Ressurreição e a Ressurreição de Jesus


I. Pano de Fundo
A crença na ressurreição, de uma forma ou de outra, não se confina à herança judaico-cristã. Uma noção vaga de ressurreição existia entre os mais primitivos povos animistas, e o costume de sepultar utensílios, alimentos e outros itens de interesse, juntamente com os mortos, em algumas culturas, provavelmente refletia a crença na ressurreição. Nesse categoria se poderia incluir a maneira elaborada como os egípcios embalsamavam seus mortos. Contudo, muitas culturas primitivas, apesar de crerem no após-vida, não distinguiam claramente entre o corpo e o espírito, e por essa razão os ensinamentos sobre a sobrevivência da alma e sua natureza, não podem ser facilmente acompanhados através da história.
Para alguns povos antigos a alma foi uma espécie de substância semifísica, capaz de atarefar-se em atividadessimilares às do corpo, pelo que também poderiam usar utensílios que haviam sido úteis para o corpo; o que talvezexplica a maior parte dos hábitos de sepultamento dos povos antigos. É interessante observarmos que os hábitos de sepultamento, até mesmo entre o homem Neanderthal, demonstram a crença na sobrevivência em face da morte física. Apesar do pensamento ordinário, dos gregos e dos romanos, acerca da existência após-túmulo, envolver alguma forma de descida ao hades, em que a alma seria uma substância bem diluída, apesar de material, e à qual váriosgraus de inteligênica e de vida real eram atribuídos, aqui e acolá, dentro dos mitos (como, por exemplo, no mito deOsiris), aparecem casos de ressurreição, por parte dos deuses ou dos heróis, e, algumas vezes, até mesmo de pessoas comuns. Contudo, essa não era a ênfase e nem o ensinamento comum, e sabemos que tais noções não eram levadas muito a sério pelos antigos. A idéia da sobrevivência, em sua forma mais elevada, era ensinada por Platão, em diálogos como Fédon e Banquete. Ê ali que encontramosuma bem elevada idéia sobre a grandeza da personalidade humana, que não se concentra nu corpo, e nem mesmo na combinação do corpo com a alma (porquanto tal combinação ali aparece realmente como uma punição contra, o homem, por haver perdido a perfeição, ao cair no pecado); antes, a alma aparece ali como uma substância pura, eterna em sua natureza, embora dotada de um começo remoto no tempo, na forma de individualização; mas mais tarde, devido à sua queda, teria assumido o veículo de um corpo físico.
Segundo essas noções platônicas, a vida consistiria essencialmente da luta da alma por libertar-se deste mundo material, na tentativa de retornar ao mundo eterno ao qual ela pertence. Muitas idéias de Platão são paralelas à doutrina cristã, embora não haja nelas qualquer indicio da ressurreição do corpo, e nem qualquer noção que disso se aproxime. Porque tal conceito seria altamente indesejável para Platão.
Apesar do fato de que o conceito do após-vida, nozoroastrismo, era mais materialista que a maioria das idéiasantigas, contudo, até mesmo ali não havia qualquer idéiaclaramente definida acerca da ressurreição dos mortos. A afirmação mais clara sobre a ressurreição, fora da herança judaico-cristã, se encontra no Alcorão, onde Deus é retratado como alguém que conclama os anjos a tirarem os mortos e ressuscitarem-nos, como corpos vivos de carne. Isso ocorreria quando do julgamento, após o que os eleitos viveriam no aprazimento sensual de alimentos abundantes, de gemas preciosas ofuscantes e de donzelas de ‘olhos grandes’ ao passo que os ímpios seriam lançados numa punição física eterna. Tais ensinamentos tem sido interpretados simbolicamente, mas tal «modernização» tem sido vigorosamente atacada pelos islamitas «ortodoxos». O ensinamento sobre a ressurreição, no Alcorão, entretanto, na realidade não é uma doutrina independente, por­quanto o próprio Alcorão estribou-se pesadamente tanto sobre o Antigo como sobre o Novo Testamentos, em muitos particulares.
II.  A  ressurreição no Antigo Testamento
As declarações que têm sido extraídas do Pentateuco, apesar de darem a entender um «após-vida», são extremamente duvidosas como evidências da crença na ressurreição, dentro dos livros de Moisés. O trecho de Êxo.3:6,16 é usado pelo Senhor Jesus, nas citações, a fim de provar o fato de que os antigos patriarcas continuavam «vivendo», mas isso, por si mesmo, dificilmente poderia servir de prova da ressurreição no livro de Êxodo, ainda que possa mostrar que o judaísmo posterior veio a encarar tais passagens desse modo. Sabemos, de fato, que assim aconteceu. (Ver Mar. 12:18 e ss). O rabino Simai argumenta em prol da ressurreição com base em Êxo. 6:3,4 (a promessa de que a Terra Prometida seria dada aos patriarcas), mas isso provavelmente foi compreendido pelos próprios patriarcas como uma promessa referente aos seus descendentes. A exclama­ção de Jacó: «A tua salvação espero, ó Senhor!»(Gên. 49:18), bem como o desejo expresso por Balaão: «Que eu morra a morte dos justos, e o meu fim seja como o dele» (Núm. 23:10), apesar de indicarem alguma crença no «após-vida», dificilmente podem ser considerados como uma afirmação da ressurreição naquele período tão remoto.
Naturalmente, a famosa passagem da ressurreição, em Jô19:23-27, é uma declaração expressa dessa crença, e o livro de Jó é o mais antigo volume da coletânea do V.T. Porém, essa doutrina não se tornou tradicional na fé judaica senão depois que já estava escrito o Pentateuco.
Pela época em que foi registrada a história dos reis (I e II Reis), essa doutrina já deveria estar bem estabelecida em Israel, porquanto os Salmos certa­mente contêm tal pensamento (ver Sal. 17:15), e a literatura daquele período registra várias ressurrei­ções contemporâneas. (Ver I Reis17:17,24; II Reis 4:18-37; 13:20-25). Nos livros proféticos, a passagem de Isa. 26:16*19 provavelmente é a passagem isolada mais importante de todo o A.T., acerca da ressurreição. A passagem de Eze. 37:1-14, apesar de provavelmente ter por — referência primária — a restauração da nação de Israel, igualmente ensina a doutrina da ressurreição. No trecho de Dan. 12:2 essa doutrina se faz perfeitamente clara.
A igreja cristã primitiva se utiliza dos trechos de Jer. 18:3-6 e Sal. 88:10 como textos de prova da doutrina da ressurreição. (Ver também Sal. 16:9, que mui provavelmente prediz especificamente a ressur­reição de Cristo). E o trecho de Osé. 6:2 é outra profecia acerca da ressurreição de Cristo, ao passo que Osé 13:14 fla sobre a ressurreição em geral.
