Temas Principais de Primeira Corintios


Quando abordamos a razão por detrás da escrita dessa primeira epístola aos Coríntios, já tocamos de forma suficiente sobre os temas principais. Contudo, olhando para esses temas,, de forma mais particular, podemos alistar o que dizemos mais abaixo:
De maneira geral, pode-se asseverar que a primeira epistola aos Coríntios não é essencialmente uma epístola doutrinária, à semelhança de Romanos e Gálatas, ainda que sejam discutidas certas questões doutrinárias importantes, sobretudo aquilo que diz respeito à prática do governo da igreja. Seus temas, entretanto, são essencialmente éticos e práticos; e por causa dos muitos problemas acerca dos quais o apóstolo escreveu, no intuito de corrigi-los, encon¬tramos a mais completa declaração ética da fé cristã, em todo o N.T. Em contraste com a epistola aos Romanos, por exemplo, nessa primeira epístola aos Coríntios não abordamos as relações entre o cristianismo e o judaísmo, sobre como esses dois sistemas religiosos podem ser harmonizados entre si, mas antes, lemos como a igreja cristã pode entrar em um ambiente pagão, prosperando e permanecendo pura.
Ora, isso é particularmente importante para a nossa época, porquanto não existe nenhum problema mais agudo no cristianismo atual do que esse. A maioria dos problemas que os crentes de Corinto tiveram de enfrentar são os mesmos comuns à experiência cristã hoje em dia, não havendo razão alguma para supormos que as soluções propostas pelo apóstolo Paulo não sejam igualmente válidas para os nossos próprios dias, tais como o foram para os endereçados originais dessa epístola canônica. Apre¬sentamos, pois, os pontos prometidos acima:
1. O Evangelho no teor da primeira epístola aos Coríntios: Nessa epístola não há qualquer tentativa para apresentar qualquer exposição sistemática do evangelho cristão, em sua natureza e conteúdo, a menos que a primeira porção do décimo quinto capítulo seja considerada como tal; antes, por toda a parte há elementos do evangelho cristão, os quais, considerados em seu conjunto, nos fornecem uma informação suficiente sobre o assunto. Podem-se alinhar as seguintes razões para isso:
a. Cristo é o centro da mensagem da epístola, do princípio ao fim (ver I Cor. 1:3).
b. Cristo é o alvo final da criação (I Cor. 8:6).
c. Cristo é o alvo supremo da vida (I Cor. 15:28).
d. Cristo é o verdadeiro Deus (I Cor. 8:4-6).
e. Cristo é o poder que sustenta a natureza (I Cor. 3:6).
f. Cristo é quem ordena providencialmente os acontecimentos entre os homens (I Cor. 4:9; 7:7 e 12:6).
g. Os homens jamais conheceram a Deus por sua própria sabedoria, mas podem vir a conhecê-lo por meio de Cristo, a própria Sabedoria de Deus (I Cor. 1:21).
h. É Deus que se achega aos homens em busca deles e não ao contrário (I Cor. 1:27).
i. Aqueles que se achegam a Deus, recebem a revelação de seus mistérios, por intermédio do Espírito Santo (I Cor. 2:10 e 4:1).
j. A vida eterna, por meio da ressurreição, nos é dada por meio de Cristo (ver I Cor. 15).
1. Cristo é o Juiz supremo, e espera a observância dos seus mandamentos (I Cor. 4:5; 5:13 e 7:19).
m. Vários aspectos da redenção nos são oferecidos: Cristo é a rocha, o sustentador, o supridor das necessidades espirituais (I Cor. 8:6 e 10:4); os poderes das trevas têm sido derrotados por meio de sua morte e ressurreição (I Cor. 2:6); a morte de Cristo significa a nossa redenção da servidão (I Cor, 6:20 e 7:23); os crentes fazem parte do corpo místico de Cristo (I Cor. 6:15 e 12:12). A ressurreição (o que provavelmente inclui as ideias da ascensão e da glorificação de Cristo, o que é comum nas páginas do N.T.) garante a verdadeira vida eterna para os crentes, e o décimo quinto capítulo desta epístola é a mais completa declaração que possuímos sobre esse tema.
