.C.) algumas reminiscências das epistolas pastorais, o que talvez indique que elas já circulavam por esse tempo. Em cerca de 140 D.C., as epístolas pastorais foram traduzidas e incorporadas nas versões siríaca e latina. Há notáveis coincidências de linguagem nas epístolas de Inácio e Policarpo, o que significa que as epistolas pastorais já eram bem conhecidas pelos cristãos antes de 115 D.C. É significativo que o conhecimento sobre as epístolas pastorais, antes do tempo de Márcion, parece preceder (pelo menos como forma de evidência) algumas das inquestionáveis epístolas paulinas, como Romanos e II Corintios. Não se pode dizer sem mentir que elas já fossem conhecidas antes de outras epistolas paulinas; mas as evidências sobre o conhecimento de pelo menos algumas delas, depois da era apostólica, são mais fortes do que no caso de algumas das epístolas comumente aceitas como paulinas.
Há eruditos que pretendem datar as «epistolas pastorais» entre 140 e 180 D.C., supondo que são, essencialmente, documentos antimarcionistas. Mas tal data é atrasada demais, em face das considerações expostas mais acima, como também em face do fato de que refletem uma organização eclesiástica anterior à época de Inácio, o que significa que precisam ser datadas em antes de 110 D.C. (Ver as notas expositivas sobre «A Quem Foram Dirigidas», que discutem sobre as epistolas de Inácio, em comparação com estas «epístolas pastorais»). Notáveis semelhan­ças com os escritos de Policarpo podem ser vistas nas seguintes comparações: Policarpo Fil. 4:1 (ver I Tim. 6:10,17); Policarpo, Fil. 9:2 (ver II Tim. 4:10); Policarpo, Fil. 5:2 (ver II Tim. 2:12 e I Tim. 3:8); Policarpo, Fil. 11:4,11 (ver II Tim. 2:25); Policarpo, Fil. 12:3 (ver I Tim. 2;1,2).
— Parece que todos esses casos refletem as epístolas pastorais nos escritos de Policarpo. Os caso? nos escritos de Clemente e de Inácio são por demais fragmentares e vagos para fazermos um juízo certo a respeito.
Se Paulo realmente escreveu as «epístolas pasto­rais», então podemos situá-las juntamente com as outras «epistolas da prisão», como a epístola aos Filipenses (escrita em cerca de 64 D.C.), e a cidade de Roma teria sido o local de sua composição. Ou poderíamos aceitar a tradição, preservada no fragmento muratoriano (ver as notas expositivas sob o ponto quinto da discussão acerca da Autoria) e nos dizeres de alguns dos pais da igreja, no sentido de que Paulo foi solto da prisão, durante cujo período as epístolas aos Filipenses e a outros foram escritas, tendo passado algum tempo em liberdade, embora não saibamos dizer quanto tempo. (Comentado no NTI, Atos 28:31). Se realmente esse foi o caso, então, mui provavelmente, a primeira epístola a Timóteo e a epístola a Tito foram escritas primeiro, sem importar qual das duas realmente foi a primeira; e depois teria sido escrita a segunda epistola a Timóteo. (Ver I Tim. 3:14; Tito 3:12 quanto ao fato de que Paulo pode ter estado em liberdade quando escreveu essas citadas epistolas, pois vê-se que não estava sob ameaça de morte imediata). A passagem de II Tim. 4:6 e ss, entretanto, indica que ele esperava o martírio para breve. Que a segunda epístola a Timóteo deve ser encarada como a última das epístolas do apóstolo dos gentios, pouca dúvida resta; mas é difícil dizer se antes foi escrita a epístola a Tito ou a primeira epístola a Timóteo. Seja como for, todas essas três epístolas devem ter sido escritas depois de 64 D.C., mas até 68 D.C., o mais tardar.
Se as epistolas pastorais devem ser agrupadas juntamente com aquelas escrituras no primeiro aprisionamento, então todas as três foram escritas em Roma. Mas se Paulo escreveu a primeira epistola a Timóteo e a epistola a Tito, no intervalo entre dois períodos de encarceramento, então devem ter sido elas escritas em algum lugar no Ocidente, talvez na Espanha. Nesse caso, a segunda epistola a Timóteo deveria ter sido escrita em Roma, durante o segundo aprisionamento de Paulo. Na verdade, é impossível reconstituirmos esse período da vida de Paulo, acompanhando-o em todos os seus movimentos, porquanto estes não estão contidos na narrativa do livro de Atos; e não temos outras fontes informativas além dessa, exceto algumas poucas observações esparsas nos escritos dos pais da igreja.
A questão se toma um tanto mais fácil no tocante à segunda epístola a Timóteo, pois esse próprio livro assevera seu aprisionamento e seu martírio esperado para breve, o que só poderia apontar para a capital do império romano. O trecho de I Tim. 1:3 mostra-nos que Paulo estivera recentemente nas vizinhanças de Éfeso, e a passagem de Tito 1:5 mostra-nos que é bem provável que o apóstolo tivesse estado, recentemente, na ilha de Creta. Em Tito 3:12 Paulo exorta a Tito para vir reunir-se a ele em Nicópolis, para ali passarem o inverno. £ bem possível que haja aqui alusão à cidade situada às margens do rio Êpiro (na porção noroeste da Grécia), sendo essa a única referência sobre uma visita de Paulo àquela região. Porém, onde o apóstolo dos gentios esteve, antes disso, podemos apenas conjecturar. E foi desse lugar desconhecido que Paulo enviara a epistola a Tito; e talvez não muito distante dali escreveu sua primeira epistola a Timóteo.
Alguns estudiosos têm pensado que Paulo escreveu a primeira epístola a Timóteo e a epistola a Tito antes de sua viagem ao Ocidente, e que Filipos, ou algum outro centro cristão, tenha sido o local de sua composição. A passagem de I Tim. 1:3 pode indicar que Filipos foi o local de onde Paulo enviou essas epistolas. Após a sua quarta viagem missionária, ele pode ter sido aprisionado em Nicópolis (ver Tito 3:12). Que Paulo estava em Roma, quando escreveu a segunda epistola a Timóteo, é percebido em II Tim. 4:16,18.

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