As Três Pessoas Consideradas Separadamente


1. O PAI, OU A PRIMEIRA PESSOA DA TRINDADE

a. O nome “Pai” em sua aplicação a Deus. Este nome nem sempre é empregado com relação
a Deus com o mesmo sentido na Escritura. (1) Às vezes se aplica ao Deus Triúno como a origem
de todas as coisas criadas, 1 Co 8.6; Ef 3.15; Hb 12.9; Tg 1.17. Conquanto nestes casos o nome
se aplique ao Deus Triúno, refere-se mais particularmente à primeira pessoa, a quem a obra da
criação é mais especialmente atribuída na Escritura. (2) Atribui-se também o nome ao Deus Triúno
para expressar a relação teocrática que Ele mantém com Israel como o Seu povo no Velho
Testamento, Dt 32.6; Is 63.16; 64.8; Jr 3.4; Ml 1.6; 2.10. (3) Mo Novo Testamento o nome é
geralmente empregado para designar o Deus Triúno como Pai, num sentido ético, de todos os
Seus filhos espirituais, Mt 5.45; 6.6-15; Rm 8.16; 1 Jo 3.1. (4) Num sentido inteiramente diverso,
contudo, o nome é aplicado à primeira pessoa da Trindade em Sua relação com a segunda
pessoa, Jô 1.14, 18; 5.17-26; 8.54; 14.12, 13. A primeira pessoa é o Pai da segunda num sentido
metafísico. Esta é a paternidade originária de Deus, da qual toda paternidade terrena é apenas
pálido reflexo.

b. A propriedade distintiva do Pai. A propriedade pessoal do Pai, falando em termos
negativos, consiste em que Ele não é gerado, e, em termos positivos consiste na geração do Filho
e na espiração do Espírito Santo. É verdade que a espiração é obra do Filho também, mas neste,
essa obra não se combina com a geração. Estritamente falando, a única obra exclusivamente
peculiar ao Pai é a da geração ativa.

c. As opera ad extra atribuídas mais particularmente ao Pai. Todas as opera ad extra de Deus
são do Deus Triúno, mas nalgumas destas obras o Pai está em primeira plano, como nestas: (1)
Planejando a obra de redenção, a eleição inclusive, da qual o próprio Filho era um objeto, Sl 2.7-
9; 40.6-9; Is 53.10; Mt 12.32; Ef 1.3-6. (2) As obras da criação e da providência, principalmente em
seus estágios iniciais, 1 Co 8.6; Ef 2.9. (3) A obra de representação da Trindade no Conselho da
Redenção, como o Ser santo e justo, cujo direito foi violado, Sl 2.7-9; 40.6-9; Jô 6.37; 17.4-7.

