Nenhuma outra epistola de Paulo se tem mostrado dotada de maior influência sobre a história subsequente da igreja cristã do que a epístola aos Efésios. Somente as epístolas aos Romanos e aos Gálatas têm sido mais largamente usadas. E a projeção da epístola aos Efésios é resultado natural das ideias elevadas e das expressões eloquentes existentes nessa epístola. Pode-se sentir a notável influência do apóstolo Paulo através dessa epístola, tal como a influência de Tertuliano foi transmitida através de Cipriano. Eis os grandes temas da epístola aos Efésios:
1. Cristo Jesus é aquele que preenche tudo em todos, sendo esse o seu tema principal e central. O primeiro capítulo dessa epístola tem a finalidade precipua de situar o Senhor Jesus na mais elevada posição cosmológica possível, do mesmo modo que Paulo faz nos capítulos primeiro e segundo de sua epistola aos Colossenses: «…porquanto nele habita corporalmente toda a plenitude da Divindade» (Col. 2:9). Portanto, vê-se no primeiro capitulo da epístola aos Efésios que Cristo é o mais elevado poder cosmológico, acima de qualquer ser angelical.
Mas os gnósticos, em contraste com isso, ensinavam que apesar de Cristo ter sido uma exaltada figura, certamente mais do que humana, provavelmente da ordem angelical, não pertencia, entretanto, a ordem mais elevada de todas, isto é, a ordem divina; e que, apesar dele ter sido o criador; não era o criador de «todos os mundos», mas tão somente deste mundo, o que fazia dele «o deus deste mundo». As epistolas aos Colossenses e aos Efésios, entretanto, contradizem essa tese gnãstica, mostrando que o Senhor Jesus é o cabeça de toda a criação, o ponto em torno de quem tudo tem sua unidade e significação, pois nada mais profundo e vigoroso do que isso poderia ter sido dito com relação a sua divindade inerente do que Paulo diz acerca de Cristo. O «mistério» de Deus consiste exatamente nessa unidade-de tudo em tomo de Cristo, — o que se manifestará quando ele assumir a posição que lhe compete, e vir a ocupá-la de forma universal, aos olhos de todas as criaturas inteligentes.
2. A criação inteira, portanto, está relacionada a Cristo, e, de uma maneira ou de outra, encontra nele o seu alvo e o seu propósito de ser. (Efé. 1:10). Não sabemos como tudo isso se concretizará, mas o segundo capítulo da epistola aos Filipenses dá-nos a entender a mesma verdade. O quarto capítulo da epistola aos Efésios, em conexão com aquele trecho antes citado, repete a ideia popular nos séculos I e II da era cristã, e que finalmente foi incorporada no chamado «Credo Apostólico», isto é, a ideia da descida de Cristo ao hades, onde ele realizou uma obra remidora. Alguns dizem que ele ofereceu salvação aos perdidos. Outros dizem que ele só melhorou seu estado. Ver o artigo sobre a Descida de Cristo ao Hades.
Essa descida de Cristo ao hades e sua subsequente ascensão aos céus, são especificamente declaradas como necessárias ao fato de que ele «enchesse a todas as coisas», isto é, que ele fosse o Senhor de tudo, a personagem unificadora de toda a criação. Com base nisso se deriva a grande esperança dos efeito» universais da missão de Cristo, que, apesar de não ser dito claramente esse tanto, dá-nos a entender que Cristo estabeleceu uma diferença em toda a parte, para melhor, afetando não só a igreja cristã, mas até os próprios perdidos no estado eterno, embora isso não queira dizer, sob hipótese alguma, — que eles venham a receber o mesmo tipo de vida dos eleitos. O evangelho apócrifo de Nicodemos também apresenta Cristo nesse ministério, como também ó faz o Testamento apócrifo de Abraão, apesar de que esses livros expõem um resultado universalista, como se a descida de Cristo ao hades significasse salvação para todos. Apesar da teologia de Paulo não descer a tanto, é justo observarmos que Cristo, sendo a mais elevada figura cosmológica da história, estabeleceu uma diferença universal e cosmológica para melhor. Esse é o tema central dos capítulos primeiro e quarto da epistola aos Efésios. Efé. 1:10, certamente, ensina este conceito. Ver sobre Mistério da Vontade de Deus.
