Data do Livro de Apocalipse


É certo, com base no próprio livro, que o Apocalipse foi escrito durante um período de tremenda perseguição contra a igreja, por parte do império romano. No entanto, tem sido motivo de disputas qual era o imperador romano que governava quando o livro foi escrito. Abaixo apresentamos as principais ideias a respeito:
A data anterior. Alguns estudiosos têm situado a escrita deste livro já nos dias de Nero (54-68) D.C.). Porém, certas referências, Apo. 13:3,12,14 e 17:8,10, que os primeiros cristãos consideraram como predi­ções de um «Nero redivivus» ou «Nero ressurrecto», o qual voltaria ao poder, na qualidade de anticristo, mostram que tal imperador já estava morto, quando o Apocalipse foi escrito. Tal doutrina dificilmente teria sido criada antes do falecimento de Nero, e isso exige uma data posterior ao ano 70 D.C., para a escrita deste livro.
Presumivelmente, o trecho de Apo. 17:10 nos fornece um meio de datarmos a escrita deste livro com exatidão. Quando o escritor sagrado escrevia sua obra, cinco imperadores romanos já haviam morrido, o sexto estava reinando, e se esperava um sétimo; e então surgiria um «oitavo», que seria o último imperador. O problema nisso envolvido, entretanto, é que não sabemos como se devem contar os cinco imperadores: também houve consideravelmente mais de sete ou oito imperadores, antes do império romano terminar, quanto a dúvidas sobre quando se deve começar a contá-los, deveríamos começar a contagem com Júlio César? Nesse caso poderíamos nomear Júlio César, Augusto, Tibério, Calígula, Cláudio, Nero, Galba, Oto, Vitélio, Vespasiano, Tito e Domiciano. Nesse caso, Cláudio seria o quinto, e Nero seria o imperador dos dias em que o livro foi escrito. A maioria dos intérpretes cre que os três antecessores imediatos de Vespasiano deveriam ser omitidos, porque seu governo foi breve e sem grandes acontecimentos. Nesse caso, o quinto continuaria sendo Cláudio, o sexto seria Nero, e, assim sendo, o livro deve ter sido escrito antes de 70 D.C. Outros estudiosos, porém, começam contando com Augusto, como se fora o verdadeiro primeiro imperador romano, ficando omitidos os três mencionados acima, em cujo caso chegaríamos a Vespasiano, como o sexto imperador, que então estaria governando. Nesse caso, Vespasiano aparece como o poder maligno que então reinava. Foi ele quem iniciou o cerco contra Jerusalém. E Tito, seu filho, foi aquele que terminou o cerco, sendo ele o sétimo governante do império. E Nero ressurrecto seria o «oitavo» monarca, o anticristo, presumivelmente o último dos governantes de Roma; pois a destruição do império romano, tal como a «parousia» ou segundo advento de Cristo era esperada para breve, até mesmo enquanto os crentes primitivos ainda viviam.
Pode-se ver, pois, que dependendo do modo como manuseamos a lista, Nero, Galba ou Vespasiano pode ser o sexto governante, durante o qual tempo o Apocalipse parece ter sido escrito. Os trechos de Apo. 6:9 e 11:1,2 podem indicar que o templo de Jerusalém continuava de pé quando o livro foi escrito, o que significa que este livro deve ter sido composto antes do ano 70 D.C. Epifânio (ver Haer. li. 12) atribuía a esse livro uma data ainda anterior, isto é, ao tempo de Cláudio.
A data posterior. A maioria dos eruditos, a despeito das razões acima expostas, baseando-se no que diz o próprio Apocalipse, apontam para Domiciano como o governador durante o tempo em que este livro foi escrito. Nesse caso, o trecho de Apo. 17:11 seria um oráculo judaico originalmente, incorporado no Apocalipse, embora ignorando qual­quer contagem exata, por assim dizer, arbitrária, o que faria de Domiciano o sexto imperador, o qual então governava. Nesse caso, «Nero ressurrecto» presumivelmente Seguiria o sétimo governante (cujo nome foi dado), o qual seria o anticristo. Ou ainda o Nero ressurrecto seria o sétimo, e o próprio Domiciano, que veio mais tarde, seria reputado uma reencamação do Nero ressurrecto, o qual, apesar de «ser dos sete», seria o «oitavo». Porém, visto que Nero e Domiciano formavam uma única personalidade, uma contagem estrita resultaria em apenas sete imperadores. Pelo menos é certo que alguns dos súditos de Domiciano o chamavam de «outro Nero». (Ver Juvenal, Sátiras iv. 37,38; Marcial, Epigrames 1:33).