2.   Os dons do Espírito Santo no teor da primeira epístola aos Coríntios — A conduta ideal na igreja cristã, no que diz respeito a essas manifestações espirituais, também é abordada. Dentre todos os temas que há neste livro de Paulo, esse é aquele cujo tratamento recebe maior espaço. (Ver I Cor. 11-14). Vemos que os dons espirituais: a. Podem ser abusados; b. podem ser usados erroneamente; c. podem ser falsificados; e d. podem ser exercidos até mesmo por crentes carnais. Geralmente se supõe que os dons espirituais assinalam uma elevada espirituali­dade; no entanto, os maiores perturbadores de todos, na igreja de Corinto, foram aqueles que se deixaram arrebatar pelo orgulho de sua suposta autoridade e desenvolvimento espirituais, pois esses, devido ao seu orgulho, produziram confusão naquela igreja.
3.   A reprimenda contra o abuso dos dons espirituais inspirou o apóstolo a compor o magnificente décimo terceiro capítulo desta epístola, cujo grande tema é o amor cristão, o qual deve governar todas as atividades dos crentes, dentro e fora da igreja local. Nenhum outro documento sagrado sobre o amor cristão tem sido tão universalmente considerado e nem tem sido reputado tão majestático como o décimo terceiro capítulo desta epístola. E ainda que se porventura Paulo houvesse escrito uma epístola deficiente e plena de erros, a preservação de tal epístola já estaria assegurada somente por esse décimo terceiro capítulo. E interessante que embora a expressão «fruto do Espírito» não seja empregada nesta primeira epístola aos Coríntios, contudo, quase cada capitulo da mesma tem algo a ver com o poder dominante do amor cristão, em conexão com diversos aspectos da vida do crente, a qual, na realidade, é a «vida no Espírito». A igreja de Corinto sofreu com facções porque lhe faltava o amor cristão. (Ver I Cor. 3:3). Somente o amor é capaz de edificar, e não de derrubar, conforme estava sucedendo naquela igreja local. (Ver I Cor. 8:1). O amor é superior a todos os dons espirituais de que os homens se possam ufanar, sem o que o próprio uso dos dons é vazio e até mesmo perigoso. Outrossim, o amor é mais duradouro do que todos esses donç. (Ver I Cor. 13:2,8). Portanto, tudo deveria ser efetuado com o condimento preciso do amor. (Ver I Cor. 16:14).
4.   A conduta sexual no teor da primeira epístola aos Coríntios. Os habitantes da cidade de Corinto se notabilizavam por suas práticas sexuais exageradas e pervertidas. Era inevitável que esses vícios fossem levados ao seio da igreja cristã de Corinto, por parte de alguns que se desviaram de sua profissão cristã inicial, ou que jamais haviam sido verdadeiramente regenerados, posto que tivessem o nome de cristãos. A exposição do quinto capitulo dessa primeira epístola aos Coríntios (quanto aos versículos primeiro a quinto), mostra-nos que Paulo ainda era mais estrito sobre essas questões que os rabinos judeus ordinários.
Foi em relação à conduta sexual que a questão do matrimônio foi apresentada ao apóstolo, na carta que lhe enviaram. Paulo, à semelhança do Senhor Jesus, mas contrariamente às ideias judaicas comuns (ver Mat. 19:12), reconhecia o grande valor do celibato, dando preferência ao mesmo, acima do casamento, contanto que o indivíduo envolvido houvesse sido chamado por Deus para esse estado. Portanto, podemos dizer que Paulo não procurou criar nenhum ministério eclesiástico caracterizado pelo celibato; tal exigência é antes um desenvolvimento histórico, que envolveu vários séculos, não sendo nenhuma injunção neotestamentária. Todavia, é verdade que as expectativas sobre a «parousia» ou segunda vinda de Cristo talvez tivessem algo a ver com o pensamento de Paulo expresso nessa seção; contudo, não podemos deixar de observar que Paulo expressava os seus próprios sentimentos sobre a questão, e, ao fazê-lo situou o estado do celibato acima do estado do matrimônio, como um meio de servir a Deus com uma mente mais desimpedida, livre das obrigações domésticas.