A crença na ressurreição foi-se tomando cada vez mais comum após os exílios, sobretudo no período dos Macabeus. E, pelo tempo em que nasceu Jesus Cristo, éra uma crença praticamente universal na Palestina e no judaísmo em geral. Os fariseus eram os grandes defensores dessa doutrina, e a isso haviam acrescen­tado acrença na sobrevivência da alma, nos anjos, nos espíritos e na existência de um mundo sobrenatural. A grande exceção no judaísmo era a tradição dos saduceus. Os saduceus se ufanavam de sua «pureza doutrinária», rejeitando aquilo que reputavam meros mitos. Esses consideravam o Pentateuco como seu «cânon» das Escrituras. Por essa .mesma razão rejeitavam eles a ressurreição, a sobrevivência da alma, a existência dos espíritos, etc., porquanto essas doutrinas não são claramente ensinadas no Pentateuco, apesar de haver ali alguns indícios das mesmas. (Ver Josefo, Antiq. 18.1.4, onde vemos que os saduceus chegavam até a negar a imortalidade da alma, quanto mais a realidade da ressurreição. Ver os artigos sobre Saduceus e Fariseus).
III. A Ressurreição  no Novo Testamento
A afirmação mais decisiva sobre a realidade da ressurreição aparece nas páginas do N.T., onde essa doutrina pode ser encontrada em muitas passagens, e o capítulo 15 de I Coríntios é a sua declaração clássica. Podemos supor que a descrição exposta por Paulo não era muito diferente daquilo que se poderia encontrar nos estudos rabínicos mais refinados, excetuando, naturalmente, a ênfase cristã sobre a importância da pessoa de Jesus Cristo como as primícias dos ressurretos, além do fato de que os cristãos sempre vincularam a ressurreição de Cristo à concretização da imortalidade, porquanto é a vida de Cristo que possibilita aos remidos viverem em qualquer sentido espiritual, na imortalidade ao nível da alma, ou, finalmente, na imortalidade final, quando a alma houver de ser revestida pelo corpo espiritual.
Nas páginas do N.T., os seguintes pontos específicos deveriam ser observados acerca do fato da ressurreição, envolvendo tanto a ressurreição de Cristo como a de outros’.
1.   Jesus Cristo, antes de sua morte e ressurreição, já possuía poder sobre a morte, tendo ressuscitado a várias pessoas dentre os mortos. (Ver Mat. 9:25; Luc. 7:12-15 e João 11:43,44).
2.   Cristo previu a sua própria ressurreição. (Ver João10:18 e Luc. 24:1-8).
3.   Houve uma ressurreição de mortos que se seguiu imediatamente após a ressurreição de Cristo. (Ver Mat.27:52,53).
4.   Os apóstolos também puderam ressuscitar certos homens da morte. (Ver Atos 9:36-41 e 20:9,10).
5.   Existem duas ressurreições gerais e futuras, a saber: a. A ressurreição para a vida (ver I Cor. 15:13,22; I Tes. 4:14-17 e Apo. 20:4); e b. a ressurreição para o «juízo» (ver João 5:28,29 e Apo. 20:11-13). Essas duas ressurreições ocorrerão com um hiato de mil anos entre elas (ver Apo. 20:5).
6.   A ressurreição do Senhor Jesus foi corporal (ver João 20:3-10; 20:19-23,24-29; 21:12-14). Mas as suas várias aparições mostram que o seu corpo fora espiritualizado,tendo sido ressuscitado para a vida com uma nova forma, e, por ocasião de sua ascensão aos céus, podemos imaginar que houve mais uma fase de «espiritualização».
7.    O ensino contido no décimo quinto capítulo de I Cor.parece indicar que, de alguma maneira, ultrapassa em muito à nossa compreensão e a nossa própria ressurreição também envolverá os antigos elementos do corpo morto, recolhidos, transformados e espiritualizados. O corpo ressurreto será incorrup­tível, glorioso, poderoso, espiritual, e será até mesmo  conformado segundo a natureza celestial de Jesus Cristo, o que nos permitirá participar de sua própria natureza, e até mesmo de sua divindade, que ele possui na qualidade de Deus-homem. (Ver Rom. 8:29; II Cor. 3:18; II Ped. 1:4 e I Cor. 14:42-44,49; Efé. 3:19; Col. 2:10).
8.   Os crentes que ainda estiverem vivos quando da segunda vinda de Cristo, receberão o mesmo tipo de corpo, através de transformação súbita, quando de sua manifestação, assim escapando aos efeitos da morte física. (Ver 1 Cor. 15:50-53 e Fil. 3:20,21).
9.   Essa transformação magnificente, quer quando da ressurreição, quer quando da transformação súbita, é chamada de redenção do corpo, mas significa um passo mais elevado em direção à glorificação, sendo, na realidade, um passo na direção da glorificação do «ser inteiro». (Ver Rom.8:23 e Efé. 1:13,14).
10.  Após a «segunda» ressurreição é que terá lugar o julgamento final. (Ver Apo. 20:7-15 e João 5:29).
11.  Alguns dos pais antigos da igreja ensinaram que parte da diferença entre a glorificação de uma pessoa, em comparação com outra, será devida a natureza mais avançada ou menos avançada do corpo da ressurreição. Isto provavelmente expressa uma verda­de. Todavia, não contemplamos nenhuma estagna­ção. As pessoas sendoglorificadas, terão continua^ mente, especulamos, uma transformação do veículo (corpo) espiritual da alma. VerEfé. 3:19 que pode servir de base desta idéia, embora não a expresse diretamente.
IV.  A Ressurreição de Cristo
Quanto ao que está implícito na ressurreição de Cristo, para os remidos, consultar todo o décimo quinto capítulo de I Cor. que é a declaração clássica sobre o tema. Quanto ao «modo» da ressurreição, acerca do que há intensa controvérsia, ver as notas expositivas em Luc. 24:6 no NTI que apresentam os diversos pontos de vista sobre essa questão. Quanto às manifestações de Cristo, após sua ressurreição, o que serve para demonstrar a historicidade da ressurreição de Cristo, ver as notas expositivas sobre a passagem de João 20:1 no NTI, onde aparece a nota desumário
V.  Subentendidos Teológicos da Doutrina da Ressurreição de Cristo
1.    A ressurreição de Cristo confirmou sua doutrina. Jesus a predisse, e mostrou a si mesmo como o Senhor da vida. Portanto, Cristo é um ser de elevadíssima estatura, e podemos confiar no que ele nos ensinou.
2.    A ressurreição de Cristo declarou a sua divindade e caráter único e sem-par, conforme também o indica o trecho de Rom. 1:4.
3.   A salvação em sua inteireza, do princípio ao fim, depende da ressurreição de Cristo. A justificação é garantida por ela. (Ver Rom. 4:25). Mas a vida inteira, agora, quando da transformação da alma, quando dá glória do estado intermediário e imaterial, ou mesmo quando da glorificação, isto é, quando a alma for revestida pelo corpo imaterial e já espiritualizado, depende da «vida que nos foi dada através da ressurreição de Cristo», e isso porque ele compartilha dessa vida com os homens. E, através disso, em qualquer nível de existência em que se encontrem os homens, podem os remidos comparti­lhar de sua vida eterna. (Ver I Cor.15:12,17; Rom. 5:10 e I Cor. 15:20).