2. O FILHO, OU A SEGUNDA PESSOA DA TRINDADE

a. O nome “Filho” em sua aplicação à segunda pessoa. A segunda pessoa da Trindade é
chamada “Filho” ou “Filho de Deus” em mais de um sentido do termo. (1) Num sentido metafísico.
Deve-se sustentar isto contrariamente aos socinianos e aos unitários, que rejeitam a idéia de uma
Divindade tripessoal, vêem em Jesus apenas um homem, e consideram o nome “Filho de Deus” a
Ele aplicado, primariamente como um título honorário conferido a Ele. É muito evidente que Jesus
Cristo é apresentado como o Filho de Deus na Escritura, independentemente de Sua posição e
obra como Mediador. (a) Ele é mencionado como o Filho de Deus do ponto de vista da pré-
encarnação, por exemplo em Jó 1.14, 18; Gl 4.4. (b) É chamado o “unigênito” Filho de Deus ou do
pai, expressão que não se aplicaria a Ele, se Ele fosse o Filho de Deus somente num sentido
oficial ou ético, Jo 1.14, 18; 3.16,18; 1 Jo 4.9. Comparar com 2 Sm 7.14; Jó 2.1; Sl 2.7; Lc 3.38; Jo
1.12. (c) Nalgumas passagens o contexto evidencia muito bem que o nome indica a divindade de
cristo, Jô 5.18-25; Hb 1. (d) Embora Jesus ensine os Seus discípulos a falarem de Deus e a dirigir-
se a Ele como “Pai nosso”, Ele mesmo fala dele chamando-lhe simplesmente “pai” ou “meu Pai”, e
com isso mostra que estava cônscio de uma relação única, singular, com o Pai, Mt 6.9; 7.21; Jo
20.17. (e) De acordo com mt 11.27, Jesus, como o Filho de Deus, arroga-se um conhecimento
único de Deus, conhecimento que ninguém mais pode possuir. (f) Os judeus certamente
entendiam que Jesus afirmava que era o Filho de Deus num sentido metafísico; pois
consideravam blasfêmia o modo como Ele falava de Si mesmo como o Filho de Deus, Mt 26.63;
Jo 5.18; 10.36. - (2) Num sentido oficial ou messiânico. Nalgumas passagens este sentido é
associado ao sentido mencionado acima. As passagens subseqüentes aplicam o nome “Filho de
Deus” a Cristo como Mediador, Mt 8.29; 26.63 (onde este sentido vem ligado ao outro); 27.40; Jo
1.49; 11.27. Naturalmente, esta filiação e a messianidade se relacionam com a filiação originária
de Cristo. É somente porque Ele era o Filho de Deus essencial e eterno, que podia ser chamado
Filho de Deus como Messias. Além disso, a filiação e a messianidade refletem a filiação eterna de
Cristo. É do ponto de vista desta filiação e messianidade que até Deus é chamado Deus do Filho,
2 Co 11.31; Ef 1.3, e às vezes é mencionado como Deus em distinção do Senhor, Jo 17.3; 1 Co
8.6; Ef 4.5, 6. (3) Num sentido natalício. Também se dá a Jesus o nome “Filho de Deus” em vista
do fato de que deveu o Seu nascimento à paternidade de Deus. De acordo com a Sua natureza
humana, ele foi gerado pela operação sobrenatural do Espírito Santo, e nesse sentido é o Filho de
Deus. Lc 1.32, 35 o indica claramente, e provavelmente se pode inferir também de Jo 1.13.

b. A subsistência pessoal do Filho. Deve-se defender a realidade da subsistência pessoal do
Filho contra todos os modalistas que, de um modo ou de outro, negam as distinções pessoais da
Divindade. Pode-se consubstanciar a doutrina da personalidade do Filho como segue: (1) O modo
pelo qual a bíblia fala do pai e do Filho um ao lado do outro implica que um é tão pessoal como o
outro, e também indica a existência de uma relação pessoal entre ambos. (2) O emprego dos
apelativos “unigênito” e “primogênito” implica que a relação entre o pai e o Filho, conquanto
singular, pode ser, não obstante, retratada aproximadamente como uma relação de geração e
nascimento. O designativo “primogênito” encontra-se em Cl 1.15; Hb 1.6, e acentua o fato da
geração eterna do Filho. Simplesmente significa que Ele já exista antes da criação dos céus e da
terra. (3) O emprego distintivo do termo “Logos” na Escritura aponta na mesma direção. Este
termo é aplicado ao Filho, em primeiro lugar não para expressar a Sua relação com o mundo (o
que é absolutamente secundário), mas para indicar a Sua profunda relação com o Pai, relação
como a que existe entre uma palavra e o orador que a profere. Diferentemente da filosofia a Bíblia
apresenta o Logos como pessoal e o identifica com o Filho de Deus, Jo 1.1-14; 1 Jo 1.1-3. (4) A
descrição do Filho como a imagem ou mesmo como a expressa imagem de Deus em 2 Co 4.4; Cl
1.15; Hb 1.3. Deus sobressai claramente na Escritura como um Ser pessoal. Se o Filho de Deus é
a expressa imagem de Deus, necessariamente é uma pessoa também.