Entretanto, não peca quem se casa, mesmo que o cônjuge seja incrédulo, ficando destacado tão-somen­te o fato de que isso é um jugo desigual que deve ser evitado pelos crentes. Não obstante, aqueles que estiverem casados com incrédulos são legitimamente casados, e não estão vivendo em pecado. (Ver I Cor. 7:14 e II Cor. 6). Pois o cônjuge incrédulo, sem importar se o mesmo é o marido ou a mulher, é «santificado» pelo cônjuge crente. Tal matrimônio de crentes e incrédulos não é ilegítimo, conforme ensinavam os rabinos. Isso é tudo quanto o apóstolo Paulo quer dar a entender pela palavra santifica, nesse caso—tal casamento é legal, aos olhos de Deus e da igreja.
5. A conduta social e eclesiástica: as vestes e a conduta femininas. Essa é outra das questões abordadas na primeira epístola aos Coríntios. (Ver I Cor. 14:34 e ss). Paulo recomenda que as mulheres usem seus cabelos compridos. Entretanto, alguns estudiosos pensam que essa instrução paulina deve ser posta dentro da categoria das «situações culturalmen­te orientadas». Em outras, palavras, Paulo teria recomendado que as mulheres crentes usassem os cabelos compridos porque, naquela época, usar cabelos curtos era sinal de prostituição, sendo um uso contrário aos costumes sociais mais nobres da época. Por semelhante modo, o véu que as mulheres devem usar, quando «oram ou profetizam», na opinião de muitos eruditos, cabe dentro dessa mesma categoria. Porquanto a grande verdade é que Paulo ordenou ambas as coisas: os cabelos compridos e o uso do véu, para as mulheres crentes. No entanto, não são muitas as igrejas evangélicas que estão obedecendo a essas injunções da Palavra de Deus. Nessa mesma passagem Paulo proíbe claramente que as mulheres crentes falem na igreja. E a maioria dos rabinos judeus teria emitido a mesma opinião, no tocante às mulheres ensinarem ou falarem nas sinagogas judaicas; e, além disso, nas culturas helenísticas distantes da Palestina, ensinarem ou falarem as mulheres nas sinagogas seria demonstração da conduta mais extremamente ímpia. E o apóstolo Paulo deixa transparecer a mesma aversão; e ele falava por inspiração divina, o que nos mostra que esse é também o parecer da mente de Deus. No entanto, muitos intérpretes dizem que essa instrução de Paulo também é «culturalmente orientada».
O máximo que podemos dizer aqui é recomendar que cada membro da igreja de Cristo examine os textos sagrados e os problemas que circundam essas questões da conduta social e eclesiástica, sobretudo no que diz respeito às mulheres crentes, a fim de chegar às suas próprias decisões honestas. Na atualidade, é difícil encontrar qualquer divisão da igreja cristã que observe essas questões, em obediência à Palavra de Deus. Há algumas denominações que insistem sobre a necessidade do uso do véu, mas que negligenciam a questão dos cabelos compridos das mulheres crentes, além de permitirem que elas usem livremente da palavra em suas reuniões, havendo casos extremos de «pastoras». Mas tudo isso é uma incoerência, em confronto com o texto sagrado. Finalmente, a grande maioria das igrejas evangélicas, não sabendo como dar solução ao caso, ignora o problema em sua inteireza, como se o mesmo não existisse.
A ordem do culto nas igrejas locais, o uso dos dons espirituais, a necessidade de haver oportunidade para todos, e a ordem necessária quando da celebração da Ceia do Senhor são os temas do décimo primeiro capítulo desta epístola. A necessidade de não abusar da liberdade cristã é o assunto dos capítulos sexto a oitavo da mesma.
6.   A segunda vinda de Cristo, ou «parousia-» é o último grande tema doutrinário desta epístola.(Ver I Cor. 15:51-58). Sobre esse tema, pois, não há explanação mais magnificente do que a que se encontra nessa seção, que tem servido de texto para inúmeros sermões e discursos escritos através da história. Ela nos ensina as verdades sublimes da imortalidade e da transformação do crente, acrescen­tando que certos remidos passarão para esse estado sem experimentarem a morte física, ao passo que outros chegarão ao mesmo, a despeito da morte física. Apesar de que Paulo se demorou sobre a simples imortalidade da alma (conforme fica amplamente demonstrado no quinto capítulo da segunda epístola aos Coríntios), a glorificação completa ocorrerá por meio da ressurreição, quando houver novamente a reunião da personalidade humana, em seus elementos constitutivos, bem como através da ascensão e da glorificação juntamente com Cristo, que fica implícita na doutrina da ressurreição.

Nenhum comentário: