A Escatologia e a Ética


I. Jesus, a Escatologia e a Ética
1.  O Reino. Os hiperdispensacionalistas não veem a ética para a Igreja no Sermão da Montanha, do Senhor Jesus, mas supõem que ele estaria aludindo às condições milenares do reino de Deus. Os estudiosos liberais desconsideram o material apocalíptico e rebuscam a essência de seus ensinamentos éticos, aplicáveis a qualquer época da história. Albert Schweitzer dava aos ensinamentos e à missão de Jesus uma interpretação apocalíptica radical. De acordo com ele, os princípios éticos ali contidos são considerados como interinos, ou seja, aguardam a grande crise e, presumivelmente seriam diferentes, quanto a alguns aspectos, se tivessem sido proferidos sob circunstâncias normais. A escatologia realizada, de C.H. Dodds, retrata a ética envolvida nos ensinos de Jesus como parte do reino que trará a ordem eterna ao que é temporal, pelo que seria algo de valor supremo.
2.  Todos esses pontos de vista talvez tenham algum valor, até onde eles vão. Porém, poderíamos afirmar ainda outras coisas, porque todas essas noções têm os seus pontos de fraqueza. Apesar de que, tecnicamen­te, Jesus ainda estava em terreno veterotestamentário, quando proferiu os seus ensinos, a verdade é que o evangelho de Mateus foi escrito entre quarenta e cinquenta anos dentro da era cristã; e os princípios éticos de Jesus foram registrados sem qualquer comentário, demonstrando que os primeiros cristãos consideravam esses ensinamentos como pertencentes à Igreja, e não meramente aos judeus, ou não somente para algum reino divino futuro. Além disso, esses ensinos são eternos, alicerçados sobre valores próprios do Antigo Testamento, o que significa que não podem ser reduzidos a meras declarações éticas interinas.
3.  Jesus introduziu um novo tom ético, falando com autoridade. Doutra sorte, ele não poderia ter dito: «Ouvistes que foi dito… Eu, porém, vos digo…» (Mat. 5:21,27,33,38,43). Todavia, a totalidade do Sermão da Montanha é puro judaísmo, e não entra nos méritos da revelação da doutrina da graça, que compõe uma parte ponderável dos escritos paulinos. Ver sobre a Graça.
4.   Jesus objetava às formalidades éticas externas, tendo acusado os escribas e os fariseus de promove­rem meras externalidades (Mat. 5:20). Ele enfatizava o caráter interno que subjaz às realizações éticas externas, conforme demonstra a sua reiterada declaração: «Eu, porém, vos digo…»
5.   Em outros trechos, ele demonstrou que a ética é provada no discipulado, – que consiste na renúncia, sob pena do mesmo ser incompleto ou mesmo ser nulo (Mat. 8:34 ss; Luc. 14:26).
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II. A Ética e as Recompensas
O judaísmo posterior fazia das recompensas e das punições uma importante consideração na busca da conduta ética apropriada. Jesus reiterou o tema. Ver Mat. 5:12,46; 6:14,18. A principal recompensa é o próprio reino, dado àqueles que o merecem (Mat. 5:3,10). Em contraste com isso, o julgamento espera pelos violadores da lei de Deus (Mat. 10:28). Esse versículo mostra que há questões eternas em jogo, e não meramente questões temporais, conforme se nota em Mar. 8:34 ss. A ética da graça tem um lugar no ensino de Deus, conforme é ilustrado pela parábola dos trabalhadores da vinha. Ver Mat. 20:1-16. Os homens devem buscar o reino de Deus e os seus benefícios; mas é a graça de Deus que, afinal de contas, concede o que é buscado (Luc. 12:31,32. Ver também Luc. 18:9-14).
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III. Considerações Paulinas
1.  Os crentes serão julgados em relação aos seus atos (Rom. 14:10; II Cor. 5:10). Importa muito aquilo que fazemos, mas tudo será devidamente revisado e punido ou recompensado (II Cor. 3:12 aí).
2.  Todos os homens serão julgados de acordo com suas obras, o que significa que a conduta é uma questão séria (Rom. 2:6).
3.  Há uma inexorável lei da colheita segundo a semeadura, a que todos nós estamos sujeitos (Gál. 6:7,8). Sempre presume-se que a lei da colheita conforme a semeadura não se restringe a esta vida terrena, porquanto ninguém é devidamente recom­pensado ou castigado durante esta peregrinação terrena.
4.  Uma disciplina severa é necessária, se tivermos de ser vitoriosos na corrida da vida (I Cor. 9:24).
5.  É a graça de Deus que faz de nós o que somos, pelo que toda a glória deve ser atribuída a Deus; mas os homens têm o direito de escolher e utilizar as operações do Espírito em sua vida. Efé. 2:10 e Fil. 2:12,13.
6.   A própria salvação, a longo prazo, é constituída pela questão das recompensas pela conduta apropria­da, em acordo com a transformação espiritual. Isso significa, finalmente, a transformação segundo a imagem do Filho (Mat. 8:29), de acordo com o cultivo dos frutos espirituais (Gál. 5:22,23).
7.   A parousia (que vede) deve ser ansiosamente esperada e essa espera deveria levar-nos à pureza de vida (I João 3:3). Isso concorda com os sentimentos expressos por Paulo em I Coríntios, capítulo quinze, onde, no vs. 58, ele conclui a sua discussão sobre a ressurreição, exortando-nos a uma conduta que leve em conta esse fato.
Aquilo que cremos no tocante ao futuro, necessa­riamente afeta a nossa maneira de agir.
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IV. A Ética e  a metafísica
Ê verdade, geralmente aceita, que a transformação metafísica de um crente é acompanhada e até mesmo provocada por sua transformação ética. Sem a santificação, ninguém jamais verá ao Senhor (Heb. 12:14). Ninguém adquire a imagem do Filho, vivendo de maneira negligente. O mesmo Espirito que nos transforma metafisicamente, em primeiro lugar e, correspondentemente, muda a nossa própria natureza, a Am de irmos participando da natureza do Filho e, consequentemente, do Pai. A nossa conduta é um importante fator nessa busca. Ver Mat. 5:48.

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