c. A geração eterna do Filho. A propriedade característica do Filho consiste em que Ele é
eternamente gerado do pai (resumidamente denominada “filiação”) e toma parte com o Pai na
não pode ser entendido como não existente. A geração do Filho deve ser considerada como um
ato necessário e perfeitamente natural de Deus. Não significa que este ato não esteja relacionado
com a vontade do pai nalgum sentido da palavra. É um ato da vontade necessária do pai, o que
significa simplesmente que a Sua vontade concomitante agrada-se perfeitamente com ele. (2) É
um ato eterno do pai. Este ponto segue-se naturalmente do anterior. Se a geração do Filho é um
ato necessário do pai, de modo que é impossível entende-lo como não gerando, naturalmente
participa do pai na eternidade. Não significa, porém, que seja um ato que se realizou
completamente no passado distante, mas antes, que é um ato atemporal, o ato de um eterno
presente, um ato que se realiza continuadamente e, todavia, sempre de maneira completa. Sua
eternidade segue-se não somente da eternidade de Deus, mas também a imutabilidade divina e
da verdadeira divindade do Filho. Acresce que também se pode inferir das passagens bíblicas que
ensinam ou a preexistência do Filho ou a Sua igualdade com o Pai, Mq 5.2; Jo 1.14, 18; 3.16;
5.17, 18, 30, 36; At 13.33; Jo 17.5; Cl 1.16; Hb 1.3. A declaração do Sl 2.7, “Tu és meu filho, eu
hoje te gerei”, geralmente é citada para provar a geração do Filho, mas, segundo alguns, com mui
duvidosa propriedade, Cf. At 13.33; Hb 1.5. Supõem eles que essas palavras se referem à
elevação de Jesus como Rei Messiânico, e ao reconhecimento dele como Filho de Deus num
sentido oficial, estando provavelmente ligadas à promessa registrada em 2 Sm 7.14, exatamente
como se vêem em Hb 1.5. (3) É geração da subsistência pessoal, e não da essência divina do
Filho. Alguns falam como se o pai gerasse a essência do Filho, mas isto equivale a dizer que Ele
gerou a Sua própria essência, pois a essência do Pai e do Filho é exatamente a mesma. É melhor
dizer que o pai gera a subsistência pessoal do Filho, mas com isso também Lhe comunica a
essência divina em sua inteireza. Mas, ao fazê-lo, devemos evitar a idéia de que o Pai gerou
primeiramente a segunda pessoa e depois comunicou a essência divina e esta pessoa, pois isto
levaria à conclusão de que o Filho não foi gerado da essência divina, mas foi criado do nada. Na
obra de geração houve comunicação da essência: foi um ato indivisível. E, em virtude desta
comunicação, o Filho também tem vida em Si mesmo. Isso está de acordo com a declaração de
Jesus: “Porque assim como mo pai tem vida em si mesmo, também concedeu ao Filho ter vida em
si mesmo”, Jo 5.26. (4) É geração que deve ser entendida como espiritual e divina. Em oposição
aos arianos, que insistiram em que a geração do Filho implicava necessariamente separação ou
divisão do Ser Divino, os chamados pais da igreja acentuavam o fato de que não se deve
entender esta geração de maneira física ou que lembre o processo de geração das criaturas, mas
deve ser entendida como espiritual e divina, excluindo toda idéia de divisão ou mudança. Ela traz
distinctio e distributio, não porém diversitas e divisio ao Ser Divino (Bavinck). Sua mais notável
analogia acha-se no pensamento e na alocução do homem, e a própria Bíblia parece indicar isto,
quando fala do Filho como o Logos. (5) Pode-se dar a seguinte definição da geração do Filho: É o
ato eterno e necessário da primeira pessoa da Trindade, pelo qual Ele, dentro do Ser Divino, é a
base de uma segunda subsistência pessoal, semelhante à Sua própria, e dá a esta segunda
pessoa posse da essência divina completa, sem nenhuma divisão, alienação ou mudança.