4.   Fomos regenerados para uma viva esperança; a conversão original, a regeneração, a transformação progressiva segundo a imagem de Cristo, e a própria vida de Deus, que haverão de ser compartilhadas por nós, mediante a graça de Deus em Cristo, dependem todas da sua ressurreição. (Ver I Ped. 1:3,4; João 5:25,26; 6:57 e II Cor. 4:14).
5.   Devido à ressurreição de Cristo, a vida «necessária e independente», que é a própria vida de Deus, a autêntica imortalidade, é dada aos homens, e assim assumem a natureza de Cristo. (Ver João 5:25,26; 6:57).
6.   Por conseguinte, a imortalidade da alma, por mais profunda que seja essa doutrina (ver o quinto capítulo da segunda epístola aos Coríntios, o primeiro capítulo da epístola aos Filipenses e as notas no NTI sobre II Cor. 5:8, além do artigo que versa sobre esse tema), não será completa ainda, porquanto existe uma imortalidade mais elevada, que é a dos espíritos“ novamente revestidos de seus corpos espiritualizados. O estado dos espíritos desencoiporados é «muito melhor» do que o da presente vida física (ver Fil.1:23), no entanto, a plena glorificação não poderá ocorrer enquanto a alma não for revestida pelo corpo espiritual e imortal. (Ver II Cor. 5:4 e I Cor. 15:42-50).
7.    O corpo ressurreto não será composto de carne, visto que carne e sangue não podem herdar o reino de Deus. (Ver I Cor. 15:50). Antes, será um corpo espiritual, que muito provavelmente não será atômico em qualquer sentido, mas antes, será um campo de força espiritual, um elemento mais básico e puro do que as estruturas atômicas. Será semelhante ao corpo de Cristo. (Ver I João 3:2 e Fil. 3:21).
VI.  A Natureza do Corpo Ressurreto
Será um corpo espiritual, uma forma espiritual, pertencente ao mundo eterno. Provavelmente não terá constituição atômica, mas antes, se comporá de algumcampo de força ou energia espiritual, um veículo apropriado para a alma, nos lugares celestiais. Sim, certamente o corpo ressurreto dos crentes não será físico, conforme já dissemos acima. Não obstante, poderá conter alguns elementos do presente corpo físico, conforme parece dar a entender a ilustração que Paulo usou sobre a semente e sua florescência. Se assim realmente for o caso, então poderemos basear-nos diretamente no paralelo da ressurreição de Cristo.
Entretanto, alguns estudiosos têm sentido que existe algum elemento, no «ser» do homem, talvez de natureza misteriosa, ou talvez de alguma maneira vinculado à alma, que será usado pelo poder celestial para ser transformado em um corpo espiritual. A palavra «corpo», é com frequência usada, no pensamento hebreu, para expressar o ser inteiro, e não apenas o corpo físico, e isso permitiria, do ponto de vista do hebraico, tal interpretação. Seja como for, haverá a real restauração do ser inteiro do indivíduo, de tal modo que a morte não terá conquistado partícula alguma de todo o seu ser. Assim sendo, o espírito do indivíduo remido não continuará «desincorporado», porquanto essa «derrota» será revertida, e e depende inteiramente de Deus como ele fará tal reversão.
Alguns eruditos têm ensinado uma forma de ressureição a qual denominam de nova criação, onde os elementos do corpo físico antigo não seriam utilizados, porque Deus restauraria a personalidade humana revestindo a alma com um corpo espiritual, criado para o momento. Contudo, talcorpo seria muito mais elevado e espiritual do que este nosso corpo físico, que a morte física nos leva a perder como nosso veiculo de expressão. Isso representa uma verdadeirarestauração, uma ressurreição, embora envolva termos celestiais exclusivamente.
O  corpo espiritualizado será o veículo da alma; e esse corpo se revestirá de poder e glória, por assemelhar-se ao corpo de Jesus Cristo. Nesse «revestimento», o crente alcançará um elevado estado de glória, tanto na forma de exaltação de seu próprio ser (o que o elevará acima dos anjos, porquanto seremos a plenitude de Cristo, que é aquele que preenche a tudo em todos, o que jamais foi dito com respeito aos anjos; ver Efé. 1:23), como na forma de participação na própria divindade (ver II Ped. 1:4), como, ainda, na forma de obras exaltadas que os ressuscitados poderão realizar, como um serviço eterno. Nenhuma imaginação pode ao menos começar a apreender o sentido de tudo isso, mas sabemos que isso faz do destino humano algo excessivamente elevado, verdadeiramente espantoso. E como poderia ser menos do que isso quando consideramos que haveremos de participar da plenitude da glória de Cristo, de sua natureza, de sua vida, de sua herança, na qualidade de filhos de Deus, que estão sendo conduzidos à glória, juntamente com o Filho de Deus?
Inferências Éticas  da Ressurreição
Toda a moralidade cristã se baseia na crença do após-vida, na punição, na recompensa, na colheita segundo asemeadura; e tudo isso para não ser meramente presente (conforme de fato é), mas também transcenderá a este mundo físico, quando a verdadeira justiça fará parte do mundo eterno. A alma sobreviverá, e será revestida pelo corpo espiritual, e o que tiver sido feito nesta vida terrena afetará diretamente o estado, a exaltação, o progresso e as atividades dos crentes no estado eterno. Visto que fomos ressuscitados com Cristo, somos exortados a buscar aquelas coisas que são «de cima», isto é, aquelas coisas que pertencem a Deus, posto que Cristo está assentado à sua «mão direita». (Ver Col. 3:1). As coisas terrenas não podem mais exigir nossa legítima atenção, porquanto «morremos» já para essas coisas. Não mais existimos para elas, e nem elas para nós. (Ver Col. 3:2). Por conseguinte, compete quemortifiquemos todas as carnalidades que nos servem de empecilho e todas as tendências mundanas, visto que não mais pertencemos a este mundo e seu sistema de vida. (Ver Col. 3:5 e ss). Já não somos mais cidadãos deste mundo, mas aguardamos o apareci­mento de Cristo. Então, quando ele aparecer, também apareceremos juntamente com ele, «em glória», o que nos será apropriado como filhos da ressurreição, que seremos. (Ver Col. 1:4). Nossa cidadania, na realidade, é a dos céus, e nos deveríamos conduzir como súditos leais desse reino. (Ver Fil. 3:20). Nossa esperança de realização celestial é uma esperança purificadora. (Ver I João 3:3).
«Assim também vós considerai-vos mortos para o pecado, mas vivos para Deus em Cristo Jesus…mas oferecei-vos a Deus como ressurretos dentre os mortos, e os vossos membros a Deus como instrumentos de justiça» (Rom. 6:11,13). Ver todo o contexto dessa passagem, que fala diretamente sobre esse assunto. (Ver também os trechos de Rom. 7:4; 8:11; Efé. 1:18-20; Fil. 3:10,11 e Col. 2:13).
VII. A Ressurreição em relação a  Imortalidade da Alma e o Estado Intermediário da Alma Desencarnada
Considerando toda essa questão com olhos sóbrios (I Cor. capítulo 1) precisamos dizer que :
1.  Ou Paulo não compreendia plenamente a doutrina da imortalidade da alma, conforme dizia a tradição grega comum; ou então, pelo momento, ignorava tal realidade, como algo que não era adequado para ele em seu argumento.
2.   Ou que aqueles que eram os opositores à verdade da ressurreição eram da variedade cética, do tipo de incredulidade dos saduceus, os quais negavam igualmente a imortalidade. Contra tal noção Paulo se’ opunha. Mas estaidéia não é provável.
3.   Ou então as noções de Paulo sobre a ressurreição também envolviam uma certa doutrina que a alma, embora sobreviva, assume um tipo muito inferior de existência, esperando ser restaurada ao corpo, e nisso é que seria dada a verdadeira imortalidade, prometida em Cristo. Porém, selermos outras passagens, como o quinto capítulo da segunda epístola aos Coríntios, bem como a esperança paulina expressa constantemente que estar «ausente» do corpo é estar «presente» com o Senhor (ver II Cor. 5:8), bem como a sua confiança de que «morrer é lucro» (ver Fil. 1:21) e partir «do corpo» e estar com Cristo é «muito melhor» (ver Fil. 1:23), então precisamos admitir que Paulo não tinha qualquer doutrina dessa natureza, mas antes, via a alma como algo muito superior ao corpo, como a verdadeira pessoa, bem como via ele a alma como o veículo da inteligência e da vida. Os gregos, nos tempos bem remotos, tinham uma doutrina nò sentido de que a alma sobrevivia a uma espécie de sombra insensível, vazia, uma entidade destituída de memória e de inteligência; porém, não há qualquer evidência de que Paulo defendia tal doutrina, quando os textos acima referidos são examinados.
4.    Naturalmente, com base em I Cor. 15:11, fica bem compreendido que a imortalidade, em seus níveis mais elevados (não meramente alguma condição «melhorada» em relação ao estado presente), deve incluir a restauração da personalidade inteira, o que significa ressurreição de alguma espécie. Essa é a teologia cristã padronizada.
Contudo, até mesmo a imortalidade do estado intermediário, que aguarda a plena glorificação, está vinculada à ressurreição (conforme se vê nos versículos décimo sétimo e décimo oitavo), pois tudo quanto envolve’ a salvação, do princípio áo fim, consiste da participação nessa vida que Cristo possuía quando saiu do túmulo. A própria justificação está ligada à ressurreição. (Ver Rom. 4:25). Assim, a glória presente, no estado imaterial, bem como na mais elevada glória futura, quando estivermos vestidos da imortalidade perfeita, estão ambas vinculadas à ressurreição. A ressurreição é a substância da presente imoralidadeimaterial, bem como é a garantia da futura e mais elevada imortalidade, o eterno «revestir-se» que haverá de restaurar a personalidade inteira.
Portanto, precisamos concluir por uma dentre três possibilidades, a saber:
1.    Ou que Paulo tinha em vista a segunda possibilidade, na lista acima, isto é, ele se opunha àqueles que negavam tanto a ressurreição como a imortalidade. Essa é a posição tomada por alguns comentadores bíblicos. Contudo, tal posição é enfraquecida pela observação de que tudoquanto a imortalidade promete, a intermediária ou a futura, o apóstolo parece vincular à «ressurreição», e isso concorda com outras passagens, como o primeiro capítulo da epístola aos Filipenses e o quinto capítulo da segunda epístola aos Coríntios. Portanto, Paulo se opunha não àqueles que negavam a imortalidade, mas aos que a negavam em vinculação à idéia da ressurreição. Queriam eles uma imortalidade sem à ressurreição. Mas Paulo retruca que não existe uma forma «cristã» da imortalidade desacompanhada da ressurreição, porquanto essa imortalidade, no que se relaciona aos crentes, terá de assemelhar-se à de Jesus Cristo, que ressuscitou dentre os mortos e foi transformado em sua ascensão aos céus.
2.   Naturalmente, existe outra possibilidade que resolve perfeitamente o problema, e que aparente­mente satisfaz as exigências do presente texto, a saber: que o apóstolo acreditava na ressurreição como o   próprio portão da imortalidade, negando completa­mente a sobrevivência da alma. Isso parece harmonizar-se de maneira suave com o presente texto, mas não podemos aceitar essa possibilidade (embora alguns crentes o façam; e esse era o pensamento hebreu mais antigo), porque tal idéia é uma contradição frontal a passagens como o quinto capítulo da segunda epístola aos Coríntios e o primeiro capítulo da epístola aos Filipenses, bem como com o pensamento farisaico (e Paulo fora fariseu), além de contradizer a doutrina neotestamentária padrão, que ensina a sobrevivência da alma (como I Pedro, capítulos terceiro e quarto, e Apo. 6:9).
Relembremo-nos de que a teologia dos hebreus, em sua forma mais primitiva, não envolvia qualquer esperança de vida além-túmulo (conforme se verifica no Pentateuco, que jamais alude a tal idéia), e isso foi seguido pela tradição dos saduceus. Mas então, a ressurreição do corpo, como a esperança da vida eterna (mas desacompanhada da idéia da sobrevivên­cia da alma), apareceu em seguida, nesse desenvolvi­mento. Finalmente, mais ou menos pela época dos profetas do cativeiro é que veio à lume a idéia da imortalidade, bem como a da ressurreição. Essa síntese foi seguida pelo cristianismo, e isso não meramente por motivo de acidente histórico, mas porque essa síntese expressa averdade da questão. Ora, se Paulo, como judeu que era, reverte momentaneamente, devido ao seu argumento, ao segundo estágio do pensamento hebreu (ressurreição, mas não sobrevivência da alma), então a passagem de 1 Cor. 15:11 se torna perfeitamente clara. Contudo, isso representa uma contradição com o ensino paulino em geral, bem como com o ensino geral do N.T. Podemos considerar, pois, que Paulo provavelmente não assumiu essa posição. Crendo em tal coisa, permanecemos com o problema. Assim sendo, aqueles membros de Corinto que criam na imortalidade, mas não na ressurreição (embora aceitassem a ressurreição de Cristo como um «sinal» de seu poder sobre a morte), encontrariam várias debilidades nos argumentos de Paulo que aparecem nos versículos décimo segundo e décimo nono, conforme salientamos mais acima.
O problema central deste texto, se o quisermos declarar com brevidade, é o seguinte: Neste texto Paulo vincula toda a Imortalidade à ressurreição, e aparentemente não estabelece qualquer distinção entre estágios mais baixos e mais elevados da imortalidade. Porém, em outras passagens, como o primeiro capítulo de Filipenses e o quinto capítulo da segunda epístola aos Coríntios, ele reconhece uma elevada forma de vida imortal (bem «melhor» do que a vida presente), que consiste do estado imaterial. Toda­via, falta, essencialmente, tal reconhecimento nos argumentos óbvios dos versículos décimo segundo a décimo nono deste capítulo. Mas esse reconhecimento pode ter sido a base mesma do ensino em Corinto de que não havia ressurreição. Seja como for, dentro do sistema do cristianismo a ressurreição é vinculada à «forma mais alta» da imortalidade, conforme foi prometida no evangelho cristão, embora uma forma mais baixa e intermediária, apesar de muito exaltada, da imortalidade, possa ser experimentada nesse estado imaterial, o que subsistirá até à primeira ressurreição, se alguém se acha «em Cristo». O vigésimo versículo deste mesmo capítulo descreve exatamente o que a imortalidade promete, por meio da ressurreição, dentro do cristianismo.