Por mais confuso que seja esse quadro, se Domiciano foi o imperador reinante quando este livro foi escrito, então sua data deve ser situada algum tempo antes de 96 D.C.
Ainda há uma outra proposta que apresenta Domiciano como o sexto governante, ou seja, aquele em foco quando o livro foi composto. É possível que o autor sagrado tivesse em mente somente aqueles governantes mortos, quando o senado romano os declarara deuses, objetos próprios à adoração. Nesse caso, os governantes em foco seriam César, Augusto, Cláudio, Vespasiano e Tito. Domiciano, pois, seria o sexto imperador, ao passo que o anticristo nerônico seria o sétimo.
Uma data ainda mais posterior. Também se tem sugerido o reinado de Trajano (98-117 D.C.) como o tempo em que foi escrito este livro. Sabemos que Trajano ordenou severa perseguição contra os crentes, pois isso fica claro nos escritos de Plínio, o Moço, governador da Bitínia em cerca de 111-113 D.C. Nesse caso, seria impossível apelarmos para a passagem de Apo. 17:10, porque sob hipótese alguma Trajano seria o sexto governante. Além disso, neste tempo o cristianismo se tornara uma religião «ilegal», não havendo qualquer evidência de que essa condição existia quando o Apocalipse foi composto. Os «imperadores» eram «deuses» que deviam ser adorados; mas não parece que então já havia qualquer decreto formal contra a fé cristã.
Irineu e Eusébio afirmam categoricamente que o Apocalipse foi escrito no tempo de Domiciano. (Ver Eusébio, História Eclesiástica iii.18.3 e Irineu, Adv. Haer. v.30.3). Esse testemunho foi aceito sem hesitação por Clemente de Alexandria, Origenes e Jerônimo. Os trechos de Apo. 6:9 e 11:1,2 poderiam subentender que o templo e a cidade de Jerusalém continuavam de pé quando este livro foi escrito; apesar de que poderia ter havido alusões naturais ao templo e à cidade conforme eles existiam antes, sem apontar para o estado em que então existiam.
A data do Apocalipse, na história da interpretação. Os intérpretes têm favorecido três períodos, a saber:
1.   O reinado de Nero. Assim pensavam Baur, Reuss, Hilgenfeld, Lightfoot, Selwyn, B.W. Henderson. A data neroniana, entretanto, dificilmente pode ser sustentada de pé, à luz do trecho de Apo. 17:10,11, segundo se aclara acima a questão.
2. Dependendo de como manusearmos a lista dos imperadores romanos, é possível a data correspondente ao imperador Vespasiano. Nada absolutamente fatal pode ser dito contra isso, exceto que não há provas históricas de que Vespasiano perseguiu os cristãos. Não tomava a sério suas próprias reivindicações de «divindade», e nem jamais compeliu alguém a adorá-lo, e nem perseguiu os que se negassem a fazê-lo. Tertuliano declara especificamente que os cristãos não foram perseguidos durante o reinado de Vespasiano, como também não houve grande perseguição sob Tito, seu filho. Contudo, eles começaram e terminaram o cerco de Jerusalém, sendo possível que as crueldades então perpetradas tivessem inspirado um livro como o de Apocalipse, embora isso não seja muito provável. Os «cristãos» perseguidos é que precisavam do encorajamento dado por uma «revelação».
3. Domiciano foi chamado de Nero calvo e de «segundo Nero», por Marcial. A história mostra a ferocidade de sua perseguição contra os cristãos. Considerando-se todos os fatores, quase todos os intérpretes, antigos e modernos, tem chegado à conclusão de que o Apocalipse foi escrito durante esse tempo, ou seja, pouco antes do término do primeiro século de nossa era. As cartas às sete igrejas do Apocalipse também confirmam uma data posterior. A cidade Esmima não contava com nenhuma comuni­dade cristã ao tempo de Nero. Isso é confirmado na epístola de Policarpo aos Filipenses xi. O Culto ao imperador (obrigatório para todos os cidadãos romanos) não parece ter sido posto em vigor até os dias de Domiciano; e o livro de Apocalipse quase certamente reflete tal circunstância. Mas nos seus dias tal culto passou a ser considerado prova de lealdade ao imperador; e por causa disso, seguiram-se perseguições intensas contra os cristãos, totalmente desconhecidas nos dias de Vespasiano.

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