d. A divindade do Filho. A divindade do Filho foi negada na Igreja Primitiva pelos ebionitas e
pelos “alogi” (alogoa), e também pelos monarquistas e pelos arianos.Nos dias da Reforma os
socinianos seguiram o exemplo daqueles e falavam de Jesus como mero homem. A mesma
posição foi tomada por Schleiermacher e Ritschl, por um batalhão de eruditos liberais,
particularmente da Alemanha, pelos unitários e pelos modernistas e humanistas dos dias atuais.
Esta negação só é possível para os que desconsideram os ensinos da Escritura, pois a Bíblia
contém abundantes provas da divindade de Cristo.1 Vemos que a Escritura (1) asseverava
explicitamente a divindade do Filho. Em passagens como Jo 1.1; 20,28; Rm 9.5; Fp 2.6; Tt 2.13; 1
Jo 5.20; (2) aplica a Ele nomes divinos, Is 9.6; 40.3; Jr 23.5, 6; Jl 2.32 (comp. At 2.21); 1 Tm 3.16:
(3) atribui a Ele perfeições divinas,tais como existência eterna, Is 9.6; Jo 1.1, 2; Ap 1.8; 22.13,
onipresença, Mt 18.20; 28.20; Jo 3.13, onisciência, Jo 2.24, 25; 21.17; Ap 2.23, onipotência, Is 9.6;
Fp 3.21; Ap 1.8, imutabilidade, Hb 1.10-12; 13.8, e em geral todos os atributos pertencentes ao
pai, Cl 2.9: (4) fala dele como realizando obras divinas, como a criação, Jo 1.3, 10; Cl 1.16; Hb
1.2,10, a providência, Lc 10.22; Jo 3.35; 17.2; Ef 1.22; Cl 1.17; Hb 1.3, o perdão de pecados, Mt
9.2-7; Mc 2. 7-10; Cl 3.13, a ressurreição e o juízo, Mt 25.31, 32; Jo 5.19-29; At 10.42; 17.31; Fp
3.21; 2 Tm 4.1, a final dissolução e renovação de todas as coisas Hb 1.10-12; Fp 3.21; Apo 21.5, e
(5) Lhe outorga honra divina, Jo 5.22, 23; 14.1; 1 Co 15.19; 2 Co 13.13; Hb 1.6; Mt 28.19.

e. O lugar do Filho na Trindade econômica. Deve-se notar que a ordem da existência na
Trindade essencial ou ontológica reflete-se na Trindade econômica. O Filho ocupa o segundo
lugar nas opera ad extra. Se todas as coisas provêm do Pai, provêm mediante o Filho, 1 Co 8.6.
Se o Pai é apresentado como a causa absoluta de todas as coisas, o Filho sobressai claramente
como a causa mediadora. Isto se aplica à esfera natural, onde todas as coisas são criadas e
mantidas por meio do Filho, Jo 1.3, 10; Hb 1.2, 3. Ele é a luz que ilumina todo homem que vem ao
mundo, Jo 1.9. Aplica-se também à obra de redenção. No Conselho da Redenção Ele toma sobre
Si a tarefa de ser a Segurança do Seu povo, e executar o plano de redenção feito pelo Pai, Sl
40.7, 8. Realiza-o mais particularmente em Sua encarnação, em Seus sofrimentos e em Sua
morte, Ef 1.3-14. Em conexão com a Sua função os atributos de sabedoria e poder, 1 Co 1.24; Hb
1.3, e de misericórdia e graça, são atribuídos especialmente a Ele, 2 Co 13.13; Ef 5.2, 25.

3. O ESPÍRITO SANTO, OU A TERCEIRA PESSOA DA TRINDADE.

a. O nome aplicado à terceira pessoa da Trindade. Apesar de se nos dizer em Jo 4.24 que
Deus é Espírito*, o nome se aplica mais particularmente à terceira pessoa da Trindade. O termo
hebraico com o qual Ele é designado é Ruach, e o grego, é pneuma, ambos os quais, como o
vocábulo latino spiritus, derivam de raízes que significam “soprar”, “respirar”. Daí, também podem
ser traduzidos por “sopro” ou “fôlego”, Gn 2.7; 6,17; Ez 37.5, 6, ou “vento”, Gn 8.1: 1 Rs 19.11: Jo
3.8. O Velho Testamento geralmente emprega o termo “espírito” sem qualificativos, ou fala do
“Espírito de Deus” ou “Espírito do Senhor”, e utiliza a expressão “Espírito Santo” somente em Sl
51.11; Is 63.10, 11, enquanto que o Novo Testamento esta veio a ser uma designação da terceira
pessoal da Trindade. É um fato notável que, enquanto o Velho Testamento repetidamente chama
a Deus “o Santo de Israel”, Sl 71.22; 89.18; Is 10.20; 41.3; 48.17, o Novo Testamento raramente
se aplica o adjetivo “santo” a Deus em geral, mas utiliza freqüentemente para caracterizar o
Espírito. Com toda a probabilidade isto se deve ao fato de que foi especialmente no Espírito e Sua
obra santificadora que Deus se revelou como Santo. É o Espírito Santo que faz Sua habitação nos
corações dos crentes, que os separa para Deus, e que os purifica do pecado.