3.  Quanto à solução bíblica para esse problema (sem importar se os opositores de Paulo, em Corinto,concordavam ou não com isso), observemos a mensagem geral dos versículos décimo sétimo e décimo oitavo destecapitulo. A totalidade da «imortalidade» e da glória, e, realmente, a salvação inteira, do princípio ao fim, está vinculada à ressurreição; pois a própria morte de Cristo não traria beneficio algum aos homens, se isso não houvesse sido confirmado pela ressurreição (ver Rom. 4:25). Além disso, nossa própria ressurreição, que por ele foi prometida, é aquele elemento que garante e confirma a glória «intermediária» que agora desfrutam os espíritos desincorporados. Quando da ressurreição, pois, essa glória se tomará completa. Não haveria qualquer glória «intermediária» para espíritos ‘desin­corporados, se não fosse a ressurreição, porquanto é na ressurreição que nos chega aquela vida através da qual vivemos em qualquer nível, conforme o trecho de Rom. 5:10 indica. Em qualquer nível, portanto, somos salvos pela vida de Cristo, e essa é a vida ressurreta.
IX.  A Ressurreição de cristo nas  Escrituras
Predita pelos profetas (Sal. 16:10 com Atos 13:34,35; Isa. 26:29).
Predita por ele mesmo (Mat. 20:19; Mar. 9:9; 14:28; João 2:19-22).
Era necessária:
Para cumprimento das Escrituras (Luc. 24:45,46). Para o perdão dos pecados (I Cor. 15:17).
Para a justificação (Rom. 4:25; 8:34).
Para a nossa esperança (I Cor. 15:19).
Para a eficácia da pregação (I Cor. 15:14).
Para a eficácia da fé (I Cor. 15:14,17).
Prova de que ele era o Filho de Deus (Sal. 2:7 com Atos13:33; Rom. 1:4).
A fraude era impossível (Mat. 27:63-66).
Ele deu muitas provas infalíveis de sua ressurreição (Luc.24:35,39,43; João 20:20,27; Atos 1:3).
Foi confirmada:
Pelos anjos (Mat. 28:5-7; Luc. 24:4-7,23).
Pelos apóstolos (Atos 1:22; 2:32; 3:15; 4:33).
Pelos seus inimigos (Mat. 28:11-15).
Asseverada e pregada pelos apóstolos (Atos 25:19; 26:23).
Os Santos:
São gerados para uma vívida esperança, por meio da ressurreição (I Ped. 1:3,21).
Desejam conhecer o seu poder (Fil. 3:10).
Devem manter-se na lembrança da mesma (II Tim. 2:8).
Ressuscitarão na semelhança de Cristo ressurreto (Rom. 6:5; I Cor. 15:49 com Fil. 3:21).
É emblema do novo nascimento (Rom. 6:4; Col. 2:12).
Ê as primícias de nossa própria ressurreição (Atos 26:23; I Cor. 15:20,23).
A verdade do evangelho depende da mesma (I Cor.15:14,15).
Foi seguida pela exaltação de Cristo (Atos 4:10,11;
Rom. 8:34; Efé. 1:20; Fil. 2:9,10; Apo. 1:18).
Ê garantia do julgamento (Atos 17:31).
Tipificada: Isaque (Gên. 22:13 com Heb. 11:19),
Jonas (Jon. 2:10 com Mat. 12:40).
Efetuada:
Pelo poder de Deus (Atos 2:24; 3:15; Rom. 8:11;
Efé. 1:20; Col. 2:12).
Pelo seu próprio poder (João 2:19; 10:18).
Pelo poder do Espírito Santo (I Ped. 3:18).
No primeiro dia da semana (Mar. 16:9).
No terceiro dia após sua morte (Luc. 24:46; Atos 10:40; I Cor. 15:4).
X. A Ressurreição na pregação da Igreja
Atos 2:24: ao qual Deus ressuscitou, rompendo os grilhões da morte, pois não era possível que fosse retido por ela.
O Grande Tema
1.    Dentre todos os itens da apologética cristã, a ressurreição de Jesus era o mais poderoso, como prova do fato de que Jesus foi o Messias.
2.   No livro de Atos, a ressurreição sempre subentende a ascensão (ver Atos 1:6), e a subsequente glorificação de Jesus. Portanto, Pedro foi capaz de dizer que Jesus foi recebido à mão direita do Pai (ver Atos 2:25).
3.   Os crentes participam de tudo quanto Cristo fez, foi e é, (ver Rom. 8:30).
— Este sermão de Pedro é, na realidade, nosso mais primitivo exemplo dessa apologia cristã. O vigésimo segundo versículo destaca as obras de Jesus, os seus muitíssimos milagres, os seus prodígios e sinais, como nenhum mortal comum poderia jamais ter produzido. O vigésimo terceiro versículo menciona como o próprio Deus autenticara a missão de Jesus, porque, através dele, se cumprira o plano divino referente ao Messias. A citação extraída da profecia de Joel (vss. 17-21) vincula o Yahwehdo A.T. (do que se deriva a forma corrompida Jeová, nos tempos modernos) com o «Cristo* do N.T., que é o Senhor de todos. E, dessa maneira (como nos vss. 25-28 deste mesmo capítulo), Jesus é associado ao A.T., como cumprimento vivo das profecias messiânicas. A promessa e o cumprimento da vinda do Espírito Santo, por si mesmos, serviram de prova do caráter messiânico de Jesus, porquanto o Pentecoste e os eventos daquele dia cumpriram todas as expectações do A.T. acerca do ministério do Espirito Santo, e isso fora especificamente prometido e conferido através do Senhor Jesus, ficando assim demonstrada a veracida­de de suas predições e promessas.
A ressurreição do Senhor Jesus inspirara os seus discípulos a uma atuação ousada, e podemos concordar comCrisóstomo (345-407 D.C.), in loc., de que aqueles homens teriam continuado derrotados e descoroçoados, se não pensassem verdadeiramente que o Senhor Jesus ressuscitara dentre os mortos. A pior interpretação possível dos acontecimentos é aquela que afirma que os discípulos perpetraram uma fraude, sabendo perfeitamente bem que Jesus continuava bem morto, porquanto eles foram perseguidos e geralmente tiveram morte horrível, tudo com base em uma mentira totalmente desnecessária. É óbvio, portanto, que para os primitivos discípulos o Senhor Jesus estava vivo, e, mais do que isso, que estava bem presente entre eles, tal como havia prometido, através do seu «alterego», o Espírito Santo. O Espírito de Deus atuava sobre eles, e Pedro, que há tão poucos dias se acovardara ante uma simples pergunta de uma criada, agora discursava com uma coragem impávida e serena, ante a multidão que havia bradado acerca de Cristo: «Crucifica-o! Crucifica-o!».