3. Em sua aplicação aos crentes, aos eleitos e predestinados, esse tema se eleva mais ainda. Nó tocante aos remidos vemos que eles são «a plenitude daquele que preenche a tudo em todos», o que, como é óbvio, eleva a pessoa de Cristo muito acima da ordem dos seres angelicais, e, por consequência, os remidos são elevados, em Cristo, acima dos anjos. O oitavo capitulo da epistola aos Romanos define essa elevação em termos de nossa transformação segundo a imagem de Cristo, ao passo que o trecho de II Ped. 1:4 o faz em termos de nossa participação na natureza divina.
Nessa epistola, o trecho de Efé. 1:23 é o versículo central que ensina essa doutrina. Ora, esse é o verdadeiro e completo evangelho de Cristo. Não envolve o evangelho de Cristo meramente o perdão dos pecados e a mudança de endereço para os lugares celestiais. Antes, manuseamos uma transformação celestial e divinamente determinada do ser humano, que fará os remidos subirem até à própria posição ocupada por Cristo, levando-os a herdarem aquilo que Cristo herdará. Assim nos ensinam passagens como Rom. 8:14 e ss e Efé. 1:11. Muitos versículos desse primeiro capítulo da epistola aos Efésios descrevem o elevadíssimo privilégio dos eleitos, motivo pelo qual esse capítulo é um dos que maiores informações nos prestam sobre o tema, perdendo em importância apenas para o oitavo capitulo da epistola aos Romanos, se é que realmente assim acontece. Até que ponto o «evangelho de Paulo» afeta os homens, pois, é um dos temas centrais da epistola aos Efésios. Esse tema central envolve outros temas secundários, como a questão inteira da predestinação e da eleição, tão disputada na história eclesiástica subsequente. (Ver Efé. 1:4,5).
4. O segundo capítulo da epistola aos Efésios mostra-nos como essa redenção e eleição afetam os gentios. Eles são elevados do paganismo para os lugares celestiais. A redenção dos gentios, por conseguinte, é um dos temas centrais dessa epistola, embora seja uma subcategoria da redenção humana, conforme aparece no teor do primeiro capitulo da mesma. Um outro subproduto da reconciliação com Cristo e da unidade que foi estabelecida entre judeus e gentios, é o ensino que aqueles que estavam em inimizade serão unidos, sendo tanto os judeus como os gentios convertidos, edificados sobre o alicerce dos apóstolos e profetas, sendo o próprio Jesus Cristo a se uma unidade que elimina as antigas divergências, conforme se vê no segundo capítulo dessa epístola.
5. Tudo isso se revestia de significação pessoal para o próprio apóstolo Paulo. Issò revelava a glória de seu chamamento, que o convocara especialmente para ser o apóstolo dos gentios. (Ver Efé. 3:14-21).
6. As consequências práticas dessa redenção geral, e seu elevado destino, são os temas ou assuntos centrais dessa epístola, a começar por Efé. 4:1 até o fim do mesmo. Uma maneira digna de andar é o tema geral (ver Efé. 4:1-16), o que requer a negação da vida antiga de ignorância e de hábitos pecaminosos. (Ver Efé. 4:17-32). Porém, a unidade de todos os crentes em Cristo requer a unidade da igreja como uma comunidade de seres humanos. (Ver Efé. 4:1-8). E também exige o exercício apropriado dos dons ministeriais da igreja (ver Efé. 4:9 e ss), porquanto Cristo capacita a todos a servirem-no de alguma maneira específica. Além disso, a unidade em Cristo também importa na unidade no lar, entre esposo e esposa, visto que essa relação é análoga à de Cristo e sua igreja. (Ver Efé. 5:22-33). A unidade em Cristo provoca o conflito contra o reino das trevas e contra os seus muitíssimos agentes que povoam ao redor da terra. Esses poderes malignos são considerados seres perfeitamente reais pelo autor sagrado, — que também ajunta que os remidos devem resistir-lhes de maneira diligente. (Ver Efé. 6:10-20). Em parte alguma das Escrituras o conflito dos crentes contra as forças malignas é salientado e descrito com maior clareza do que nessa passagem que é uma das porções mais eloquentes da epístola aos Efésios.