b. A personalidade do Espírito Santo. As expressões “Espírito de Deus” e “Espírito Santo” não
sugerem personalidade com a clareza que o temo “Filho” sugere. Além disso, a pessoa do Espírito
Santo não apareceu de forma pessoal claramente discernível entre os homens, como aconteceu
com a pessoa do Filho de Deus. Como resultado, a personalidade do Espírito Santo muitas vezes
foi posta em questão e, portanto, merece atenção especial. A personalidade do Espírito foi negada
na Igreja Primitiva pelos monarquistas e pneumatomaquianos. Nesta negação eles foram
seguidos pelos socianos dos dias da Reforma. Mas recentemente, Schleiermacher, Ritschil, os
unitários, os modernistas dos dias atuais e todos os sabelianos modernos rejeitam a
personalidade do Espírito Santo. Muitas vezes se diz hoje em dia que as passagens que parecem
implicar a personalidade do Espírito Santo simplesmente contêm personificações. Mas as
personificações certamente são raras nos escritos em prosa do Novo Testamento, e podem ser
reconhecidas com facilidade. Ademais, essa explicação evidentemente destrói o sentido de
algum, as dessas passagens como, por exemplo, Jo 14.26; 16.7-11; Rm 8.26. A prova bíblica da
personalidade do Espírito Santo é mais que suficiente: (1) Designativos próprios de personalidade
Lhe são dados. Embora pneuma seja neutro, o pronome masculino ekeinos é utilizado como
referência ao Espírito Santo em Jo 16.14; e em Ef 1.14 algumas das melhores autoridades têm o
pronome relativo masculino hos. Além disso, é-lhe aplicado o nome Parakletos, Jo 14.26; 15.26;
16.7, termo que não pode ser traduzido por “conforto”, “consolação”, nem pode ser considerado
como nome de alguma influência abstrata. Um fato que indica que se trata de uma pessoa é que o
Espírito Santo, como Consolador, é colocado em justaposição com Cristo como o Consolador que
estava para partir, a quem o mesmo termo é aplicado em 1 Jo 2.1. É verdade que este termo é
seguido pelos neutros Ho e auto em Jo 14.16-18, mas isto se deve ao fato de que intervém o
vocábulo pneuma. (2) São-lhe atribuídas características de pessoa, como inteligência, Jo 14.26;
15.26; Rm 8.16, vontade, At 16.7; 1 Co 12.11; e sentimentos, Is 63.10; Ef 4.30. Demais, Ele realiza
atos próprios de personalidade. Sonda, fala, testifica, ordena, revela, luta, cria, faz intercessão,
vivifica os mortos, etc, Gn 1.2; 6.3; Lc 12.12; Jo 14.26; 15.26; 16.8; At 8.29; 13.2; Rm 8.11; 1 Co
2.10, 11. O realizador destas coisas não pode ser um simples poder ou influência, mas tem que
ser uma pessoa. (3) É apresentado como mantendo tais relações com outras pessoas, que
implicam Sua própria personalidade. Ele é colocado na justaposição com os apóstolos em At
15.28, com Cristo em Jo 16.14, e com o Pai e o Filho em Mt 28.19; 2 Co 13.13; 1 Pe 1.1, 2; Jd 20,
21. Uma boa exegese exige que nestas passagens o Espírito Santo seja considerado uma
pessoa. (4) Também há passagens em que se distingue entre o Espírito e o Seu Poder, Lc 1.35;
4.14; At 10.38; Rm 15.13; 1 Co 2.4. Tais passagens seriam tautalógicas, sem sentido, e até
absurdas, se fossem interpretadas com base no princípio de que o Espírito é pura e simplesmente
um poder impessoal. Pode-se ver isto substituindo o nome “Espírito Santo” pela palavra “poder”
ou “influência”.