Johannes Weiss, em sua obra History of Primitive Christianity, faz o seguinte comentário sobre as vidas e as realizações dos apóstolos, que estavam alicerça­das firmemente na crença sobre a realidade da ressurreição de Jesus: «Em verdade, em meio a uma geração melancólica, sem esperança, perversa, ali estava um grupo de homens inspirados, corajosos, que dependiam exclusivamente de seu Deus; em meio a uma nação que se avizinhava de sua destruição, estava um novo povo, e com que futuro!» (Nova Iorque: Wilson-Erickson, 1937, I, pág. 41).
Rompendo os grilhões da morte. Não há certeza absoluta acerca do significado da palavra «grilhões» neste caso, sendo motivo de debates o seu sentido. Muitas traduções dizem «dores», sendo verdade que o termo tem sido usado na literatura grega para indicar as dores de parlo. O comentáriode Vincent (in loc.) sumaria as diversas idéias: Alguns afirmam que Pedro seguiu a tradução errônea da LXX em Sal. 18:5, onde a palavra hebraica para «tramas» foi traduzida pela palavra aqui usada para indicar dores, e que, portanto, a tradução deveria ser «tramas de morte», em que o simbolismo seria o de escape do laço de um caçador. Mas outros supõem que o simbolismo é o do ‘trabalho de parto’, que cessaria ao dar à luz, isto é, na ressurreição. Mas essa interpretação parece muito desviada, embora seja verdade que, no grego clássico, o vocábulo fosse comumente empregado para indicar as dores de parto. Talvez seja melhor, no seu todo, pensar que essa expressão tem o sentido dado pela Autorized Version (KJ), fazendo com que as dores da morte sejam a mesma coisa que a própria morte.
Deve-se observar, por outro lado, que essa palavra é a mesma traduzida por dores, em Mat. 24:8, a qual, literalmente traduzida, seria dores de parto, o que salientaria a intensidade do sofrimento, e não necessariamente a idéia de algum tipo de nascimento, que estivesse para ocorrer. Porém, se realmente houver em mente alguma forma de nascimento, então Pedro talvez tenha feito alusão à idéia da «nova vida», que vem através da ressurreição. Mas, se ele se referia a laços ou algemas (a idéia que aparece no hebraico, no trecho citado, Sal. 18:5), então pode estar em vista uma armadilha.
Eis como Robertson compreende a questão, conforme se evidencia em seu comentário: ‘laços’, ‘armadilhas’ ou ‘cordas’ da morte aludem ao seol, isto é, à morte personificada, como caçadores que põem uma armadilha para a presa». Todavia, esse autor também reconhece a possibilidade da outra interpre­tação, quando diz: «Os primitivos escritores cristãos inteipretavam a ressurreição de Cristo como um nascimento saído da morte».
É verdade que diversos dos primeiros pais da igreja interpretaram a morte de Jesus como as dores de parto da nova vida, na ressurreição; porém, isso pode ter se derivado da interpretação sobre esta passagem, que não é, necessariamente, a interpretação correta, embora, naturalmente, isso expresse uma grande verdade, sem importar se tal verdade é ensinada aqui ou não. É muito provável que o sentido tencionado seja simplesmente que embora os sofrimentos de Cristo, na morte, fossem grandes, tais sofrimentos não fizessem parte permanente de sua experiência, e nem a morte provocada por essas dores pudesse fazer parte permanente dessa experiência, sendo que também Deus o libertou de todo o contexto dos sofrimentos e da morte, levando-o à vida imortal, a saber, aquela vida que ele mesmo possui. (Ver João 5:26 e 6:57).
«Apesar de que há um mistério que não pode ser dissipado, no que concerne à maneira da ressurreição, o fato da ressurreição não pode ser posto em dúvida mais do que a evidência histórica e honesta do assassinato de César». (DeWetté).
«Pode-se afirmar, sem a mínima hesitação, que a ressurreição de Cristo é o fato mais bem comprovado da história». (Edersheim).
«Nada é tão historicamente confirmado condo o fato de que Jesus ressuscitou dentre os mortos e apareceu novamente para os seus seguidores». (Ewald).
«Se ainda não sabemos que Jesus de Nazaré ressuscitou dentre os mortos, então ainda não sabemos coisa alguma sobre a história». (John A. Broadus).
Porquanto não era possível que fosse ele retido por ela.  Cinco são as razões principais pelas quais era impossível que Cristo, o Filho de Deus, ficasse retido pela morte:
1.   Era impossível por causa do fato de ser ele o Filho de Deus, participante da divindade, e em sua humanidade, na qualidade de ser mortal, foi-lhe outorgada a verdadeira imortalidade por parte de Deus Pai, aquela vida independente e necessária que Deus possui. (Ver João 5:26 e 6:57). Não devemos perder de vista o ponto de que, nessas passagens, o mesmo tipo de vida é prometido a todos os crentes. Por conseguinte, também é impossível que a morte possa reter qualquer remido pelo sangue do Senhor Jesus, porquanto todos eles são verdadeiramente imortais, no mesmo sentido que Deus é imortal e conforme foi concedida tal vida a Jesus Cristo.
2.   Também era impossível essa retenção de Cristo no sepulcro por que em sua pessoa, em sua missão, e em sua obra pioneira, como mortal, isto é, em sua encarnação, ele é oPríncipe da Vida, razão pela qual a morte não poderia jamais caracterizá-lo. Ele é o Príncipe da Vida de conformidade com os termos da explicação dada no primeiro ponto, acima.
3.   Isso era igualmente impossível porque, devido ao Pai,o Filho não poderia ser retido pela morte, nem por qualquer dos resultados desse estado, quer no mundo espiritual, quer no íntimo de seu próprio ser. Porquanto era da vontade do Pai erguê-lo novamente dentre os mortos, e isso serviu de prova completa da autenticação de sua pessoa e de sua missão divinas, salientando o fato de ser ele as primícias de todos quantos entram no estado da morte, mas que, finalmente, haverão de ressuscitar triunfalmente. (Ver o trecho de I Cor. 15:19-21, que salienta essa mensagem).
4.   Outrossim, isso era impossível por nossa causa, porque a promessa que nos foi feita por Deus é qué Cristo é a nossa garantia de vida eterna. Os pecadores penitentes são aceitos no Amado, e os dons de Deus são proporcionados aos homens através dele. Todos quantos nele confiam participam necessariamente de seu tipo de vida (ver João6:57), pelo que também era impossível que a morte pudesse triunfar sobre a fonte de toda a vida aos homens.