7. Os mistérios da epístola aos Efésios. De conformidade com o vocabulário paulino, um «mistério» não é nenhum assunto insondável, que só possa ser conhecido por alguns poucos indivíduos seletos, conforme esse vocábulo é usualmente usado, sobretudo como era empregado para indicar as chamadas «religiões misteriosas» dos dias desse apóstolo. Pelo contrário, um «mistério» é um «segredo desvendado», pertencente à categoria das verdades «reveladas», visto que tais verdades não podem ser descobertas pela percepção dos sentidos ou pela razão humana. Ver o trecho de Efé. 3:5, onde essa definição essencial aparece na própria epístola. É mister desdobrarmos essa questão, conforme fazemos abaixo:
a. Efé. 1:10 apresenta-nos o maior e todo inclusivo «mistério». Trata-se da unidade universal de todas as coisas em redor de Cristo, a expansão total de sua obra criativa, bem como os resultados finais dessa obra. Esse mistério, naturalmente, inclui todos os outros mistérios.
b. O trecho de Efé. 3:4, que introduz o tema da igreja, assevera que esse é um mistério. Os gentios deveriam ser salvos e equiparados em pé de igualdade com os judeus crentes, em Cristo, formando uma comunidade religiosa remida, o que era tema profético; mas a verdadeira natureza dessa comunidade, segundo a descrição de Paulo nos capítulos primeiro a quinto dessa epístola,- era um «mistério». Portanto, na qualidade de plenitude daquele que enche a tudo em todos, na qualidade de um corpo místico que incorpora tanto judeus como gentios (pois divisões entre os dois foram eliminadas em Cristo, desde que se convertam a ele), a igreja cristã era um assunto que os profetas antigos percebiam apenas mui indistintamente; e, em seu sentido completo, conforme Paulo o revelou, era algo totalmente ignorado, ‘e, portanto, um «mistério».
c. A igreja cristã, na posição de noiva de Cristo, o que envolve uma relação especial, um privilégio sem igual, é um «mistério», ilustrado pelo matrimônio terrestre. Ê salientada a unidade, pois é declarado que os dois (marido e mulher, que representam, respectivamente, Cristo e sua igreja) tornar-se-á uma só carne. O tema do povo celestial, a noiva de Cristo, em sua relação para com o Senhor Jesus, é um «mistério», algo que antes era completamente desconhecido, mas que agora nos foi revelado pela vontade divina.
d. O trecho de Efé. 6:19 menciona o mistério do evangelho, isto é, o evangelho conforme o mesmo é plenamente revelado, com tudo quanto está implícito nesse ensino, relativamente à redenção humana, algo que foi totalmente oculto dos profetas antigos. O evangelho, pois, revela certas verdades anteriormente ocultas, verdades exaltadas, que falam sobre uma redenção e uma glorificação transcendentais para os crentes. Que o mero homem pudesse estar destinado para um alvo tão elevado e celestial era algo desconhecido nos tempos do A.T., mas que nos foi revelado em Cristo, através do apóstolo Paulo, o agente dessa revelação.
8. Deus como Pai. (Ver Efé. 1:2; 2:4,5; 3:13,15). Deus aparece nessas passagens/;omo o cabeça de toda a criação, que é vista como se fosse muitas famílias.
9. O Espirito Santo, como agente da iluminação espiritual. (Ver Efé. 1:18 e ss). Ele é o revelador da unidade que há em Cristo (ver Efé. 3:5). O acesso a Deus Pai se dá por meio do Espírito Santo, para todos (ver Efé. 2:18). E todos os crentes se tornam uma habitação de Deus, através do Espírito (ver Efé. 2:22). Além disso, o Espirito Santo aparece nessa epístola como o poder revigorador, no homem interior, que produz a piedade prática dos crentes (ver Efé. 3:16 e ss.). Outrossim, a unidade entre os membros da igreja se verifica por meio do Espírito Santo (ver Efé. 4:3). O fruto do Espirito Santo é bondade, verdade e retidão. (Ver Efé. 5:9). Na batalha contra o reino das trevas, o Espírito é a nossa espada, nossa principal arma ofensiva. (Ver Efé. 6:17). É o Espirito Santo, igualmente, quem nos assegura poder na oração. (Ver Efé. 6:18).
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