c. A relação do Espírito Santo com as outras pessoas da Trindade. As primeiras controvérsias
trinitárias levaram à conclusão de que o Espírito Santo, como o Filho, é da mesma essência do
pai e, portanto, é consubstancial com Ele. E a longa discussão acerca da questão, se o Espírito
Santo procedeu somente do pai ou também do Filho, foi firmada finalmente pelo Sínodo de Toledo
em 589*, pelo acréscimo da palavra “Filioque” (e do Filho) à versão latina do Credo de
Constantinopla: “Credimos in Spiritum Sanctum qui a Patre Filioque procedidit” (“Cremos no
Espírito Santo, que procede do Pai e do Filho”). Esta processão do Espírito Santo, resumidamente
chamada espiração, é Sua propriedade pessoal. Muito do que foi dito a respeito da geração do
Filho também se aplica à espiração do Espírito Santo, e não é necessário repetir. Notem-se,
contudo, os seguintes pontos de distinção entre ambas: (1) A geração é obra exclusiva do Pai; a
espiração é obra do pai e do Filho. (2) Pela geração o Filho é habilitado a tomar parte na obra de
espiração, mas o Espírito Santo não adquire esse poder. (3) Segundo a ordem lógica, a geração
precede à espiração. Devemos lembrar, porém, que isso tudo não implica nenhuma subordinação
essencial do Espírito Santo ao Filho. Na espiração, como na geração, há uma comunicação da
substância total da essência divina, de modo que o Espírito Santo está em igualdade com o Pai e
o Filho. A doutrina da processão do Espírito Santo do Pai e do Filho baseia-se em Jo 15.26, e no
fato de que o Espírito é chamado também o Espírito de Cristo e do Filho, Rm 8.9; Gl 4.6, e é
enviado por Cristo ao mundo. Pode-se definir a espiração como o terno e necessário ato da
primeira e da segunda pessoa da Trindade pelo qual elas, dentro do Ser Divino, vêm a ser a base
da subsistência pessoal do Espírito Santo, e propiciam à terceira pessoa a posse da substância
total da essência divina, sem nenhuma divisão, alienação ou mudança.

O Espírito Santo está na relação mais estreita possível com as outras pessoas. Em virtude da
Sua processão do Pai e do Filho, o Espírito é descrito como estando na relação mais estreita
possível com as outras duas pessoas. De 1 Co 2.10, 11 podemos inferir, não que se deve
identificar o Espírito com a autoconsciência de Deus, mas, sim, que Ele é tão estreitamente
relacionado com Deus o pai como a alma humana o é com o homem. Em 2 Co 3.17 lemos: “Ora,
o Senhor é o Espírito; e onde está o Espírito do Senhor aí há liberdade”. Aí o Senhor (Cristo) é
identificado com o Espírito, não quanto à personalidade, mas quanto à maneira de agir. Na
mesma passagem o Espírito é chamado “o Espírito do Senhor”. A obra para a qual o Espírito

Santo foi enviado à igreja no dia de Pentecostes estava baseada em Sua unidade com o Pai e
com o Filho. Ele veio como o Paráclito para tomar o lugar de Cristo e realizar a Sua obra na terra,
isto é, para ensinar, proclamar, testificar ou dar testemunho etc., como o Filho fizera. Pois bem, no
caso do Filho, esta obra de revelação estava firmada em Sua unidade com o Pai. Justamente
assim a obra do Espírito baseia-se em Sua unidade com o Pai e com o Filho, Jo 16.14, 15.
Notem-se as palavras de Jesus nesta passagem: “Ele me glorificará porque há de receber do que
é meu, e vo-lo há de anunciar. Tudo quanto o Pai tem é meu; por isso é que vos disse que há de
receber do que é meu e vo-lo há de anunciar”.