5.   Finalmente, era impossível que Cristo ficasse retido pela morte porque a tendência de todas as profecias do A.T., no que tange à pessoa, ao ministério, à morte e à ressurreição do Messias é que a sua missão fosse um sucesso; embora lhe tivesse sido mister passar pela morte, também haveria de ressuscitar dentre os mortos sem experimentar corrupção física. Essas predições das Escrituras não poderiam jamais ser quebradas. Portanto, era impossível que a morte o retivesse,como é impossível que ela nos retenha permanentemente. Essa é a
mensagem que aparece neste mesmo capítulo do livro de Atos, que faz alusão às profecias de Davi. (Ver Atps2:25-28).
6.   O texto não menciona o hades, mas a morte de Cristo subentende o mesmo, e o vs. 27 deste mesmo capítulo alude definidamente ao hades. Em sua descida ao hades, Cristo realizou uma missão ali, igualmente. Ver o artigo sobre & Descida de Cristo ao Hades.
XI.   Diversas Teorias sobre o Modus Operandi da Ressurreição de Jesus
1.   Jesus não teria, realmente, ressuscitado dentre os mortos—mas os seus seguidores teriam furtado o seu corpo, conforme também os judeus declararam, e assim os discípulos deram a entender que houvera ressurreição. A narrativa inteira dos evangelhos, entretanto, labora contra essa noção, não sendo provável que os apóstolos tivessem criado uma ressurreição simulada, para em seguida terem sido perseguidos e, finalmente, mortos de maneira vergonhosa, em defesa de algo que sabiam, o tempo todo, fora inventado por eles. Somente as convicções de homens coletivamente desvairados poderiam tê-los feito sofrer tanto, produzindo frutos tão notáveis, se não estivessem escudados na realidade.
2.    As narrativas acerca desses acontecimentos são relatos de entusiastas, não podendo ser consideradas como dignas de grande valor. As mesmas objeções oferecidas contra o primeiro argumento, se aplicam aqui também. Outrossim, pode-se observar que as outras quinhentas testemunhas oculares do Cristo ressurreto também deveriam ter sido entusiastas desvairados, para explicar uma ilusão coletiva dessa envergadura. Segundo aprendemos pelos escritos de Paulo, em seus dias, a maioria desses quinhentos irmãos ainda vivia, e a história poderia ser facilmente verificada em sua autenticidade, sendo altamente improvável que tão grande número de pessoas pudesse ter caído naquilo que, de outra maneira, seria reputado um ponto de fé extremamente difícil de defender.
3.    A teoria do desmaio: Essa teoria afirma que Jesus realmente não morreu na cruz, mas que tão-somente entrou em um estado comatoso. Quando foi posto em um túmulo frio, recuperou os sentidos. Essa teoria tem sido sustentada por muitos elementos liberais, mas está sujeita a objeções fatais. Em primeiro lugar, é altamente improvável que um debilitado Jesus, que quase chegara às portas da morte, e que realmente fora considerado morto por todos os circunstantes, pudesse ter cumprido as ações do vivíssimo Jesus que é retratado após a ressurreição. Em segundo lugar, tal Jesus não teria sido um homem extraordinário, e, sim um homem abaixo do normal, durante um período muito longo. Nada disso se coaduna com o quadro apresentado acerca de suas aparições após a ressurreição. Os discípulos e todas as demais testemunhas oculares dos fatos devem ter sido pessoas extremamente estúpidas e infantis, para crerem que ele realmente ressuscitara. Outrossim, topamos com o problema da fiel dedicação de suas vidas ao Senhor Jesus, por motivo de que viveram sob tremenda perseguição até que tiveram fim vergonho­so, tudo por causa de um homem que estaria semi­morto que continuaria mutilado, que tão só perdera a consciência na cruz mas que recobrara os sentidos ao ser colocado no túmulo. Tudo isso pressupõe extrema obtusidade por parte de mais de quinhentas testemunhas oculares do Cristo ressurreto, o que é impossível de ser aceito. Adicione-se a isso, ainda, que Jesus, que não teria morrido, mas que meramente teria perdido os sentidos, finalmente deve ter morrido—destruindo assim toda a confiança que fora depositada nele. Uma vez mais a história não consubstancia essa teoria. Outrossim, acrescente-se a isso o testemunho inconsciente mas importante de João, acerca das circunstâncias da morte de Jesus. João 19:34 revela que o ferimento feito com a lança, no lado de Jesus, fez sair «…sangue e água…», o que, conforme a medicina tem aprendido pela observação, é sinal de um coração rompido. Um Coração rompido sem a menor sombra de dúvida é uma ocorrência médica fatal. E, se em último lugar, admitirmos a evidência dada pelo sudário de Turim (ver a nota em Mat. 28:6 no NTI), veremos que as provas químicas demonstram que o corpo que aquela peça de linho um dia conteve, realmente morreu, embora não tivesse permanecido envolto no pano por tempo suficientemente longo para borrar as imagens produzidas pelos agentes químicos de um corpo que padeceu horrores, o que, de outro modo, teria ficado irreconhecível pela continuação das reações químicas de um corpo em putrefação.
4.   A idéia da ressurreição em termos mediúnicos: Esta teoria pode assumir muitas formas variegadas, mas diz, essencialmente, que Jesus apareceu aos seus seguidores, após a morte, embora tais aparecimentos fossem apenas de seu espirito desligado do corpo. Isso equivale a afirmar que o espírito humano de Jesus tinha o poder de fazer-se visível e compreendido. As narrativas dos evangelhos, contudo, negam essa teoria, porquanto diversos dos discípulos «tocaram» nele, o que sem a menor dúvida, indica que Jesus apareceu em forma corpórea. Além disso, o próprio Jesus, querendo dar a entender a sua ressurreição física, e não o seu mero aparecimento em espirito, no trecho de Luc. 24:36-43, além de dar sobejas provas de que tinha corpo e podia fazer o que os corpos fazem (ser apalpado, comer etc.), declarou ante os discípulos espantados: «Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo; apalpai-me e verificai, porque um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho» (Lucas 24:39). Apesar de que esta teoria do aparecimento mediúnico de Jesus admite, pelo menos, a sobrevivência da alma, contudo, as narrativas dos evangelhos não lhe- prestam apoio algum. O sepulcro estava vazio; e as cicatrizes puderam ser vistas e apalpadas nas mãos e no lado de Jesus.
5.    Explicação psicológica’. Conforme essa teoria, a ressurreição de Jesus, teria sido, na realidade, uma impressão interna, íntima, para certo número de pessoas, e não uma realidade exterior. Teria sido um tipo de mecanismo do cumprimento de um “desejo”, podendo ter envolvido elementos dos fenômenos similares ao hipnotismo em massa. Essas condições psicológicas teriam sido provocadas pelo tremendo desejo, dos seguidores íntimos de Jesus, em vê-lo vivo novamente. E essa energia mental, criada dentro das estruturas do pensamento de tantas pessoas, possibili­tou o aparecimento de eventos profundamente anelados, embora não tivessem eco no mundo das realidades materiais. Porém, essa idéia se torna extremamente fraca e insustentávelquando nos lembramos do número de pessoas envolvidas—nada menos de quinhentos indivíduos que, de uma só vez, foram testemunhas oculares da presença física do Cristo ressurreto, além do fato das diversas aparições do Senhor Jesus, no processo de quarenta dias. Não é provável que tal estado psicológico pudesse ter sido mantido por tanto tempo, e entre tantas pessoas, sem o fundamento da realidade externa. As pessoas simplesmente não podem enganar a si mesmas por tanto tempo, e em massa, como nesse caso. Relatos, como o caso ocorrido com Tomé, que pôde tocar no corpo físico de Jesus, também labora contra essa idéia de uma ilusão psicológica em massa sobre a ressurreição de Jesus. Chega mesmo a ser impossível crermos que tantas pessoas tivessem criado um mundo de fantasias por tantos dias, mantendo-se, digamos assim, em um estado de sonho permanente.