d. A divindade do Espírito Santo. Pode-se estabelecer a veracidade da divindade do Espírito
Santo com base na Escritura seguindo uma linha de comprovação muito semelhante à que foi
empregada com relação ao Filho: (1) São-lhe dados nomes divinos, Êx 17.7 (comp. Hb 3.7-9); At
5.3, 4; 1 Co 3.16; 2 Tm 3.16; 2 Pe 1.21. (2) São-lhe atribuídas perfeições divinas, como
onipresença, Sl 139.7-10, onisciência, Is 40.13, 14 (comp. Rm 11.34); 1 Co 2.10, 11, onipotência,
1 Co 12.11; Rm 15.19, e eternidade, Hb 9.14 (?). (3) Ele realiza obras divinas, como a criação, Gn
1.2; Jó 26.13; 33.4, renovação providencial, Sl 104.30, regeneração, Jo 3.5, 6; Tt 3.5, e a
ressurreição dos mortos, Rm 8.11. (4) É-lhe prestada honra divina, Mt 28.19; Rm 9.1; 2 Co 13.13.

e. A obra do espírito Santo na economia divina. Certas obras são atribuídas mais
particularmente ao Espírito Santo, não somente na economia geral de Deus, mas também na
economia especial da redenção. Em geral se pode dizer que a tarefa especial do Espírito Santo
consiste em levar as coisas à completação agindo imediatamente sobre a criatura e nela.
Justamente como Ele é a pessoa que completa a Trindade, assim a Sua obra é a completação do
contato de Deus com as Suas criaturas e a consumação da obra de Deus em todas as esferas.
Ela se segue à obra do Filho, como a obra do Filho segue-se à do Pai. É importante ter isto em
mente, pois, se a obra do Espírito Santo for divorciada do objetivo da obra do Filho, um falso
misticismo fatalmente surgirá como resultado. A obra do Espírito inclui as seguintes ações na
esfera natural: (1) A geração da vida. Como o ser provém do Pai, e o pensamento vem mediante o
Filho, assim a vida é mediada pelo Espírito, Gn 1.3; Jó 26.13; Sl 33.6 (?); Sl 104.30. Com relação
a isso, Ele dá o toque final à obra da criação. (2) A inspiração geral e a qualificação dos homens.
O Espírito Santo inspira e qualifica os homens para as suas tarefas oficiais, para trabalho na
ciência e nas artes, etc., Ex 28.3; 31.2, 3, 6; 35.35: 1 Sm 11.6; 16.13, 14.

De maior importância ainda é a obra do Espírito Santo na esfera da redenção. Aqui podem
ser mencionados os seguintes pontos: (1) O preparo e a qualificação de Cristo para a Sua obra
mediadora. Ele preparou para Cristo um corpo e, assim, capacitou-o a tornar-se um sacrifício pelo
pecado, Lc 1.35; Hb 10.5-7. Nas palavras “corpo me formaste”, o escritor de Hebreus segue a
Septuaginta. O sentido é: Pela preparação de um corpo santo, me capacitaste a ser um sacrifício
pelo pecado. Em seu batismo Cristo foi ungido com o Espírito Santo Lc 3.22, e recebeu do

Espírito Santo dons habilitadores sem medida, Jo 3.24 (2) A inspiração da Escritura. O Espírito
Santo inspirou a Escritura e deste modo trouxe aos homens a revelação especial de Deus, 1 Co
2.13; 2 Pe 1.21, o conhecimento da obra de redenção que há em Cristo Jesus. (3) A formação e o
aumento da igreja. O Espírito Santo forma e dá crescimento à igreja, o corpo místico de Jesus
Cristo, pela regeneração e pela santificação, e habita nela como o princípio da nova vida, Ef 1.22,
23; 2.22; 1 Co 3.16; 12.4s. (4) Ensino e direção da igreja. O Espírito Santo dá testemunho de
Cristo e guia a igreja em toda verdade. Em fazendo isto, Ele manifesta a glória de Deus e de
Cristo, aumenta o nosso conhecimento do Salvador, livra de erro a igreja e a prepara para o seu
destino eterno, Jo 14.26; 15.26; 16.13, 14; At 5.32; Hb 10.15; 1 Jo 2.27.