6.    Segundo certos estudiosos, a ressurreição seria meramente a existência do espírito perenemente vivo de Jesus, isto é, a influência de Jesus no mundo e sobre as vidas dos homens, embora não tivesse sido uma realidade física. Até certo ponto isso expressa parte da verdade, porquanto o espirito de Cristo continua perfeitamente vivo em muitas pessoas, mas, uma vez mais, isso não concorda plenamente com os fatos do caso em foco, porquanto requer a negação da realidade dos aparecimentos de Jesus aos discípulos, o manuseio de Jesus por parte de alguns, e a realidade de suas conversas audíveis com diversas pessoas.
7.   A realidade da ressurreição literal e corporal de Jesus. Jesus ressuscitou o seu próprio corpo, transformado, mas ainda dotado de propriedades físicas. Jesus espiritualizou o seu próprio corpo. Esse foi o seu último e maior milagre terreno, e a intenção dos escritores dos evangelhos é justamente a de transmitir-nos o fato. Houve muitas testemunhas oculares dessa realidade. Quando da ascensão e glorificação de Cristo, é perfeitamente possível, sendo fato muito provável, que Jesus tenha sido ainda mais poderosamente transformado no ideal da criação de Deus, tendo-se tomado o modelo de Deus, para conduzir muitos filhos à glória—o padrão para a transformação final dos crentes. (Ver Rom. 8:29 e Efé. 3:19).
XII.  Acontecimentos no Dia da Ressurreição
1.      As mulheres, Maria Madalena, Maria mãe de Jesus, eSalomé, dirigem-se ao sepulcro.
2.     Ao chegarem elas, ou talvez pouco antes, desceu o anjo, o Senhor ressuscitou e os guardas caíram por terra como mortos.
3.   Pouco depois disso, o mesmo anjo que aterrorizara os guardas, fala com as mulheres, que haviam chegado à cena. (Alguns registros tradicionais pintam os guardas a correr de terror passando pelas mulheres que iam a caminho do túmulo).
4.    As mulheres encontraram a pedra rolada para um lado, e Maria Madalena volta a fim de contar o ocorrido aos discípulos (Luc. 23:55—24; João 20).
5.    Pedro e João, ao receberem a notícia, vão ao túmulo, examinam-no e se vão embora (João 20:11-18).
6.   Maria Madalena volta à cena da ressurreição, chorando, ainda duvidosa; então vê os dois anjos e o próprio Senhor Jesus (João 20:11-18). Em seguida, Maria Madalena é enviada para avisar os outros discípulos.
7.    Maria, mãe de Tiago e José, retomou com as outras mulheres ao sepulcro; as mulheres veem os dois anjos (Luc.24:4,5 e Mar. 16:5), e ao receberem a mensagem angelical saem à procura dos discípulos, mas ao encontro delas sai o próprio Senhor Jesus (Mat. 28:8-10).
Todavia, a ordem exata desses acontecimentos não é dada em parte alguma, e eles são varieadamente arranjados. Mas toda ordem apresentada está sujeita a dúvidas.
A ressurreição de Jesus Cristo é o grande alicerce histórico da igreja cristã, sendo o elemento do qual se origina uma das principais diferenças da doutrina cristã, quando contrastada com outras religiões. £ um equivoco declarar ou mesmo supor que a mensagem de Cristo não teria significação se ele não houvesse ressuscitado dentre os mortos, porquanto, até mesmo sem a história da ressurreição, provavelmente seria considerado um dos maiores homens que já viveram à face da terra, tanto por causa dos seus ensinamentos como por causa de sua vida extraordinária, na qual demonstrou diversos poderes admiráveis.
Hoje em dia, muitos não aceitam a realidade de uma ressurreição literal, ou pelo menos física, e apesar disso encontram grande valor na vida e nos ensinamentos de Cristo. Não obstante, a ressurreição é pressuposta em todas as porções do N.T., sendo constantemente solicitada como fato mais certo e como aquele que tem consequências teológicas de maior alcance. (Ver, por exemplo, as declarações do apóstolo Paulo, em I Cor. 15:12-20,29-32). Ê verdade que, em sua maior parte, a nossa crença na ressurreição de Jesus não pode ser apoiada pela moderna investigação científica; mas certamente não lhe falta o «apoio histórico». Paulo afirma que mais de quinhentos irmãos tinham visto Jesus, após a sua ressurreição (ver I Cor. 15:6). Teria sido fácil verificar o testemunho dessa gente, quando Paulo fez tal declaração. Outrossim, certo número de indivíduos específicos afirmava não só ter visto o Jesus, mas também ter tido extenso contato com ele. As tradições que cercam a ressurreição de Jesus provavelmente sofreram modificações e adornos, mas o grande fato da ressurreição permanece de pé, e, em todos os seus elementos essenciais, as tradições mais antigas (as de Pedro, as de Paulo e as dos evangelhos) estão em plena harmonia umas com as outras.
No findar do sábado. No evangelho de Marcos, lemos«Passado o sábado…» E no evangelho de Lucas: *…alta madrugada…* O comentário adicional de Mateus, «…ao entrar o primeiro dia da semana…», faz harmonia com a narrativa de Lucas. Goodspeed (GD) traduz aqui, «após o sábado», sendo, provavel­mente, a tradução mais correta do trecho. Alguns acreditam que Mateus falava do pôr-do-sol, que Marcos falava do nascer do sol, mas isso não é uma inferência necessária, à base de Mat. 28:1. De fato, o versículo indica que as mulheres compareceram ao túmulo cedo pela manhã, pouco antes do romper do dia.
XIII. Aparições de Jesus após  a Ressurreição
Naturalmente que se estabeleceu certa confusão quanto ao nome das testemunhas da ressurreição de Jesus, especialmente no que se refere àquelas primeiras visitas. João refere-se apenas a Maria Madalena, quando da primeira aparição. Marcos também menciona Salomé. Lucas menciona diversas outras, a saber: Joana, esposa de Cusa(ver Luc. 8:3). Mateus apresenta as duas Marias. Alguns têm suposto que essas diferenças se originaram devido a- ênfase de cada escritor, pois cada evangelista teria enfatizado mais uma pessoa do que outra. Mais provavelmente, os próprios relatórios foram fragmen­tários e confusos por causa do impacto das emoções envolvidas.

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